(Arquivo pessoal)

 

No mesmo dia da chegada ao Acampamento Terra Livre, o indígena do Xingu, no Mato Grosso, Walamatiu Yawalapiti foi barrado no supermercado Comper, em Brasília. Ele que chegava com sua delegação pela primeira vez, para somar à luta dos 200 povos que marcam presença na mobilização.

Este ano, o tema é “Retomando o Brasil: Demarcar territórios e aldear a política”. Essa foi a primeira batalha. No enfrentamento, a defesa dos seus direitos. Com diálogo, reverteu a situação. Ironicamente, resultado desejado por todos indígenas ali reunidos.

Logo depois da apresentação da delegação na manhã desta quinta-feira (7), de shorts, adornos e pintura corporal, Walamatiu foi comprar peixe para o almoço.

“Andei por 20 metros e um segurança me parou, dizendo que eu não poderia entrar porque estava sem roupa. Ora, reclamam que indígena tem que usar roupa de indígena. Mas então, estou eu com meu traje de gala e sou proibido de entrar”, desabafou.

O indígena do povo Yawalapiti explicou que a pintura corporal era a sua roupa. “É meu traje de guerreiro, porque é para isso que eu vim”. Uma advogada que estava no supermercado, acompanhou a cena e passou a registrar a abordagem do segurança, via celular. O segurança, disse que eram ordens da “chefia”.

Quando a gerente chegou, Walamatiu ressaltou que não ficaria calado. “E se a senhora não permitir minha entrada, então vai falar com o papel”, sugerindo que processaria o estabelecimento por racismo.

“Por que vocês falam que se o indígena anda com roupa, não é indígena. E quando ele cultiva a sua cultura, ele não pode”. E então, segundo Walamatiu, ela se “convenceu” e pediu desculpas.

“O que fiz foi tentar educa-la, falando dos meus direitos. Se ela não acatasse, com certeza que eu acionaria a Justiça. Eu estou aqui para lutar, para que o governo respeite nossa cultura, nossos territórios”.

Lembro da advogada que acompanhava a cena me orientando a permanecer lá. “Eles têm que te respeitar. Você é original do Brasil”, relembra.

“Com respeito a gente muda a visão da pessoa. Dei uma chance para eles. Segui com o meu objetivo, comprei o peixe. Mas acima de tudo, dei uma lição para que eles não façam com mais ninguém o que fizeram comigo”.

Ele lamenta o fato do governo Bolsonaro não agir da mesma forma. “Tenho sentido muitos golpes ao longo dos tempos. Eu estudava medicina, mas o governo cortou as bolsas. Voltei para a aldeia, não tinha condições financeiras.

Para você ter uma ideia, em um ano eu aprendi muita coisa e consigo ajudar na minha aldeia. Quando alguém tem luxação, fraturas, eu consigo ajudar. Imagina o quanto eu não poderia fazer. Mas eu vou tentar de novo, agora, vou tentar fazer enfermagem. Foi neste um ano que aprendi também com uma professora de psicologia a lidar com as pessoas. Acho que foi importante no caso do mercado”.