A Casa Rural Familiar é mais uma iniciativa da sociedade civil que promove a agroecologia e questões socioambientais na cidade de São Mateus do Sul, no interior do Paraná. Com recursos provenientes de parcerias governamentais, a Casa desenvolve diversas iniciativas que buscam fortalecer a agricultura familiar e o desenvolvimento sustentável na região. A proteção de nascentes, o tratamento do esgoto de forma natural, a geração de renda por meio da piscicultura, dentre outras iniciativas, têm avançado nos territórios do município.

Muitos projetos já foram implantados neste sentido, como o Horta Mandala, que consiste num sistema integrado de produção vegetal com a criação de animais, gerando o mínimo de resíduo possível. Muitos dos projetos da entidade preveem a reutilização do lixo orgânico por meio da compostagem, de modo a reciclar os resíduos promovendo a geração de insumos orgânicos. Os viveiros de piscicultura e o tratamento dos seus resíduos também estão entre os projetos desenvolvidos.

Entre as iniciativas promovidas pela Casa, se encontra o Projeto Ecos do Campo, desenvolvido com apoio da Petrobras. Desde o ano passado, foram investidos cerca de R$ 840 mil divididos em etapas, possibilitando ações até o final de 2023. O projeto oferece cursos de capacitação, oficinas, implantação de sistemas agroecológicos de tratamento de esgotos, proteção de nascentes, dentre outros benefícios. Com foco na geração de renda, há formação de jovens, cursos de piscicultura, produção de geleias, derivados do leite e conservas e outros alimentos .

De acordo com Gisela Lazzari, educadora ambiental e comunicadora do projeto, a iniciativa está permitindo a articulação entre a prática pedagógica realizada pela escola e as práticas sociais no campo. “Isso implica transformar a escola num instrumento que opere a vinculação do saber universal com o saber alternativo proveniente das famílias dos agricultores. Temos uma equipe multidisciplinar de áreas da agricultura, da agroecologia e ambiental que, através de suas ações, aproxima a escola da comunidade onde está inserida”, afirmou.

O objetivo é promover a geração de renda através da agroecologia melhorando o ambiente das comunidades rurais. Estão previstos para o ano que vem proteção de mais nascentes, assistência técnica nas propriedades e cursos de formação, além da construção de mais cinco Estações de Tratamento de Esgoto por Zona de Raízes (ETEZR), que utilizam o solo com cimento, bambu e plantas macrófitas (folhas largas com alta capacidade de evapotranspiração, que desempenham um papel importante na mudança do solo poluído pelos resíduos para um jardim).

Segundo a técnica em meio ambiente, Marli Ramina Ribas, como cada nascente é única e tem características diferenciadas, os reservatórios (técnica solo-cimento) são escolhidos conforme o tamanho e a necessidade de armazenamento. São utilizadas manilhas ou caixas d’água e, para recuperar a área do entorno, é feito o cerceamento, além da recomposição da mata com mudas de espécies nativas da região.

“Dividimos entre clímax e pioneiras, sempre buscamos seguir a legislação, porém nem sempre a realidade da propriedade tem tal área disponível para recomposição, pois são pequenas e, até o momento, não existem programas e leis que incentivem ou remunerem estas famílias por tais serviços ambientais. Tentamos conciliar a preservação da água com a necessidade do uso da área para outros fins que geram renda para a família”, afirmou.

Um dos agricultores atendidos pela ETEZR, o jovem Rafael Kwiatkowski Terres, de 31 anos, diz que o projeto sanou 100% o passivo ambiental que havia na sua propriedade. Sua esposa, Cristiane Goncalves Terres, também destacou o processo de aprendizado e a oportunidade de conhecer pessoas que acabaram se tornando amigas da família. Eles cultivam milho para alimentação das vacas, que é a principal fonte de renda com a venda do leite.

“A fossa implementada foi muito boa, porque tínhamos um problema sanitário com a fossa negra, que acabou desmoronando no nosso terreno. Nos procuraram trazendo a tecnologia de solo-cimento, que foi trazida para a região mas nunca tínhamos visto. A instalação está funcionando perfeitamente, agora só temos que ter um cuidado de mantê-la com as plantas verdes, que estão muito bonitas, por cima. Nossa propriedade ganhou muito com esse projeto, porque é um circuito fechado e o resíduo final não sai dali, preservando o meio ambiente”, afirmou o agricultor.

Contexto Cultural e Econômico

A Casa Rural Familiar é uma Organização da Sociedade Civil (OSC) constituída por uma Associação de Agricultores Familiares. Nasceu em 2006, a partir da iniciativa dos agricultores locais com apoio da antiga Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) , hoje IDRH-PR, junto a lideranças comunitárias por meio do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) . A ideia inicial era formar os jovens da região, na perspectiva da qualificação técnica e autonomia com uma visão empreendedora, gerando renda e emprego na comunidade. Hoje, a instituição oferece o Curso Profissionalizante de Técnico em Agroecologia e o Curso Técnico Agrícola, em parceria com a Prefeitura Municipal e a Secretaria de Estado de Educação, atendendo 50 jovens.

A metodologia utilizada é a Pedagogia da Alternância, que possibilita o aprendizado na escola e no âmbito familiar, de forma a levar o conhecimento para fora do ambiente institucional. A comunidade tem acesso aos benefícios e é acompanhada pelos profissionais da Casa Familiar Rural, por meio da assistência técnica e extensão rural, dando suporte à produção local. O jovem constrói um Projeto Profissional de Vida (PPVJ) que, além de organizar a propriedade, torna-se um instrumento de avaliação durante o curso.

O município de São Mateus do Sul é caracterizado pela formação de floresta de araucária. Faz parte so chamada “Paraná Tradicional”, cuja história de ocupação remonta à exploração do ouro, ao tropeirismo, à produção de erva-mate e ao cultivo do pinheiro como parte do processo cultural e econômico da região. Mais recentemente, devido à concentração de terra e à exploração das florestas nativas pela monocultura, o município foi marcado pelo êxodo rural. Todo esse contexto histórico fez com que a comunidade se organizasse e criasse essa Casa, que entre outras coisas, busca promover a agroecologia para possibilitar a permanência da juventude no campo.