Material teria sido levado por oficiais para dentro do Comando Militar da Amazônia

Acampamento bolsonarista antes da desmobilização da última segunda-feira (9), em Manaus, Amazonas. Foto: Junio Matos

Por Cley Medeiros

Após ter sido frustrada por forças de segurança do estado do Amazonas, a tentativa de invasão e atentado por terroristas contra a refinaria Isaac Sabbá, desarticulada na noite do último domingo (8), utilizou a estrutura do Comando Militar da Amazônia para guardar materiais que eram para terem sido utilizados no atentado, que estava sendo organizado dentro do acampamento que funcionava em frente ao Comando, e que foi desmontado após ordem judicial do STF e da Justiça Federal, na segunda-feira (9).

O repórter Waldick Júnior, do A Crítica, divulgou o relatório da Procuradoria-Geral do Estado do Amazonas (PGE-AM) enviado para a juíza  Jaíza Fraxa, da 1ª Vara Federal da Justiça Federal no Amazonas, no dia em que o acampamento foi desmontado. O conteúdo foi confirmado pela reportagem.

Nele, o subprocurador geral Matheus Severiano da Costa afirma que, além dos militares estarem ausentes durante a força-tarefa para desmontar o acampamento, oficiais do CMA conversaram dentro das dependências do Quartel-General, minutos antes da operação acontecer, com os organizadores do acampamento. No mesmo documento, o subprocurador sinaliza a leniência dos militares do Exército ao abrigar dentro do CMA parte do material utilizado pelos golpistas.

“Apesar de ter participado das reuniões no Gabinete de Crise, [o Exército] solicitou espaço para guarda temporária de material usado no manifesto, bem como “realizou negociação de forma individual e, dentro do quartel, diferente do tratado em reunião, quando seria em conjunto com a polícia militar”, destaca trecho do documento assinado pelo subprocurador.

A Mídia NINJA teve acesso ao conteúdo das conversas que apontam a ligação do material abrigado pelos militares como tendo sido utilizado para tentativa de invasão e bloqueio na refinaria.

Como o material usado em tentativa de atentado foi parar dentro do Comando Militar da Amazônia?

Era tarde de sábado quando os últimos ajustes foram feitos pelos organizadores. O pedido das lideranças, que se replicaram grupo a grupo, alertava os terroristas para esconder dentro da estrutura do acampamento no CMA os itens que seriam utilizados na invasão: pequenas ferramentas como alicate, chave de fenda, além de pequenos pedaços de madeira e qualquer objeto que poderia ser identificado como ‘entulho’, incluindo roupas, faixas, fios de energia, eletrônicos, barro e terra. O material inflamável como fogos de artifício também foram solicitados dos acampados. De acordo com levantamento da Polícia Militar, foram pelo menos 35 pessoas até o local da invasão na refinaria Isaac Sabbá, munidos com materiais semelhantes.

Horas antes, a Secretaria de Segurança Pública recebeu dois alertas sobre o perigo representado diante da iminente invasão da refinaria. Os efeitos seriam graves: além do abastecimento de combustível consumido na capital e principais cidades do interior ser afetado, Manaus depende do diesel que sai da Isaac Sabbá para abastecer as usinas termelétricas que produzem energia elétrica para mais de 2 milhões de habitantes.

De acordo com relatórios de inteligência que a reportagem teve acesso, a secretaria obteve dados como nomes, endereço residencial, inscrições no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídica e Física, já que alguns são empresários em Manaus, além das conversas entre os organizadores com o passo-a-passo da ação criminosa. As informações partiram de uma denúncia anônima e foram confirmadas pela reportagem, que monitorou grupos de WhatsApp e Telegram, onde aconteceram as articulações.

22h46, do dia 7 de janeiro de 2023

Organizadores de acampamento em frente ao CMA divulgam resultado da reunião que definiu atentado à refinaria. Foto: reprodução

00h03, do dia 8 de janeiro de 2023

Organizador dá últimas instruções antes da tentativa de invasão da refinaria Isaac Sabbá, em Manaus. Foto: reprodução

10h27, do dia 8 de janeiro de 2023

Impasse entre aqueles que queriam permanecer em frente ao Comando Militar da Amazônia e quem estava disposto a ir até o Distrito Industrial, local da refinaria de Manaus Isaac Sabbá. Foto: reprodução

17h27, do dia 8 de janeiro de 2023

Organizadora afirmando que o ‘barro’ já estava providenciado. A intenção dos golpistas era impedir o abastecimento de combustível em Manaus. Foto: reprodução

22h40, do dia 8 de janeiro de 2023

Foto: reprodução/Giovanna Marinho

 

Foto: reprodução/Giovanna Marinho

Dia 9 de janeiro de 2023

Diálogo no grupo Paralisação Manaus sobre material entregue aos oficiais do Exército. Foto: reprodução

Diálogo no grupo de WhatsApp Paralisação Manaus sobre tentativa de atentado contra refinaria Isaac Sabbá. Foto: reprodução

Desmobilização

É durante a desmobilização do acampamento, no dia 9 de janeiro, após invasão terrorista em Brasília, que os golpistas se articulam para salvar itens com os militares. Conforme relatos de soldados que atuam na guarita do CMA, houve uma aproximação nos últimos dias no acampamento.

Alguns oficiais teriam estimulado que os golpistas fossem para outros locais que tinham peso político e de ação direita, como a sede do Governo do Amazonas e o prédio da Assembleia Legislativa (Aleam), além da refinaria. No caso da sede do legislativo estadual, um alerta foi emitido com reforço da segurança no local desde a segunda-feira. Um esquema contra invasões  foi montado de última hora.

Responsabilização

Para o senador Omar Aziz (PSD), o comandante General Achiles Furlan, do Comando Militar da Amazônia, cruzou os braços diante do crescimento do acampamento. “O ano passado, eu denunciei aqui que comandante militar da Amazônia tinha cruzado os braços vendo aquela mixórdia, no Comando Militar da Amazônia que é o símbolo de resistência das nossas fronteiras. Aqueles militares que estão defendendo as nossas fronteiras, nos temos que ter respeito, mas não temos que ter respeito com aqueles que foram avacalhar o CMA”, afirmou Aziz.

O senador pretende liderar uma articulação no Senado Federal para investigar a relação de militares de alta patente com os atos antidemocráticos. “Não pode ser como a comissão da verdade que nós deixamos pra trás. Temos que punir seja quem for. Vamos punir desde empresário do financiou meu estado que financiou isso, ou quem tem estrelas dos ombro que esta por trás também disso”, reforçou durante discurso no plenário do Senado.

A reportagem entrou em contato com o Comando Militar da Amazônia e aguarda posicionamento. O espaço está aberto.

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