Composta por torcedores LGBTQIAP+, a torcida organizada do Catar, Proud Maroons, é a única que não pode ter membros cataris, sob risco de serem mandados para a prisão sem direito de defesa

Foto: Reprodução / El Universo

Por Kamily Rodrigues

Nos últimos dias, a torcida organizada da seleção do Catar, Proud Maroons, composta por torcedores LGBTQIAP+, tem ganhado destaque quando o assunto é a campanha de conscientização que está acontecendo no país-sede da Copa do Mundo, liderada por Nasser Mohamed, primeiro homem a se assumir publicamente gay no país árabe.

O cenário para a comunidade LGBTQIAP+ no Catar não é otimista. Nesta Copa, a Proud Maroons é a única torcida que não pode ter membros do seu próprio país. Isso porque a legislação catarie possui leis LGBTfóbicas, que criminalizam o relacionamento entre pessoas do mesmo sexo.

Em entrevista concedida ao Terra, o líder da torcida, comentou como está sendo para ele a realização da Copa no Catar. “É difícil ouvir o governo do Catar dizer: ‘todos serão bem-vindos no país’, quando eu não sou bem-vindo na minha própria casa. Tem um marketing sendo feito para a Copa que não está passando a imagem real do que acontece com as pessoas LGBTs no país”, afirmou.

De acordo com o último Relatório de Homofobia do Estado da ILGA (International Lesbian and Gay Association), o Código 1° do Código Penal do país (2004), diz que os tribunais podem aplicar a Lei Sharia – sistema jurídico do Islã – para impor pena de morte para homossexuais.

 

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Do Catar para os Estados Unidos

Líder da Proud Maroons e também fundador da ONG Alwan Foundation, instituição que arrecada recursos para proteção da comunidade gay que vive na região do Golfo Pérsico, Nasser Mohamed mora desde 2015 em São Francisco, nos Estados Unidos, país que lhe concedeu asilo por entender que ele corria risco no Catar, simplesmente por ser gay.

Ainda que esteja na América do Norte, Mohamed afirma temer que seu país faça algo contra ele após a Copa. “O Catar se preocupa muito com sua imagem. Como tem muita gente prestando atenção em mim agora, eles não vão me machucar. Meu desafio é conseguir continuar seguro depois da Copa, quando as pessoas pararem de falar do país. Aí acho que poderei ser um alvo. Os movimentos deles são imprevisíveis e o alcance é grande. Eles estão conectados com políticos e pessoas ricas em todos os lugares, pessoas que estão dispostas a fazer qualquer coisa por eles”, disse durante entrevista ao Terra.

Mesmo com todas as ameaças e homofobia por parte da sociedade catari, Nasser Mohamed disse na entrevista ao Terra, que gostaria de retornar para o Catar, mas reconheceu a inviabilidade, pelo fato de conceder entrevistas, o que é visto como um crime pelo país árabe. “Falar com a imprensa sobre opiniões diferentes das do governo pode ser considerado crime cibernético. Eu teria problemas por isso também”, destacou.

Protestos em prol da comunidade LGBTQIAP+

Na última terça-feira (29), o chefe do comitê da Copa, Hassan Al-Thawadi, afirmou ao jornal britânico TalkSports, que manifestações em apoio a pessoas LGBTQIAP+ desrespeitam o Oriente Médio e acusou as nações ocidentais de não respeitarem a cultura regional.

Segundo ele, a braçadeira com o dizer “OneLove” deixou uma mensagem divisiva. “Não é uma cultura ou religião catari, estes valores são regionais. É para o mundo islâmico, o mundo árabe, o Oriente Médio”, disse Hassan.

A situação que pessoas LGBTQIAP+ enfrentam no Catar tem levado torcidas de outras seleções a protestarem contra a proibição da homosexualidade no país, como no jogo entre Portugal e Uruguai, quando um torcedor invadiu o gramado carregando a bandeira do orgulho LGBTQIAP+ e vestindo uma camisa com os dizeres “Respect for Iranian Woman”, em português “Respeito para as mulheres iranianas” e “Save Ukraine”, que em português significa “Salve a Ucrânia”.

Nas arquibancadas não foi diferente. Durante diversos jogos foram registrados movimentos em apoio a comunidade por parte das torcidas, além de pedidos para que a Palestina seja reconhecida como nação. Em contrapartida, no gramado, as seleções europeias, que anunciaram no início da fase de grupos da Copa, que utilizariam a braçadeira com frases em prol da comunidade LGBTQIAP+, foram impedidas pela FIFA.

“A Fifa tem sido muito clara ao dizer que vai impor sanções esportivas se nossos capitães usarem as braçadeiras no campo de jogo. “ Como federações nacionais, não podemos colocar nossos jogadores em uma posição na qual poderiam enfrentar sanções esportivas, incluindo cartões. Então, pedimos aos capitães que não tentem vestir as braçadeiras nos jogos da Copa do Mundo“, é o que diz a nota oficial emitida pelas seleções.