Foto: Rachel Daniel/ Mídia NINJA

Texto: Ascom ALBA

Durante o 1º Parlamento Feminista da Bahia, foi aprovada a ‘Carta da Bahia – Por Mais Mulheres Nos Espaços de Poder’, com a defesa da paridade nos parlamentos, defesa das cotas eleitorais e do financiamento de campanha a ser encaminhada para o Congresso Nacional, o Programa das Nações Unidas pelo Desenvolvimento (PNUD), para ONU Mulheres e para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O documento foi acolhido pelo plenário formado por mulheres preocupadas em refletir os espaços ocupados por elas no universo político. O evento que iniciou na manhã do dia 5 aconteceu durante todo o dia e teve como organização e idealização a Comissão dos Direitos da Mulher da ALBA, presidida pela deputada Olívia Santana (PC do B).

Com a participação de, aproximadamente, 300 pessoas, sendo 50 já eleitas como prefeitas, vice-prefeitas ou vereadoras, o evento foi dedicado à memória das diversas mulheres vítimas de feminicídio na Bahia, entre elas Elitânia da Hora, assassinada no município de Cachoeira, e debateu o papel da mulher na política e nos partidos políticos, o financiamento de campanha das candidaturas femininas, a cota para as mulheres nas chapas proporcionais, as condições plenas e igualitárias de atuação das mulheres no parlamento e demais espaços políticos e autonomia econômica, protagonismo político e o fim da violência contra as mulheres.

O regimento com os objetivos e a pauta do Parlamento Feminista foi aprovado pelas dez deputadas da ALBA: Fabíola Mansur (PSB), Ivana Bastos (PSD), Jusmari Oliveira (PSD), Kátia Oliveira (MDB), Maria del Carmen Lula (PT), Mirela Macedo (PSD), Neusa Lula Cadore (PT), Olívia Santana (PC do B) e Talita Oliveira (PSL).

DOCUMENTO

Reconhecendo todo o contexto de tentativa de afastamento das mulheres de espaços de poder, a ‘Carta da Bahia’ enfatizou a necessidade das cotas para participar das eleições. “Tivemos um crescimento de 51% de mulheres nas Eleições para a Câmara dos Deputados, o maior aumento da história. Saímos de 51 mulheres eleitas em 2014, para 77 deputadas eleitas, em 2018. Nas Assembleias Legislativas, o crescimento foi de 35%. No mesmo período saímos de 119 mulheres eleitas deputadas estaduais para 163”. Ao tempo, que repudia o uso das chamadas candidaturas laranjas e convoca o Judiciário a aplicar as medidas legais inibidoras desta fraude.

“Nós entendemos que neste momento a luta é uma só. Pela emancipação de todas e pelo empoderamento dessas mulheres”, disse Olívia Santana. “É momento de enfrentar esses radicais conservadores e promover a revolução para ter uma sociedade mais igualitária. A nossa maior luta é trabalhar para que acabemos com o pensamento machista”, pregou Jusmari Oliveira, vice-presidenta da Comissão dos Direitos da Mulher.

O presidente da Casa, deputado Nelson Leal (PP), refletiu sobre a inferioridade e submissão a que as mulheres são submetidas na sociedade. “O machismo não é apenas perigoso, é um sinal de atraso secular que deveria envergonhar todo homem. Não quero e não aceito nenhum ato de violência ou discriminação contra as mulheres”, disse.

PARTICIPAÇÃO

Foto: Juliana Lira/ Mídia NINJA

A reflexão sobre a participação das mulheres na política tem uma razão de existir. Segundo dados da União Interparlamentar, atualizados em 1º de março de 2017, o Brasil é um dos países menos igualitários do mundo, sob o ponto de vista da participação das mulheres na política, ocupando o 153º lugar entre 194 países pesquisados, quanto à presença de mulheres nos parlamentos.

