Por Noé Pires

Tudo teve início em 2021 com o lançamento explosivo do single “Travequeiro”, marcando o ponto de partida para uma aventura musical repleta de ousadia. No mesmo ano, elas surpreenderam o público com o álbum de estreia “DOTADAS (2021)”, que incluía o cativante clipe de “Hermanas”. O sucesso continuou em 2022 com o hit “Vingança da Malo’key” agitando as paradas, seguido por “Shambaralai” em 2023. Agora, em 2024, as Irmãs de Pau retornam com um novo álbum, “Gambiarra Chic”, repleto de colaborações especiais e uma abordagem musical diversificada. O lançamento do álbum está programado para ser feito em duas partes, prometendo surpreender e encantar os fãs da dupla.

Embora não sejam irmãs de sangue, Isma e Vita compartilham uma conexão tão forte que as torna verdadeiras irmãs de coração, unidas por uma parceria que vai além da música. O encontro dessas duas almas aconteceu durante as Ocupações dos estudantes secundaristas em 2015, e desde então enfrentaram juntas inúmeros desafios e celebraram grandes conquistas. Apesar de uma breve pausa durante a faculdade, sua irmandade resistiu ao teste do tempo, levando-as a se reunirem novamente para formar as Irmãs de Pau. Antes de mergulharem no universo da música, essas talentosas artistas já haviam deixado sua marca no cinema, nas artes visuais e na moda. No entanto, foi durante a pandemia que sentiram a necessidade de unir seus talentos em um projeto que refletisse toda a riqueza de suas experiências culturais.

Agora, prepare-se para embarcar nessa empolgante jornada musical ao lado das incomparáveis Irmãs de Pau!

O S.O.M, “Sistema operacional da música”, o canal de música da mídia NINJA, bateu um papo com as artistas.

1 – Como se deu o processo de produção e criação do disco “Gambiarra Chic”? 

Isma: Percebemos que nossa carreira está em um momento muito abençoado, emplacamos 2 músicas nas paradas de sucesso, “Shambaralai” e “Medley do Submundo”, fomos convidadas para participar do álbum After da Pabllo Vittar e a música é umas das mais ouvidas do disco. Estávamos viajando pelo Brasil todo na “Silicone Tour”, sendo reconhecidas… Percebemos que era o momento ideal de produzir o álbum que já vínhamos desenhando a mais de 1 ano, tanto pelo contexto que estava propício quanto pelas condições financeiras, somos independentes e quanto mais shows, mais recurso para realizar nossas produções, não vou dizer que tivemos o ideal para produzir do jeito que a gente queria porque realmente não tivemos e daí surgiu o conceito de “Gambiarra Chic”. Nós utilizamos dos recursos que tínhamos a nosso favor para produzir algo potente, mesmo que essas ferramentas não fossem as ideais, mas acredito que demos o nosso jeitinho e fizemos algo bom e bonito. Os produtores envolvidos foram essenciais para fazer tudo acontecer e também a equipe envolvida no material visual, eles entenderam a nossa situação e juntos criamos formas de colocar o projeto no mundo.

Vita: o processo de criação do GC foi algo muito orgânico. Queríamos produzir algo com tempo. Pensando em cada detalhe. Por isso a importância de dividir em duas fases este álbum. A primeira parte muito focada em dar continuidade a nossa pesquisa das “Estéticas da putaria e sonoridade brasileiras” com o funk paulista. E ainda não posso fazer muito, mas a segunda parte pretende ser algo mais ousado. Gambiarra Chic é sobre um momento de muitas vitórias pessoais e coletivas. É um lugar que imaginamos e que gostaríamos que todas pessoas trans, todes corpos marginalizados pudessem vivenciar: uma vida digna, com direito à saúde, educação, moradia e etc… pois a prosperidade só é possível quando juntas alcançamos.

2 – como surgiu as referências do disco “Gambiarra Chic”?

