Foto: Bruno Kelly / Amazônia Real

Nesta quarta-feira (24), às 19h (Horário de Brasília), a Articulação Agro É Fogo lançará, durante live nos canais do youtube da Mídia Ninja e da Comissão Pastoral da Terra, o Dossiê Agro É Fogo: Os incêndios não terminaram – A casa de povos e comunidades tradicionais continua queimando. Nessa segunda fase do Dossiê Agro É Fogo, o documento ressalta, mesmo em período de pandemia, a continuidade do uso do fogo como arma para expulsão das comunidades de seus territórios, endossada pelo governo Bolsonaro. Isso sustenta o avanço da grilagem de terras, do desmatamento, da destruição dos saberes tradicionais, e do alastramento da fome, da seca e da mudança climática em todo o país.

Composta por seis artigos analíticos, o Dossiê conta com a participação de movimentos sociais, organizações e especialistas que discutem, com profundidade crítica, o que está por trás da expansão das fronteiras do agronegócio e da mineração. Além disso, sete casos de conflitos exemplificam como essas problemáticas ganham forma no chão dos territórios, interferindo não só nos meios de vidas de povos e comunidades tradicionais, como também na qualidade de vida de quem está na cidade.

Apesar da repercussão da destruição do Pantanal em 2020, em que se contabilizaram 22 mil focos de incêndio, o maior índice em uma década, o fogo continua elevado, totalizando mais de 8 mil focos só em 2021 nesta região. Na Amazônia, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (INPE), já se contabilizam mais de 71 mil focos de incêndio neste
ano. No Cerrado, o índice acumulado entre janeiro e novembro já contabiliza mais de 60 mil focos.

O fogo do agro é retrocesso ao direito à vida Por direitos territoriais como imperativo ético de uma reforma agrária no país, o material do Dossiê Agro é Fogo – fase 2 foi composto por dados, pesquisa extensa e depoimentos de quem tem defendido as florestas e matas nativas com seus próprios corpos, e enfatiza: os incêndios não são fatos isolados e sazonais.

O fogo do agro compõe uma estratégia de consolidação de fazendeiros e empresas multinacionais, expulsando as comunidades de suas terras, esvaziando os pratos da população brasileira, gerando o aumento dos conflitos em comunidades quilombolas, indígenas e de base camponesa. No Pantanal, por exemplo, os ministérios Público de Mato Grosso do Sul e Mato Grosso apresentaram um relatório técnico identificando que quase 60% dos focos de incêndio que afetaram a região em 2020 foram provocados por ações humanas, com ligação com atividades agropastoris.

O fogo é utilizado para incendiar a mata nativa, casas e roças de comunidades para avançar com as monoculturas, a mineração e a pecuária. Esse processo provoca a morte de nascentes, o desequilíbrio ambiental e, consequentemente, envenena a terra, a água e o ar utilizados pela população. “Os invasores de nosso território são os madeireiros e os fazendeiros, e agem organizados da seguinte forma: primeiro entra o madeireiro e derruba as madeiras de lei para vender. No ano seguinte, no verão, eles ateiam fogo na área que foi derrubada e, quando chega o inverno, já entra o fazendeiro que
utiliza avião para semear o capim. O último passo é cercar e colocar o gado. Eles agem dessa forma e dessa forma todo ano tem derrubada com roubo de madeiras, queimadas e formação de pastos e fazendas”, relata Antônio José Apurinã, cacique geral da terra indígena do povo Apurinã, Acre (AM).

Por outro lado, nos deparamos com o uso tradicional do fogo pelas comunidades para vários fins, realizado com cuidado, com a sabedoria herdada de conhecimentos ancestrais e tecnologias específicas para manuseio das florestas e da agricultura, passadas de geração a geração. Já é sabido, inclusive, que esse outro tipo de uso do fogo ajuda a produzir a sociobiodiversidade da Amazônia, do Cerrado e do Pantanal.

A Articulação Agro É Fogo

A Articulação AGRO é FOGO é uma rede que reúne cerca de 30 movimentos, organizações e pastorais sociais que atuam há décadas na defesa da Amazônia, Cerrado e Pantanal, e seus povos e comunidades tradicionais. Ela surge como reação aos incêndios florestais que assolaram o Brasil nos últimos dois anos. Diante do acontecimento violento do Dia do Fogo, em 2019, aos incêndios que devastaram o Pantanal em 2020, assistimos atônitos a um governo federal que mente sobre as causas e sobre a sua própria responsabilidade no ocorrido. Isso move a Articulação não somente à necessidade de qualificar o debate público, mas, sobretudo, ir além das imagens de satélite e números de desmatamento, trazendo a dimensão do que é vivido no chão das floresta e dos sertões, e da importância da sociobiodiversidade pelo direito à vida.