Na Bahia, os dados atuais não são tão discrepantes. De acordo, com a secretária de Relações Institucionais (Serin) do Estado da Bahia, Cibele Carvalho, dos 417 municípios baianos, apenas 54 são administrados por mulheres e em 56 elas estão como vice-prefeitas. Entre os 4.494 vereadores que ocupam as câmaras dos municípios baianos, apenas 505 são mulheres. Na ALBA, dos 63 deputados, 10 são mulheres e dos deputados federais eleitos, há apenas duas. E nenhuma mulher baiana ocupa atualmente a vaga no Senado Federal. Cibele se diz orgulhosa de ser a primeira mulher a assumir a articulação política na Bahia e alerta para a necessidade de meios para ampliação da participação.

LUTA POR ESPAÇO

Foto: Juliana Lira/ Mídia NINJA

A professora Lindinalva de Paula, de 57 anos, já disputou uma vez a vaga para a Câmara de Vereadores de Salvador e pretende concorrer na próxima eleição, pelo Partido dos Trabalhadores. Ela, que integra a Rede de Mulheres Negras da Bahia, denuncia que as pautas levantadas pelos movimentos sociais encontram resistência nos partidos. Andrea Marques, que concorreu a uma vaga pelo Partido Verde para a Assembleia Legislativa da Bahia, reclama sobre a ausência de mulheres com poder decisório dentro da legendas. “Sempre nos colocam para resolver apenas questões relacionadas às mulheres e nós estamos preparadas para debater tudo”, defendeu.

No interior, as mulheres também sofrem preconceito dos diversos tipos para serem impedidas de disputar eleição. Glaucia Nunes, de Sítio do Mato, está no seu segundo mandato como vereadora e é pré-candidata a prefeita do seu município. “Primeiro, eles achavam que eu não teria capacidade de chegar no segundo mandato, cheguei. Agora, que sou pré-candidata a prefeitura, a primeira mulher a postular o cargo, eles estão inventando fake news, querendo que eu me silencie. Mas já denunciei. Somos perseguidas, principalmente se fazemos oposição ao Executivo municipal”, disse.

Em São Paulo, a situação não é diferente. Uma das deputadas estaduais eleita pelo maior colégio eleitoral do Brasil, Leci Brandão (PC do B), criticou a falta de participação das mulheres e a defesa das minorias sociais. “Tem horas que eu me pergunto: o que estou fazendo aqui neste negócio?”.

Com um cenário não muito animador, a psicóloga Ariane Sena diz preferir estar nos bastidores dos mandatos. A secretária de juventude da Associação Nacional das Travestis e Transexuais (Antra) diz reconhecer a realidade cruel da política e, por isso, prefere não concorrer. “Vivemos com processos adoecedores que são diários. Prefiro não concorrer, porque sei que somos deslegitimadas, não nos chamam por nossos nomes sociais. O processo de zombaria é cotidiano, que precisa ser combatido, por isso não me ausento dos espaços para garantir nossas pautas”.

“Uma mulher a mais nesse espaço é um homem a menos. Uma travesti preta nesse espaço é um macho branco a menos. A minha pergunta é: qual o partido político que está disposto a comprar essa briga?”, questionou Robeyoncé Lima, primeira mulher trans eleita para Assembleia Legislativa de Pernambuco, é codeputada pelo mandato coletivo Juntas, pelo Psol.

Participaram do evento as deputadas Fabíola Mansur (PSB), Fátima Nunes Lula (PT), Maria del Carmen Lula (PT), Kátia Oliveira (MDB) e os deputados Zó (PC do B), Robinson Almeida Lula (PT) e Aderbal Caldas (PP).

Estavam na mesa do evento: Dríade Aguiar, do movimento Ella; a secretária de Política para as Mulheres, Julieta Palmeira; Michele Dantas, do Fundo da População das Nações Unidas; cantora Margareth Menezes; Mônica Francisco, deputada estadual pelo Rio de Janeiro; Cacica Kátia, líder indígena tupinambá do município de Belmonte; Milena Caridad, consulesa de Cuba; deputada cubana Anabel Petro de la Paz; e Fabya Reis, secretária de Promoção da Igualdade.