Os fertilizantes são responsáveis por graves impactos ao meio ambiente (Imagem ilustrativa / CatKosianok/Pixabay)

 

Empresa do banco canadense Forbes & Manhattan, a Potássio do Brasil Ltda. foi acusada pelo Ministério Público Federal (MPF), de tentar cooptar indígenas do povo Mura para explorar potássio na Amazônia. Se aprovado o PL 191/2020, que libera a mineração em terras indígenas, ela será bastante beneficiada.

Ou seja, defender autonomia do Brasil para explorar potássio e deixar de depender do mercado exterior, principalmente, da Rússia, de onde vem boa parte dos produtos utilizados no Brasil, é mais uma balela de Bolsonaro. Com a guerra na Ucrânia, ele conseguiu acelerar a tramitação do projeto de autoria do Executivo, no Congresso, com apoio da bancada ruralista, mesmo com o Brasil já tendo reservas que garantem a matéria-prima até 2100. Bolsonaro quer invadir e explorar territórios sagrados para os povos originários para satisfazer sua ganância. E sabemos que o potássio é só o ponto de partida para um projeto de devastação ambiental e genocídio indígena para a exploração do ouro e pedras preciosas.

No caso da Potássio do Brasil, segundo levantamento da Folha de São Paulo, de 2008 até os dias atuais, a empresa já fez 183 requerimentos à Agência Nacional de Mineração (ANM), para explorar sais de potássio base para fertilizantes utilizados na agricultura em larga escala.

Mas um dos principais focos é mesmo a região de Autazes (que fica sobre uma jazida de sais de potássio descoberta há pouco mais de uma década), entre os rios Madeira e Amazonas, em uma área que fica a menos de três quilômetros da TI do povo Mura. Segundo o MPF, que moveu ação civil pública contra a empresa na Justiça Federal no Amazonas em 2016, ela teria, inclusive, operado dentro do território tradicional, ora ignorando a presença dos indígenas, ora tentando aliciá-los.

Em um acordo com o MPF a empresa se comprometeu a ouvir os indígenas antes que fosse realizada a exploração do potássio e assim, o processo de licenciamento ambiental foi suspenso. E com a pandemia, a consulta prévia não foi adiante e ainda não há um desfecho. Vale ressaltar, no mesmo ano que Bolsonaro assumiu a presidência, 2019, a Potássio do Brasil fez outros três requerimentos de exploração de potássio em áreas de terra indígena, como a TI Jauary, em Autazes, em fase de delimitação e homologação.

O presidente da empresa, Adriano Espeschit, disse à Folha que na realidade são quatro, desmembrados para exploração de áreas no entorno do território. “Em 2019, o procedimento de consulta ao povo Mura foi deflagrado, mas foi interrompido devido à pandemia. A Potássio tem como princípio respeitar as normas ambientais e os direitos dos povos tradicionais e reconhece a importância da consulta prévia, livre e informada do povo Mura”, disse.

O início do conflito

Uma outra reportagem, do Mongabay, que trata das irregularidades do projeto, aponta que a Potássio do Brasil iniciou as atividades de prospecção dentro da TI Jauary em 2013, período em que a área já estava delimitada, e perfurou um cemitério sagrado para a comunidade. Ao repercutir conteúdo da ação do MPF, a matéria narra que os indígenas ameaçaram atear fogo no maquinário da empresa para cessar as escavações.

“Quando as lideranças perceberam, eles já estavam extraindo esse material sem nos consultar”, diz Gilmara Lelis, tuxaua da aldeia Sampaio. Isso ocorreu porque a Potássio do Brasil fez outro caminho para liberação da prospecção, solicitando  autorização ao Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam). O processo de licenciamento teve ao menos duas irregularidades, além da autorização de prospecção dentro de terra indígena.

O Estudo de Impacto Ambiental que compõe o processo movido pelo MPF apontou como significativos os potenciais impactos sobre a fauna e a flora aquáticas.

E citou também uma provável incidência “muito alta” de outros tipos de danos, como o aumento da pressão ocupacional e sobre os serviços públicos, maior ocorrência de problemas de saúde, alteração da paisagem e interferência nos referenciais socioespaciais e culturais das comunidades tradicionais. Esse potencial poluidor, aliado ao porte excepcional do empreendimento, atrairia a competência do Ibama para o licenciamento, de acordo com a legislação. Além disso, faltou a análise obrigatória da Funai sobre a parte dos estudos dedicada a aferir o impacto sobre os indígenas no licenciamento feito pelo órgão estadual.

Na ACP, o MPF destacou ainda que houve “conduta de má-fé, conforme os vários relatos dos indígenas Mura, consistente na cooptação de lideranças, moradores e até mesmo servidores públicos por meio de promessas, favores e benefícios, conformando graves vícios de vontade na decisão dos indígenas”, como diz trecho da reportagem da Folha.

Os procuradores da República que atuam na Amazônia já adiantaram que pretendem contestar eventual lei que libere mineração em terra indígena, dentro de mais de dez ações contra garimpos em áreas demarcadas.

Manifestação indígena

Indígenas Mura são pressionados pela empresa de mineração, fazendeiros e criadores de búfalos (J.Rosha/Cimi Norte I)

O governo Bolsonaro já estava de olho em Autazes. Em 2020, na sede da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas, o vice-presidente Hamilton Mourão já havia declarado que liberar a exploração do minério no município era uma das prioridades do governo (vide vídeo abaixo).

Ao Mongabay, a liderança indígena do povo Mura, Raimundo Nonato Mendonça destacou: “nosso município ficou conhecido como a menina dos olhos do governo federal, mas não é por causa da nossa população indígena, que é muito discriminada; é por causa do minério que eles querem levar embora”, alertou.

Impactos ambientais

Em geral, a produção de fertilizantes minerais parte da extração mineral. No caso do potássio, a partir da rocha potássica.

Amplamente utilizados para o desenvolvimento da agricultura, os fertilizantes são responsáveis por graves impactos ao meio ambiente. Em artigo sobre o processo produtivo e considerações ambientais, o Projeto de Pesquisa em Engenharia Química (Propeq), diz que “além dos problemas advindos da extração mineral, como o possível desmatamento de grandes áreas e a geração de riscos à biodiversidade local, pode-se ressaltar a produção de resíduos sólidos e efluentes líquidos e gasosos no processo de fabricação dos fertilizantes”.

A Propeq fala também dos riscos de contaminação do solo, do ar e de corpos d´água, principalmente lençóis freáticos, pois o processamento das rochas para a obtenção de nutrientes, por exemplo, acarreta a formação de rejeitos sólidos, usualmente mantidos em barragens.

Outros resíduos indesejados também são gerados com o uso de produtos químicos e ácidos, como o flúor, material particulado, óxidos de enxofre e nitrogênio e vapores de natureza ácida. “Além disso, os efluentes líquidos, como ácidos e amoniacais (alcalinos), podem provocar a eutrofização de rios e lagos caso sejam destinados incorretamente, devido ao alto teor de matéria orgânica (nitrogênio, fósforo e potássio)”, como consta no artigo da Propeq.

Por conta dos riscos ao meio ambiente é que deve haver muita atenção para a liberação e fiscalização desse tipo de atividade. Mas o que o governo de Bolsonaro tenta a todo momento, é flexibilizar regras em todas as instâncias para levar adiante seu projeto de destruição ambiental do Brasil.