Foto: Reprodução UNICEF

Por Joelma Stella e Renata Renovato

Em pouco mais de 4 meses de aulas presenciais, professores, alunos e funcionários de escolas vêm demonstrando uma grande dificuldade na adaptação à rotina escolar, por inúmeros motivos.

Em março de 2022, a Unesco, junto com a Unicef e o Banco Mundial, emitiram uma nota coletiva na qual sinalizam acerca da urgência de discutirmos o hiato educacional deixado na vida das crianças pela pandemia, e suas terríveis consequências.

O que já podemos perceber, é que muitas dificuldades podem ser esperadas no desenvolvimento dessa geração, caso os países não tomem medidas estratégicas para sanar a lacuna deixada após o fechamento das escolas em 2020. O fechamento das escolas atingiu principalmente as crianças que vivem em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Segundo a UNESCO, no seu ápice, a pandemia da COVID-19 impactou mais de 1,5 bilhão de estudantes em 188 países – o que representa cerca de 91% do total de estudantes no planeta.

Além de sérias perdas no processo de aprendizagem, vemos que principalmente na infância, período fundamental para a alfabetização e desenvolvimento cognitivo, houve também a perda da socialização no ambiente escolar. Esse déficit promove uma série de outras dificuldades vivenciadas por alunos e professores, entre elas, a apatia, a depressão e até mesmo a violência.

O que agravou este cenário, foi o fato de que as escolas não estavam preparadas para o ensino remoto, ele não era uma possibilidade real quando a pandemia fez com que instituições de ensino e professores se adaptassem, às pressas, a essa nova realidade. Segundo dados divulgados na Ágora: Revista Acadêmica de Formação de Professores, além da falta de preparo para lidar com este cenário, os profissionais de educação, assim como as crianças, tiveram que lidar com questões emocionais em decorrência da pandemia. De acordo com a revista, os educadores entrevistados relataram ansiedade (67%), cansaço (38%) e tédio (36%) durante o período de aulas remotas. E com o retorno às aulas presenciais, educadores e familiares têm percebido, de modo mais direto, o impacto da pandemia nos alunos.

Durante a pandemia, os alunos com dificuldade de acesso a internet foram os mais afetados. Em pesquisa realizada, neste período, pela Undime (União dos Dirigentes Municipais de Educação) em parceria com o Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação), e apoio do CIEB (Centro de Inovação para a Educação Brasileira), Fundação Itaú Social, Fundação Lemann e Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), foi identificado que 79% dos alunos diziam ter acesso à internet, no entanto, 46% só conseguiam fazê-lo por celular, o que limitava tanto o trabalho do professor como a experiência de aprendizagem dos alunos.

Complementando este cenário, o Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), divulgou no último dia 12 de julho, uma pesquisa feita pela instituição referente ao ano letivo de 2021, que mostra que 80% dos professores de ensino fundamental e médio da rede pública tiveram dificuldade para atender alunos com deficiência ao longo da pandemia. Já na rede particular este percentual foi de 60%. Os professores também relataram falta de apoio dos responsáveis pelos alunos na realização das atividades escolares, defasagem na aprendizagem dos alunos e falta de acesso a internet.

Em entrevista para essa matéria, uma professora do terceiro ano do ensino fundamental da rede pública de Salvador, que preferiu não se identificar, diz que dos vinte alunos que têm em sala de aula hoje, nove chegaram sem saber ler ou escrever, o que representa quase metade da turma.

A professora relata, ainda, que é a primeira vez, em vinte anos de docência, que recebe uma turma com tantos alunos atrasados. A professora também destacou que tem observado um comportamento agressivo e avesso a socialização, além de dificuldade de concentração em uma parcela significativa dos alunos.

Estes dados mostram não apenas a dificuldade que alunos e professores têm passado para se readaptarem ao ambiente escolar mas, principalmente, o quanto as dificuldades e desigualdades vivenciadas pelas muitas comunidades escolares, no Brasil e no mundo, ao longo de anos, foram reforçadas pelos efeitos da pandemia.

Como destacado pela Unesco e Unicef na nota emitida em março de 2022, é urgente que políticas educacionais de reparo aos danos da pandemia sejam elaboradas e implementadas o quanto antes, ou as consequências no desenvolvimento dessa geração pandêmica tendem a ser cada vez mais difíceis de reverter e imprevisíveis.