Presidente eleito Lula (PT) diz que a ida dele para a COP27 é para anunciar “ao mundo que o Brasil está de volta ao cenário mundial para discutir clima”

Lula e Marina na COP27. Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação

Com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a mudança de expectativa quanto à postura ambiental do Brasil já começa a ser perceptível na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP27, que acontece no Egito.

Essa mudança de expectativa ficou clara, nesta segunda-feira (14), diante da previsão do coordenador geral do MapBiomas, Tasso Azevedo, de que o Brasil poderá vir a se tornar o primeiro país a zerar as emissões líquidas de gases do efeito estufa (GEE) até 2040. Em seu discurso de vitória, Lula reiterou o compromisso com o desmatamento zero na Amazônia.

Para Azevedo, essa possibilidade é real. Ele participou do painel “Uso da terra no Brasil: vilão, vítima ou herói da crise climática?” Segundo Tasso, o fato de o Brasil ter a maior parte de suas emissões ligada ao uso da terra, o que inclui desmatamento e fogo associado, e às atividades agropecuárias torna viável neutralizar com “relativa rapidez” a liberação dos gases que aumentam a temperatura do planeta.

“Se eliminarmos as emissões por uso da terra, dá uma redução de 77% nas emissões brasileiras em relação a 2005. Se considerarmos a variação de carbono no solo por manejo de pastagem, podemos tirar mais 230 milhões de toneladas, que são absorvidas nos solos agrícolas. E se acrescentarmos nessa conta que é possível reduzir 200 milhões de toneladas de metano, nossas emissões praticamente seriam residuais. Lembrando ainda que, quando reduzimos o desmatamento, isso aumenta a regeneração e, por consequência, a absorção de gases. É muito possível o Brasil ser o primeiro país com emissões líquidas zeradas, em algum momento entre 2030 e 2040”, disse o coordenador geral do MapBiomas.

No caso, tal possibilidade só implicaria um real compromisso com o país com a questão ambiental. O que parece tornar-se agora possível com a mudança no governo. Este tom é o esperado para o discurso que o petista fará nesta quarta-feira (16) na Conferência do Clima da ONU. O combate às desigualdades e à fome de forma sustentável, além do compromisso com o desmatamento zero também devem compor a fala de Lula.

Em um vídeo gravado ao lado da ex-ministra do Meio Ambiente Maria Silva, o presidente eleito Lula (PT) disse que a ida dele para a COP 27 será para anunciar “ao mundo que o Brasil está de volta ao cenário mundial para discutir clima”. Ele também falou sobre a soberania da Amazônia.

https://twitter.com/LulaOficial/status/1592623712481988608

Queima de combustíveis fósseis

O Brasil, que está entre os cinco maiores poluidores, emitiu 2,42 bilhões de toneladas brutas de carbono equivalente em 2021. Foi o maior aumento em 19 anos, de 12,2% comparado ao ano anterior. A medida do carbono equivalente representa a soma do efeito superaquecedor de todos os tipos de gases do efeito estufa na atmosfera. As emissões nos outros grandes poluidores, como Estados Unidos, China e Rússia, estão mais atreladas à queima de combustíveis fósseis.

Florestas e outros tipos de vegetação nativa – como savanas, tundras e áreas alagadas – guardam estoques de carbono acima e abaixo do solo. De acordo com o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), florestas tropicais como a Amazônia podem estocar cerca de 243 toneladas de carbono por hectare. A cada ano, todas as florestas do mundo absorvem em torno de 15,6 bilhões de toneladas de carbono – quantidade equivalente a três vezes as emissões anuais dos Estados Unidos -, mas quase metade (8,1 bilhões) volta à atmosfera por conta do desmatamento, fogo e degradação.

“Cerca de 25% das emissões são retiradas da atmosfera pelas florestas tropicais. Com isso, elas resfriam o planeta. São como aparelhos de ar-condicionado naturais. Se a gente remove toda floresta tropical no planeta, isso vai aumentar em 1°C a temperatura média global, por conta da diminuição da umidade e do efeito resfriamento. Então elas nos prestam um grande serviço”, concluiu Michael Coe, diretor do programa Amazônia no Centro de Pesquisa do Clima Woodwell. Os bilhões de toneladas de gases do efeito estufa em curto período causam o superaquecimento.

Desafios ambientais

Com o desmatamento de vegetações nativas e a degradação da área no entorno de queimadas associadas ao desmate, todo o carbono acumulado nas raízes e na estrutura das árvores e plantas retorna para a atmosfera. “Esse é o legado que o governo Lula vai herdar. O desmatamento que está ocorrendo no governo Bolsonaro vai entrar na conta da primeira taxa de desmatamento que o governo Lula vai soltar, e olha que já está alta, e o ano não terminou. Se parasse para contabilizar agora, o desmatamento da Amazônia até outubro já seria praticamente equivalente à taxa de 2016/2017 inteira”, comentou Ane Alencar, diretora de Ciência no Ipam e coordenadora do MapBiomas Fogo.

A área desmatada em 2021 na Amazônia Legal foi de 13.038 quilômetros quadrados, a maior desde 2006, quando o desmatamento estava em queda desde os 27.772 quilômetros quadrados desmatados em 2004. Como consequência, as emissões por desmatamento aumentaram 20% no país.

Cotada para assumir o Ministério do Meio Ambiente do governo Lula, a deputada federal eleita por São Paulo Marina Silva (Rede) afirmou que a nova gestão terá de se mobilizar para uma “reconstrução” após a “guerra de Bolsonaro com o meio ambiente”. A ex-ministra, que está no Egito por causa da COP27, deu a declaração em entrevista ao jornal O Globo.

“O governo terá que reestruturar tudo que foi destruído. Precisará recompor equipes, recompor Orçamento. […] Tudo isso terá que ser reestruturado, e muitas vezes fazer isso é mais complicado do que criar algo novo, como nós tiramos do zero em 2003 com o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm)”, afirmou Marina.

Com informações do Congresso em Foco

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