Foto: Divulgação

Por Beatriz Almeida

O tapete vermelho é sempre o lugar com grandes expectativas e os olhares do público e da mídia sobre looks deslumbrantes de grifes renomadas. Mas nos últimos anos, o Oscar e outros eventos dedicados a indústria cinematográfica também têm se tornado um meio para levantar bandeiras importantes para a sociedade.

Justamente por ser um espaço em que as lentes se voltam às celebridades, o momento se torna oportuno para que a indústria da moda abuse de toda irreverência e controvérsia para chamar atenção e causar impacto através da roupa.

A moda, ainda que muito subjugada, sempre foi uma forma de comunicação. Toda roupa transmite uma imagem, conta uma história. Roupa importa, é movimento e simbolismo.

Natalie Portman veste os nomes das diretoras não reconhecidas pela premiação

No filme Cruella, dirigido por Craig Gillespie, que concorre ao Oscar de Melhor Figurino e Melhor Maquiagem e Penteado, é perceptível esse movimento: Cruella, ainda quando Estella, chamava atenção por sua rebeldia, transgressão, ousadia e inconformismo, desde criança criava looks para dar margem a toda sua personalidade fora da caixa.

O filme que permeia os anos 70 e 80 traz referências da contracultura de Londres, fazendo menção ao movimento punk e toda rebeldia e raiva acumuladas. Cruella aceitava que não fazia parte e não se enquadrava nas normas sociais impostas, e o filme todo gira, de certo modo, em torno da moda, de uma disputa por poder e admiração a partir de narrativas distintas: Cruella, uma jovem rebelde, livre e destemida com seus looks despojados e agressivos, e a baronesa com suas peças clássicas, conservadoras e elegantes.

Quando e como o cinema, a moda e política se conectam na vida real?

A partir do momento em que o artista cede àqueles minutos de “glória”, quando abre mão e direciona o foco para uma manifestação na intenção de gerar visibilidade e dar voz a minorias, ele gera e afeta a quem o assiste, viabiliza uma comoção, sensibilidade e desconforto e através desses mecanismos provoca debates e possíveis mudanças.

Nesse momento, a roupa pode ser complemento do discurso, pode ser o próprio manifesto e aí o encontro é possível. Tanto a moda como o cinema têm como foco ampliar o alcance de pessoas, facilitar a articulação de discursos em torno de lutas e questões sociais, e o resultado disso tudo? Política. Tudo é político.

No ano de 2020, o Oscar foi tomado por manifestações por parte dos premiados: Petra Costa, diretora de Democracia em Vertigem, usou o espaço e a visibilidade para cobrar resposta pelo assassinato de Marielle Franco, morta em março de 2018 e que até agora segue sem ser esclarecido, e também sobre as causas indígenas.

Foto: Divulgação

Julia Reichert, codiretora da Indústria Americana, usou seu discurso para endossar teor político.

Natalie Portman, por sua vez, fez do tapete vermelho um manifesto feminista ao usar em sua roupa os nomes das diretoras não reconhecidas pela premiação, como mostra a revista Vogue.

Já em 2018, no Festival de Cannes, cerca de 82 mulheres, dentre elas cineastas, diretoras e atrizes, manifestaram contra a falta de igualdade de gênero e representatividade por parte da indústria cinematográfica.

No mesmo festival, no ano de 2016, Kleber Mendonça Filho e Juliano Dorneles de “Aquarius”, ganharam os holofotes ao manifestar politicamente contra o impeachment e o golpe parlamentar brasileiro daquele ano.

Protestos e manifestações políticas fazem parte das premiações de cinema e costumam perpetuar para além do momento da premiação.

Enquanto os grandes eventos do cinema não forem referência de equidade de gênero, representatividade LGBTQIA+ e racial, ou por quanto se perpetuarem as diferenças de classe e o elitismo impeditivo de que mais pessoas ocupem esse espaço, manifestações e atos políticos devem continuar ocorrendo para que cada vez menos realidades sejam invisibilizadas.

Texto produzido em cobertura colaborativa da Cine NINJA