Isma: Como em todas as nossas outras produções nós nos referenciamos por nós mesmas, pelas experiências e conquistas que estamos vivendo e optamos por tentar compartilhar isso com as pessoas, ser travesti no Brasil exige que você crie estratégias, rachaduras e gambiarras pra conseguir sobreviver, e para além de sobreviver, nós estamos vivendo! Saboreando a vida, sonhando e realizando! Observar isso é muito Chic, historicamente não estamos acostumadas a ver corpos como os nossos vivendo a vida que estamos levando! Isso é rico, isso inspira outras, isso muda o mundo e a realidade de outras também, por isso optamos por nossa experiência de vida ser a referência desse disco.

Vita: As principais referências fazem parte das nossas experiências e vivências na nossa quebrada. O funk de São Paulo é algo que sempre esteve presente e demarcado em nosso trabalho, sobretudo com a cultura ballroom, trazendo o vogue por exemplo. Em grande parte do nosso trabalho podemos ver o funk com vogue super presente, perpassando a música eletrônica. Toda galera que somou na produção do álbum são fomentadores desses movimentos culturais: funk, vogue e música eletrônica. Queríamos trazer a identidade de cada um somando com o nosso corre.

3 – Me conta sobre os avanços e desafios das Irmãs de Pau em sua jornada artística?

Isma: Nosso maior desafio é o financeiro que faz com que não consigamos colocar todas as nossas ideias em prática, sem dúvidas. E para além das ideias, isso interfere na nossa relação pessoal entre si e com a nossa equipe, trabalhamos com amigos porque eles acreditaram no nosso sonho quando nem tínhamos dinheiro pra pagar pelo serviço, não temos o número ideal de pessoas na equipe e por isso as vezes todo mundo fica sobrecarregado nas funções. Hoje percebemos que nossas relações de amizade estão sendo engolidas pelo trabalho, mas ao mesmo tempo não queremos deixar de trabalhar com nossos amigos kkkk. Eu e Vita sentimos saudades dos momentos de descontração apenas enquanto amigas, atoas e etc, agora a todo momento o nosso trabalho está presente. É difícil equilibrar tudo isso, mas estamos cada vez mais buscando formas de ser prazeroso para todos nós.

Vita: Ser o que somos ainda mais no Brasil temos diversos entraves e problemas. A grande questão é a falta de investimento que nós artistas periféricos sofremos diariamente. Isso limita muitas vezes conseguir alçar voos maiores e pagar bem todos que trabalham com a gente. O capital ainda está concentrado majoritariamente em homens das diversas esferas artísticas. Acredito que uma das alternativas para essa questão é termos pessoas trans, mulheres, pessoas negras e nos cargos de poder nessas grandes empresas que movimentam o mercado.

4 – Me conta um pouco como surgiu a proposta das irmãs de pau?

Isma: Eu e Vita amamos um contato humano, sentir calor, conversar, estar no meio de muitas pessoas, sempre trabalhamos com projetos que envolvem festas, espaços de socialização, atuamos na área da educação também, então isso acho que sempre nos uniu. Quando surgiu a pandemia nós ficamos muito inquietas em não poder estar perto das pessoas, a partir desse momento criamos as Irmãs de Pau para estar junto com as pessoas pela música, gravamos e disponibilizamos nossas primeiras músicas nas plataformas de streaming, inicialmente era mais pra nos salvar desse momento solitário em nossas vidas, mas nos apegamos tanto ao projeto que estamos até hoje (risos). A pandemia acabou e os shows começaram a acontecer, Irmãs de Pau tem mudado nossas vidas, estamos realizando sonhos e vivendo experiências que nunca imaginei viver com tão pouca idade, eu sou muito feliz e grata a tudo isso.

Vita: De tanto responder essa pergunta gosto de falar que nossa irmandade veio primeiro. Realizamos quase em conjunto nossa transição de gênero, entrada na faculdade, mudança de cidades e etc…Isso nos fortaleceu diariamente. Depois da irmandade veio o pau, aí descobrimos os mistérios que conseguimos fazer juntas.

5 – Alguma novidade, curiosidade, parceria, agenda de shows… que queira compartilhar em primeira mão com os nossos leitores do SOM e mídia NINJA?

Isma: Olha, posso dizer que estamos desenhando a parte 2 do Gambiarra Chic e promete ser tão boa quanto a primeira, estamos tentando fechar parcerias que o público vai amar demais, tenho certeza.