Foto: @rosanaanjos_

Os manequins e os lambes da instalação artística de Yanaina Mella, com dados e palavras referentes à violência contra as mulheres, foram retirados de exposição a céu aberto na cidade de Santos (SP). A artista, que também é cenógrafa e designer de interiores, diz que foi censurada por causa do conteúdo da obra. Procurados, o Museu do Café e a Prefeitura de Santos negam.

Yanaina contou, em relato publicado no Instagram, como se deu o processo de instalação das peças em uma das fachadas do Museu do Café, cuja ideia era representar duas mulheres, uma salvando a outra de uma situação de violência. “Desde o momento que pisei no local, a intervenção foi censurada por ter sido considerada muito impactante, pois continha uma boneca representando uma mulher vítima de violência com marcas de sangue, além de lambe lambes espalhados com dados estatísticos atualizados sobre o aumento das taxas de feminicídio”, disse no post.

Ao Planeta Ella, a artista disse que o conteúdo da intervenção foi previamente combinado com o curador da exposição e também artista, Leonardo Leite. Mella contou à reportagem que, além de ter as peças da instalação retiradas do local indicado por Leonardo, os seguranças do Museu do Café danificaram uma das peças, arrancaram os lambes e se recusaram a devolver os manequins.

“Retiraram minha intervenção porque meu tema era político. Não esperam que uma mulher artista crie peças que incomodem, que questionem como a que eu fiz”, pontuou Yanaina.

Foto: @rosanaanjos_

A artista diz que foi notificada por e-mail pelo Museu do Café de que a intervenção artística não foi autorizada.

O que diz a prefeitura

Além da nota encaminhada por e-mail, o diretor de comunicação da Prefeitura Municipal de Santos, Murilo Netto Gonçalves falou por telefone com a repórter do Planeta Ella e destacou que a exposição era paralela ao evento promovido pela Unesco na cidade e que não administra o prédio do Museu do Café, não sendo responsável pela retirada da arte de Yanaina.

O representante do governo municipal de Santos disse ainda que a exposição envolveu um coletivo de 15 artistas, não havendo linha para os artistas seguirem. Por telefone, Murilo disse que “a responsabilidade da censura foi do Museu do Café” e que, sabendo do ocorrido, o mesmo entrou em contato com a artista para prestar solidariedade e oferecer suporte para que a intervenção fosse feita em outro espaço.

Sobre a liberação do espaço para a instalação, a nota da prefeitura pontua que o curador da mostra era o “responsável por convidar os participantes e selecionar os locais, bem como conseguir as autorizações de exploração dos espaços”.

A Prefeitura de Santos finaliza a nota dizendo que “o conteúdo da obra está inteiramente de acordo com o posicionamento institucional da Prefeitura, presente em diversas campanhas de conscientização promovidas para combate a todas as violências contra as mulheres. O objetivo da exposição, que ocorreu por iniciativa da própria Prefeitura de Santos, é destacar o talento e a criatividade dos artistas da cidade”.

Leia a nota na íntegra:

“A artista foi convidada pela Prefeitura de Santos, por meio de um coletivo que reuniu 15 artistas, que receberam cachê para realizar uma série de intervenções no percurso do bonde turístico, como parte da programação cultural realizada pelo Município, que ocorreu no final de semana, no Centro.
Destacamos que as atividades culturais foram realizadas pela Administração Municipal, entre os dias 21 e 25 de julho, na região central, em paralelo à Conferência da Rede de Cidades Criativas da Unesco.
O curador da exposição mencionada é o artista Léo Preo, responsável por convidar os participantes e selecionar os locais, bem como conseguir as autorizações de exploração dos espaços.
O caso relatado pela artista Yanaina Mella ocorreu após a instalação de sua obra na fachada de um imóvel administrado pelo Museu do Café. O curador da mostra afirma que a exploração do espaço havia sido previamente autorizada pelos responsáveis pelo imóvel, que pertence ao Governo do Estado e é administrado por uma organização social.
No entanto, em nota oficial, a assessoria de imprensa do Museu do Café afirmou que a instalação não havia recebido autorização prévia e que a retirada da obra ocorreu porque parte dela ocupava a parede do imóvel protegido pela lei de tombamento.
A Prefeitura, em apoio à manifestação, se colocou à disposição da artista para encontrar um outro espaço para que ela realizasse a mesma intervenção.
A Prefeitura de Santos repudia qualquer ato de censura e ressalta que nenhum funcionário da Administração Municipal se envolveu com o ato relatado pela artista.
O conteúdo da obra está inteiramente de acordo com o posicionamento institucional da Prefeitura, presente em diversas campanhas de conscientização promovidas para combate a todas as violências contra as mulheres.
O objetivo da exposição, que ocorreu por iniciativa da própria Prefeitura de Santos, é destacar o talento e a criatividade dos artistas da Cidade.”

O que diz o museu

Em nota, o Museu do Café disse que “a intervenção artística citada não foi previamente acordada com a instituição e que a equipe não possuía nenhum tipo de informação sobre essa programação específica. Por se tratar de um patrimônio público e um ponto turístico que recebe milhares de visitantes, qualquer tipo de instalação (principalmente as suspensas) devem garantir a segurança dessas pessoas e a salvaguarda da edificação”. A nota diz ainda que “devido a esses fatores o material foi retirado e entregue aos artistas e, após esse fato, a instituição não teve mais nenhuma relação com o ocorrido. Reforçamos que um dos pilares do Museu do Café é incentivar o público a desenvolver olhares críticos em relação a assuntos sensíveis e muitas vezes invisibilizados na história do país”.

Leia a nota na íntegra:

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