Divulgação/Studio Ghibli

Por Guilherme Movieira

Desde a vitória de “Parasita” em 2020, a comunidade de cinema discute se o Oscar está em um movimento de ampliação do reconhecimento de filmes em língua não inglesa ou se o longa de Bong Joon-ho foi um ponto fora da curva. Desde então, temos visto, de fato, filmes dessa categoria conseguirem chegar à disputa de Melhor Filme ou mesmo sendo favoritos em outras categorias. Na temporada 2023-24, o Japão consegue um marco histórico de conseguir emplacar três produções diferentes na premiação: “O Menino e a Garça”, em Melhor Filme de Animação; “Godzilla Minus One”, em Melhores Efeitos Visuais; e “Dias Perfeitos” em Melhor Filme Internacional. Com isso, ficamos com os questionamentos: seria esse o ano das produções japonesas no Oscar? O que exatamente do cinema japonês está sendo representado na premiação?

“O Menino e a Garça” segue um legado de animações japonesas na categoria de animação. O próprio Hayao Miyazaki, diretor do longa, se encaminha para a sua quarta indicação na categoria, tendo vencido em 2003 com “A Viagem de Chihiro”, e ficado apenas com a indicação em 2006 e 2014, com “O Castelo Animado” e “Vidas ao Vento”, respectivamente. “A Viagem de Chihiro” segue com a marca de único filme em língua não-inglesa a vencer a categoria, desde a sua criação para a edição de 2002. Desde que a Disney colocou as suas mãos na sua primeira estatueta de Melhor Animação (em 2004, com “Procurando Nemo”), os filmes em outros idiomas não conseguem uma vitória, um marco que pode ser derrubado com “O Menino e a Garça”, em 2024. Ainda assim, o segmento de animação japonesa sempre foi tido com algum prestígio no Oscar, conseguindo as demais indicações citadas acima, mas também indicações para “Mirai do Futuro” em 2019, “As Memórias de Marnie”, em 2016 e “O Conto da Princesa Kaguya”, em 2015, entre outros.

Foto: Reprodução

Novidade este ano é o reconhecimento para “Godzilla Minus One”, primeira produção japonesa a ser indicada a Melhores Efeitos Visuais. Em uma campanha tardia, o kaiju conseguiu chamar a atenção dos votantes do Oscar com efeitos especiais baratos e com excelente qualidade. Não é novidade o quanto o cinema estadunidense comprou a ideia das narrativas com kaijus, investindo milhões de dólares nas suas próprias versões dos monstros gigantes (como pode-se atestar pelo vindouro Godzilla e Kong, com lançamento em março). Parece até estranho que, dada toda a admiração dos Estados Unidos por esse tipo de produção, a gente nunca tenha visto uma produção japonesa do gênero ser prestigiada no Oscar.

Foto: Reprodução

Por fim, o drama “Dias Perfeitos” trás uma dualidade interessante. O filme representa o Japão na categoria de Melhor Filme Internacional, categoria cujos representantes são selecionados por entidades do próprio país representado, porém, caso o filme seja premiado, tudo indica que quem subiria ao palco para discursar seria o diretor Wim Wenders, alemão. Wenders tem uma carreira internacional consolidada, isso é fato, e está acostumado a participar de produções de outros países. Até mesmo o documentário “O Sal da Terra”, coprodução brasileira, é assinado por Wenders em conjunto com o brasileiro Juliano Salgado. Tematicamente, “Dias Perfeitos” fala sobre uma realidade do Japão, e discute temas importantes, como até mesmo as influências culturais do “pop global” (que no fundo é estadunidense), uma questão interessante, quando nos voltamos para a ficha técnica e nos deparamos com um diretor alemão sendo representante do cinema japonês no Oscar.

Com essas três indicações na premiação, os concorrentes mais fortes do cinema japonês seguem sendo “O Menino e a Garça” e “Godzilla Minus One” que podem exercer seu favoritismo nas suas categorias. Em 2021, “Drive My Car” conseguiu emplacar quatro indicações (inclusive a inédita, em Melhor Filme), mas saiu daquela noite apenas com Melhor Filme Internacional. O que nos leva a reflexão: será que Hollywood (e a indústria cinematográfica estadunidense como um todo) só está disposta a reconhecer o cinema japonês quando ele é animado ou têm monstros gigantes? Ou estamos diante de um estopim para o cinema japonês tal qual imaginamos ter vivido em 2020 com o cinema sul-coreano?

Texto produzido em cobertura colaborativa da Cine NINJA – Especial Oscar 2024