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Por Alexandre Cristiano Baldacin Junior

O Oscar de 2024 traz uma diversidade muito interessante de produções cinematográficas, e que pouco se fala. Das 53 obras indicadas nas 23 categorias de premiação da noite, temos 19 países diferentes produzindo e/ou co-produzindo obras. E, por mais que esses números possam saltar aos olhos, cabe a nós nos debruçar um pouco melhor para ver como eles são enganosos e pouco representativos.

No número total de filmes indicados, 33 compõem produções e/ou co-produções estadunidenses, um valor que representa 62% de tudo que é mostrado na cerimônia do Oscar. Essa, acredito, é uma excelente forma de percebermos como a Academia de Cinema de Los Angeles busca representar muito a sua própria indústria. Não existe problema nenhum nisso, inclusive; a única questão é o “perigo de uma história única”, como diria a escritora nigeriana Chimamanda N. Adichie. Dizer que o Oscar é a maior premiação de cinema é muito perigoso. Ela pode ser a mais midiática, mas está longe de ser uma premiação plural.

Dando continuidade na análise, temos o Reino Unido em segundo lugar, com cinco co-produções e duas produções completamente próprias. Se somarmos com as duas obras canadenses e a uma co-produção irlandesa, temos basicamente 70% da premiação majoritariamente com filmes que falam a língua inglesa, ou seja, anglófona. Tem-se ainda mais sete nacionalidades europeias com produções e/ou co-produções, sendo a França a terceira colocada no ranking geral, com três obras próprias e outras duas compartilhadas, seguida por Espanha e Alemanha, com duas películas cada, e chegando à Polônia, Ucrânia, Itália e Dinamarca com apenas um representante.

Assim, restam apenas 20% das vagas do Oscar para darem conta dos continentes asiáticos, africano, oceânico e latino-americano. Volto a fazer o questionamento: quem exatamente a premiação em questão está representando?

Fora do eixo norte América Anglófona-Europa, o Japão é o país que mais conseguiu emplacar obras, nas categorias de Melhor Animação, com o já conhecido Studio Ghibli colocando sua sétima indicação ao Oscar, com “O menino e a garça”, em Melhor Filme Estrangeiro, com a obra “Dias perfeitos”, que é uma co-produção com a Alemanha por meio do diretor Wim Wenders, e com “Godzilla Minus One” em Melhores Efeitos Especiais. Inclusive, este é um feito inédito para a Terra do Sol Nascente, e isso foi muito bem abordado no texto do colega Guilherme Movieira “Pela primeira vez com 3 produções japonesas no Oscar, qual é o Japão que a Academia celebra?

Na sequência, temos o Chile com duas produções: o longa-metragem de sátira política “O Conde” e o longa documental “A memória infinita”, ambos produzidos pelo grande diretor Pablo Larraín, figura carimbada no Oscar e em Hollywood, já tendo um retrospecto na premiação nas categorias de Melhor Filme Estrangeiro com “No” (2012), além de categorias técnicas com suas obras anglófonas “Jackie” (2016) e “Spencer” (2021). Lembrando, ainda, que a força do nome de Larraín levou o Chile a ganhar, na premiação de 2018, o prêmio de melhor obra estrangeira com a película “Uma mulher fantástica”, dirigida por Sebastián Lelio, mas produzida por Pablo.

Uganda e Tunísia são as únicas representações de todos os 54 países em África. Vale ressaltar que no continente em questão temos uma cena fortíssima de cinema, tendo a Nollywood, uma das três regiões do planeta em que mais se produz filmes, ao lado da indiana Bollywood e da estadunidense Hollywood. As obras que apareceram em 2024 na premiação são dois documentários: “Bobi Wine”, co-produção de Uganda com Reino Unido e Estados Unidos, e “Les Filles d’Olfa”, feito com a parceria de Tunísia, Arábia Saudita, Alemanha e França.

Por fim, temos a Oceania com nenhum representante neste ano, e não se esqueçam como este continente vem se tornando uma potência em produções cinematográficas nos últimos anos. E a gigantesca Ásia que além dos já citados casos do Japão e da Arábia Saudita, contam ainda com um curta-metragem animado co-produzido por Israel (Letter to a pig), um curta documental co-produzido por Taiwan (Island in between) e um curta-metragem animado cem por cento iraniano, “Our uniform”.   

Dessa maneira, é possível traçar uma radiografia da representatividade do Oscar no ano de 2024. Por mais que a Academia de cinema de Hollywood venha, ano após ano, colocando mais estrangeiros para votarem nas principais categorias, é possível perceber como na nonagésima sexta edição da premiação isso ainda representa muito pouco em um contexto mundial. Como podemos, enquanto brasileiros, investir emocionalmente em algo que deixa apenas 20% de sua mostra para todo o eixo sul do planeta?

Texto produzido em cobertura colaborativa da Cine NINJA – Especial Oscar 2024