“O mais importante é não cair na narrativa heróica de que há mocinhos nessa história. Nem Putin é o cavaleiro da luta contra o nazismo, nem Biden está preocupado com a democracia e a soberania ucraniana”, escreveu Guilherme Boulos em sua página no Twitter.

Coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), para quem o “jogo geopolítico desta guerra está muito além das fronteiras ucranianas”, é uma das figuras políticas que têm trazido análises sobre os conflitos na Ucrânia, que completa hoje uma semana desde os primeiros ataques. Boulos reforça o papel da guerra como “proxy war”, ou guerra de procuração, tal como aponta especialistas, ao afirmar que o centro do conflito é a Rússia e a OTAN. “Ainda estamos presos numa concepção de mundo que dirige a ação dos EUA e das grandes potências: o colonialismo”.

Confira a análise completa:

“A Ucrânia é território da antiga URSS. Depois da sua separação em várias nações, os EUA decidiram agregar mais países à OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), descumprindo o acordo de não expandir para o leste. Começou um debate para a entrada da Ucrânia no Bloco.

Putin afirma que quer proteger russos étnicos no oriente ucraniano do extermínio e combater o nazismo na região. Difícil acreditar neste pretexto para a invasão. Mas é fato que, desde 2014 a Ucrânia tem forças políticas relevantes de extrema-direita.

A principal facção delas se chama Movimento Azov, organização paramilitar integrada por células neonazistas acusadas de tortura, saques, estupros e limpeza étnica. Mas o jogo geopolítico desta guerra está muito além das fronteiras ucranianas.

O centro do conflito é a relação de forças entre a OTAN e a Rússia – e indiretamente a China. Nesse cenário, ocorre o que especialistas chamam de proxy war, guerra por procuração, conflitos armados no qual países se utilizam de terceiros para não lutarem diretamente entre si.

O fato da Ucrânia estar na fronteira ocidental da Rússia expressa a provocação da OTAN, mas não justifica qualquer invasão. Quando os americanos invadem países como Afeganistão ou Iraque, somos os primeiros a criticar. A autodeterminação dos povos é um princípio básico.

No fundo, como apontou o professor Reginaldo Nasser, ainda estamos presos numa concepção de mundo que dirige a ação dos EUA e das grandes potências: o colonialismo. Ou seja, a busca imperialista em controlar territórios e riquezas, exercer poder e decidir o futuro dos povos.

O que vai decidir o impacto do conflito no mundo será:

1. O plano de ofensiva de Putin
2. O efeito das sanções do bloco da OTAN
3. O apoio militar dos EUA e outros países anti-Rússia
4. A postura da China
5. A reação da população russa

O Brasil poderia cumprir o papel de condenar a guerra e qualquer tipo de intervenção externa que viole direitos humanos. Mas nada se pode esperar do governo Bolsonaro. A inflação do petróleo e a alta súbita do dólar podem prejudicar ainda mais a situação econômica brasileira.

A guerra não nos interessa, como brasileiros e como seres humanos. Vale a frase de Sartre, há mais de 50 anos: ‘Quando os ricos fazem a guerra, são sempre os pobres que morrem’.”