Texto: Marília Cyrne, cobertura especial da 1º Assembleia da Aliança dos Guardiões e Filhos da Mãe Terra

Cacique Tanoné em Brasília durante Assembleia Indígena
Foto: Marília Cyrne

“Sou a cacique Tanoné, Kariri-Xocó de Alagoas e há 32 anos eu vivo no cerrado, no Distrito Federal. Eu mesma, uma liderança mulher, cuido de minha comunidade, ando e observo tudo, pois tenho olho, visão e espiritualidade. Quando era antes eu passava e os homens me olhavam de canto e torto porque eu era cacique mulher. A minha grande preocupação e tristeza é com os rios. O nosso velho Chico está morrendo, as águas que estão lá já estão contaminadas, desce animais mortos por ele. Virou uma ilha no meio do rio e já tem casa e cavalo lá no meio, então eles atravessam pelo riacho que sobrou do rio para comer. Eu quando nasci e enquanto ia crescendo, com os meus amigos e primos, a gente caia no rio. Rio cheio que você não via o outro lado. A água corrente, ia descendo, e hoje eu não tomo mais banho nesse rio, pois tenho medo. Usamos água da chuva agora para fazer as coisas, a do rio não tem como. Está muito triste, tem que botar cloro. Já pescaram siri e caranguejo no rio. A água esta salobra, não sabemos o porque desses bichos agora. Eu fiquei preocupada, vou falar com o conselho e lideranças, mas eu tô mesmo pedindo apoio a todos os que sentem na pele o que eu tô sentindo. Eu sinto pela água, pelas montanhas, as nossas caatingas sendo destruídas, estão desmatando demais, a chuva no vem e quando vem, é destruindo tudo. O povo fica fazendo doação e fazendo cota disso e daquilo, mas não enxerga a realidade. Tá tudo cego. Que o Grande Espírito dê uma luz pra essas pessoas, que tem olho mas não vê. Então a gente sente o clima. Nós tínhamos a data certa do inverno, agora não tem data certa pra mais nada, nem para plantar a semente tradicional, já perdemos varias sementes. As roças nós continuamos, mas está tudo diferente, eu vou observando pela minha plantação como o tempo está mudado. O governo precisa respeitar o que o Grande Espírito deixou. Ele deu a mata e os rios e tudo. Que ele respeite tudo isso. O homem tá perturbado, que bote a mão na consciência e entenda que esta destruindo o seu mesmo. E que ele, os seus e os índios também vão sofrer.”