O novo trabalho do grupo Aquela Cia traz personagens históricos ligados ao movimento musical carioca

Elenco de Chega de Saudade! da Aquela Cia. Foto: João Julio Mello

Chega de Saudade!, a mais recente obra teatral da Aquela Cia., estreia hoje, sábado (19), nos palcos presenciais. As apresentações acontecem até 24 de abril de 2022, no Teatro Anchieta, no Sesc Consolação, em São Paulo. A direção é de Marco André Nunes e o texto de Pedro Kosovski.

Os ingressos estão disponíveis para venda em sescsp.org.br ou nas bilheterias das unidades do Sesc São Paulo.

A peça foi encenada virtualmente em 2021, e para a temporada presencial volta ao conceito original, passando por algumas adaptações. “O trabalho que vai estrear agora no Sesc Consolação retoma a genética desse projeto, como ele foi concebido. O trabalho audiovisual acabou se tornando uma espécie de desvio em função de toda essa situação da pandemia – o que nos possibilitou entrar em contato com uma linguagem que a gente não tinha ainda trabalhado, foi uma experimentação positiva”, conta Pedro Kosovski.

Neste novo trabalho, o grupo retoma (ficcionalmente) personagens, biografias e memórias da Bossa Nova, na emergência de um Rio de Janeiro do “amor, do sorriso e da flor”, dos anos 1950 e 1960, em uma versão somente com atrizes e atores negros. No elenco estão Blackyva, Felipe Oládélè, Hugo Germano, Izak Dahora, Jessica Barbosa, Muato e Polly Marinho.

As canções-ícone do movimento conduzem a narrativa, compondo um fluxo emocional que evoca e, ao mesmo tempo, atualiza o movimento musical, fazendo um paralelo entre o Rio de Janeiro cantado nas canções idílicas e como de fato é a cidade, na visão de um grupo de artistas com perspectivas distintas.

Re(des)montando a Bossa Nova

O movimento criado nos anos 1950 por jovens brancos e de boas condições financeiras – que falava de temas como o amor e tinha como cenário as praias do Rio de Janeiro – trouxe inovação à música brasileira e criou novas formas de batidas de violão e de harmonia. Na versão da Aquela Cia., personagens históricos como João Gilberto, Roberto Menescal, Sylvia Telles, Nara Leão e Carlos Lyra ganham versões encenadas por atores e atrizes negros. Ao mesmo tempo que, do seu modo, o coletivo presta uma homenagem à Bossa Nova já em seu título, sendo que o ponto de exclamação anuncia para onde caminha o espetáculo.

A estrutura da nova versão mantém a da peça-filme. São três partes, com nomes que se referem a “o amor, o sorriso e a flor” – segundo álbum de João Gilberto (lançado em 1960) e cujo verso está também na canção “Meditação”. A obra teatral começa com a recriação ficcional de um sarau no apartamento da jovem Nara Leão, nas criações de canções como “Desafinado” (de João Gilberto), “O Barquinho” (de Roberto Menescal) e “Garota de Ipanema” (de Tom Jobim).

Na segunda parte de Chega de Saudade! as personagens se questionam como aqueles jovens dos anos 1950 veriam este futuro, tão distante do sonho de Brasil que eles cantaram.

Na terceira parte, personagens, atrizes, atores, fantasmas e seres vivos em uma descida ao inferno onde se faz escutar o grito: Chega! Chega de saudade! Seria possível sustentar algum lirismo em tempos como os nossos? Qualquer espécie de lirismo que rompa a mudez do horror?

Foto: João Julio Mello

Audiovisual

A versão peça-filme estreou durante a Ocupação Mirada, em novembro de 2021, e agora, concomitante a esta temporada presencial, a Aquela Cia. também vai disponibilizar em seu canal de Youtube a versão audiovisual de Chega de Saudade! a partir do dia 19 de março, sob demanda. É uma oportunidade para assistir, num mesmo período, nos dois formatos. Este modo de contar a história, por meio de uma tela, traz três diferentes ambientações e tem elenco diferente do espetáculo que inicia temporada no Sesc Consolação: Andrea Bak, Flávio Bauraqui, Hugo Germano, Matheus Macena, Muato, Ona Silva e Vilma Melo.

Começa com a recriação ficcional de um sarau no apartamento da jovem Nara Leão. Na segunda parte de Chega de Saudade! esses jovens saem dos apartamentos onde os encontros aconteciam para um teatro (vazio) na busca pela produção de um documentário sobre o período, com os atores e as atrizes se questionando como aqueles jovens dos anos 1950 veriam este futuro, tão distante do sonho de Brasil que eles cantaram. Na terceira, finalizados os trabalhos de captação, o elenco conversa sobre suas próprias experiências na criação do espetáculo e das suas relações com o tema e o momento.

O espetáculo Chega de Saudade!, que inicia temporada no Sesc Consolação, dá continuidade à interface com a linguagem audiovisual iniciada em sua peça-filme, lançando mão de projeções tanto de transmissões ao vivo da peça quanto de materiais de arquivo como fotografias e matérias de jornais que mostram a construção da cena cultural e estética daquela nação, hoje um tanto distante devido aos traumas políticos, raciais e sociais.

Aquela Cia.

Marco André Nunes e Pedro Kosovski fundaram em 2005 esse núcleo de realização em artes da cena sediado no Rio de Janeiro. Com ênfase em processos de criação coletiva e na elaboração de uma dramaturgia inédita atravessada pelos conceitos de memória coletiva, fabulação e imaginário social, dentre as suas obras mais recentes destacam-se a “Trilogia Carioca” formada por “Cara de Cavalo” (2012), “Caranguejo Overdrive” (2015), “Guanabara Canibal” (2017). Em 2022, está prevista a estreia da peça teatral “Terra Desce”.

Texto via assessoria