O julgamento marcado para hoje no Supremo tem desfecho imprevisível. A presidente do STF, Rosa Weber, é relatora das ações sobre o assunto e já sinalizou pela inconstitucionalidade da falta de transparência das emendas

Ministra Rosa Weber é relatora das ações contra o orçamento secreto. Foto: Nelson Jr./SCO/STF. Foto: Nelson Jr./SCO/STF

O orçamento secreto está na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira (7) e pode ser derrubado se os ministros da Corte votarem pela inconstitucionalidade deste instrumento inaugurado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) como moeda de troca com o Congresso Nacional.

Na tentativa de evitar que a prática seja derrubada pela Corte, líderes do Centrão montaram uma operação de emergência para salvar o sistema de pagamento bilionário de emendas parlamentares, sem critérios definidos para a aplicação dos recursos.

Revelado pelo Estadão em uma série de reportagens, a partir de maio do ano passado, o orçamento secreto consiste na liberação de emendas para atender deputados e senadores em troca de respaldo ao governo no Legislativo. Sem equidade entre parlamentares, o repasse supera casos de desvio do dinheiro federal, como o dos Anões do Orçamento (1994) e a Máfia das Ambulâncias (2006).

O julgamento que começa hoje no Supremo tem desfecho imprevisível. A presidente do STF, Rosa Weber, é relatora das ações sobre o assunto e já sinalizou pela inconstitucionalidade da falta de transparência das emendas. A discussão entre os ministros da Corte é se a divisão desigual dos recursos do Orçamento entre os parlamentares fere a Constituição.

Desde 2020, as emendas desse tipo somaram R$ 53,5 bilhões. Já o projeto de Orçamento para 2023 reserva a elas R$ 19,4 bilhões. Nos últimos anos, essa modalidade bancou a compra superfaturada de tratores, a licitação de ônibus escolares acima do preço, a construção de “escolas fake”, deixando esqueletos de obras inacabadas, e a distribuição de caminhões de lixo fora dos padrões e sem planejamento, em cidades pequenas, como mostrou o Estadão. Os escândalos já provocaram três levas de prisões neste ano, no Maranhão e em Alagoas.

O repasse de verbas ocorre sem que os nomes dos verdadeiros padrinhos sejam revelados. Além disso, não há qualquer critério de distribuição entre parlamentares e regiões. Na prática, a liberação é feita de forma desigual entre congressistas e não atende às exigências da Constituição para o orçamento público, como transparência, moralidade e redução das desigualdades regionais.

Juristas apontam várias inconstitucionalidades no orçamento secreto: falta de transparência, afronta ao princípio da moralidade pública, ausência de planejamento e alinhamento com programas estratégicos nacionais, aumento de desigualdades regionais, corte de despesas obrigatórias para bancar as emendas e ilegalidade na contratação de obras, além de desvios constatados na ponta.

Excrescência

O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, prometeu acabar com o orçamento secreto durante a campanha. Ele chegou a chamar a prática de “excrescência” e disse que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), agia como se fosse o “imperador do Japão”. Líder do Centrão, Lira é hoje o principal operador do orçamento secreto. Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), são candidatos à reeleição, em fevereiro de 2023, e as articulações dos dois contam com a liberação do orçamento secreto.

Integrantes da equipe de transição avaliam que o Supremo vai derrubar essa prática. Políticos disseram a Lula, porém, que uma decisão assim tornará o clima no Congresso desfavorável a ele. O plano B dos parlamentares é usar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, apresentada pelo presidente eleito para aumentar as despesas em 2023, para incluir esse mecanismo na Carta.

O Centrão ameaça tornar a liberação impositiva, obrigando o governo a pagar os recursos sem cortes, como acontece hoje com as emendas individuais e de bancada.

Se não declarar a prática inconstitucional, o Supremo pode dar uma decisão que mantenha as emendas, exigindo transparência e critérios para sua distribuição. O risco, porém, é o governo e o Congresso driblarem a decisão, como ocorreu no ano passado. Em 2021, a ministra Rosa Weber chegou a suspender a liberação das emendas, mas autorizou os pagamentos após o compromisso da cúpula do Congresso de anunciar quem estava destinando os recursos. Mas nem todos os padrinhos políticos foram divulgados.

Existe, ainda, a possibilidade de um ministro do STF pedir vista (mais tempo para análise) durante o julgamento, adiando a decisão final. Caso isso ocorra, deputados e senadores ficariam liberados para manter as emendas intactas no Orçamento de 2022 e articular a aprovação dos recursos em uma PEC até o fim deste ano. Outra tentativa em curso é convencer os ministros do Supremo a aceitar o modelo, sob o argumento de que serão estabelecidas novas regras de transparência e equilíbrio na distribuição da verba.

Com informações do jornal O Estado de S. Paulo

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