Arcebispo de São Paulo pede calma e compara momento com a ‘ascensão ao poder dos regimes totalitários, especialmente o fascismo’

Igrejas evangélicas têm sofrido com ataques de apoiadores de Bolsonaro que acusam padres de apoiar o PT. Fotos: Reprodução/Rdes Sociais

Por Mauro Utida

Cenas lamentáveis que foram vistas no Santuário Nacional de Aparecida, no último dia 12, durante a celebração à Nossa Senhora Aparecida, quando jornalistas foram hostilizados por apoiadores de Jair Bolsonaro vestidos com camisas amarelas estão se tornando comum neste período eleitoral. Na ocasião, os bolsonaristas também abordaram uma pessoa vestindo vermelho, vaiaram o arcebispo que falava de fome e perseguiram na sacristia um padre que pediu silêncio diante da tentativa de transformar uma missa num ato de campanha.

Depois do episódio em Aparecida, no interior de São Paulo, mais três casos de fiéis ofendendo e interrompendo atos litúrgicos foram filmados, dois no Paraná e um em Jacareí (SP). A Mídia NINJA recebeu as denúncias por vídeo e áudio e são situações absurdas, com fiéis alterados gritando contra padres que são acusados de fazer política dentro da igreja por estarem defendendo os direitos humanos, conforme o Evangelho.

Neste domingo (16), o padre da igreja São João Batista, em Jacareí, interior de São Paulo, foi alvo de duas senhoras que o criticaram por ter citado Marielle Franco, vereadora e defensora dos direitos humanos assassinada em 2016 no Rio de Janeiro.

No áudio, uma senhora fica descontrolada e começa a gritar com o padre para que ele não fale o nome de Marielle Franco dentro da igreja. “O senhor não vai falar de uma mulher homossexual, envolvida com o tráfico de drogas, uma esquerdista do PSOL, que apoia a identidade de gênero”, gritava. Uma outra mulher também começa a gritar: “O senhor também defende o aborto?”.


Outro caso parecido aconteceu em Fazenda Rio Grande, no Paraná. Na sexta-feira (14), alguns fiéis interromperam a missa e hostilizaram um padre no momento em que ele se preparava para a Eucaristia. O religioso falava que “o Deus da vida nunca estará ao lado de quem prega a violência”. Uma mulher gritou: “O Deus da vida é a favor do aborto? O senhor está pedindo voto pro Lula?”.

Na ocasião, o sacerdote enfrentou um clima apreensivo porque outros fiéis também gritaram em protesto. A missa estava sendo transmitida ao vivo, mas foi interrompida.

 

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Outro caso neste domingo (16), aconteceu em uma igreja católica em Campo do Tenente, também no Paraná. Uma mulher vestida com uma camiseta com o rosto de Bolsonaro e a frase “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos” acusou o padre de ser petista. O caso aconteceu após a missa e as acusações da mulher de nome Vera foram gravadas.

No início da gravação, Vera gritou: “Só está havendo mentiras dentro dessa igreja”. Uma pessoa que testemunhou o caso disse que ela dizia que o PT irá fechar as igrejas e que apoia coisas ruins. “Ela pediu para o padre falar isso, mas o padre se recusou e ela acusou o padre de ser petista. Disse que o Padre tava puxando votos pro PT e ficou revoltada. Descontrolada na verdade, porque ela ficou horas nessa gritaria aí”, explicou.

Os fiéis ainda tentaram acalma-lá, mas a senhora continuou agitada dentro da igreja e tumultuando o ambiente. No vídeo é possível ouvir um rapaz não identificado dialogando com Vera:

– Vera, aqui é a casa de Deus. Tem que respeitar, Vera!.

– Descontrolada, Vera rebateu: “E eu tô desrespeitando por acaso?!”

– Está! Isso é um desrespeito a uma ordem de sossego a uma instituição religiosa, é crime isso aí -, respondeu o fiel.

– É crime? Vão me prender? Pode chamar [a polícia] -, continuou a mulher.


Arcepispo se manifesta no Twitter

Dom Odilo Scherer, cardeal e arcebispo metropolitano de São Paulo, usou o Twitter neste domingo para fazer uma reflexão sobre os ataques que a igreja católica vem sofrendo e até mesmo para justificar sua roupa vermelha, pois chegou a ser chamado de “comunista”.


O cardeal disse que o momento se parece com os tempos da ascensão do fascismo ao poder. E declarou: “É preciso ter muita calma e discernimento nesta hora!”.


Nota da CNBB

A Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) declarou que não irá se pronunciar sobre os novos casos e declarou que mantém a posição na nota divulgada no último dia 11 de outubro.

Na ocasião, a presidência da CNBB divulgou nota na qual lamenta “a intensificação da exploração da fé e da religião como caminho para angariar votos no segundo turno” das eleições deste ano. Os bispos recordam que a manipulação religiosa desvirtua valores do Evangelho e tira o foco dos reais problemas que precisam ser debatidos e enfrentados no país.

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