De 1985 para 2020, a área atingida pela atividade garimpeira passou de 7,45 quilômetros quadrados (km²) para 102,16 km²

Bruno Kelly/ Amazônia Real

 

Uma história contada há décadas: o garimpo, atividade ilegal em áreas protegidas, é feito de maneira artesanal por garimpeiros que, iludidos com a promessa de ouro, vão por conta própria atrás da sorte nos rios e florestas, principalmente na Amazônia. Contudo, segundo  a pesquisa “Abrindo o livro caixa do garimpo”, divulgada pelo Instituto Escolhas, que mostra o volume de investimentos e lucros que envolve o garimpo atualmente no Brasil, percebe-se que na verdade essa é uma atividade altamente lucrativa, que envolve maquinário pesado e grandes operações para acontecer.

Para se ter uma ideia, a mineração ilegal em terras indígenas da Amazônia Legal aumentou 1.217% nos últimos 35 anos. De 1985 para 2020, a área atingida pela atividade garimpeira passou de 7,45 quilômetros quadrados (km²) para 102,16 km². Esse aumento se deve também pela intensificação do uso de retroescavadeiras, que garimpam em uma semana áreas que antes demoravam um mês para serem garimpadas.

A pesquisa ainda mostra que R$ 1,37 milhão por mês é o valor de investimento em máquinas, equipamentos e infraestrutura para a abertura de um novo garimpo de ouro em terra. Já quando se fala no garimpo em rios, para comprar uma balsa estima-se um investimento médio de R$ 3,3 milhões.

Contudo, tanto gasto não é à toa: os lucros com o garimpo nos rios da Amazônia passam de R$ 1 milhão mensal, segundo a pesquisa, enquanto o garimpo terrestre gera lucros em média de R$ 930 mil todo mês.

 

Gráfico presente na pesquisa “Abrindo o livro caixa do garimpo

 

O ouro custa caro para os indígenas

De acordo com um estudo elaborado por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e da Universidade do Sul do Alabama, dos Estados Unidos, quase todo o garimpo ilegal (95%) fica em apenas três terras indígenas: a Kayapó, a Munduruku e a Yanomami. Os resultados do trabalho foram publicados na revista Remote Sensing.

Em 2021 o licenciamento ambiental dos garimpos, que deveria ser rígido, acabou sendo ainda mais facilitado no Pará, onde se encontra a maior parte das operações garimpeiras. Uma decisão estadual passou a condução do processo de licenciamento para as prefeituras, que têm pouca estrutura para análises complexas – sem contar o fato de que os impactos das operações, não raro, transcendem os próprios municípios, o que demandaria um licenciamento centralizado.

Tal expansão veio acompanhada de graves impactos ambientais (como a degradação de áreas de floresta e rios, que não se recuperam naturalmente), de danos sobre a saúde humana (por conta da utilização de substâncias tóxicas, como o mercúrio) e de violações de direitos humanos (com a invasão de áreas protegidas e a violência contra os povos indígenas).

No que diz respeito aos fatores políticos que influenciaram a expansão do garimpo em terras indígenas na Amazônia nos últimos anos, é preciso destacar de partida que, embora não se restrinja ao contexto do governo de Jair Bolsonaro (PL), o problema tomou uma dimensão inédita a partir de 2019, em comparação a todo o período após a Constituição de 1988. Não é novidade o amplo e irrestrito apoio de Bolsonaro à expansão do garimpo em terras indígenas — que se materializou não apenas no seu discurso, mas também em proposições como o PL 191/2020, entre outras.

Além das práticas propriamente criminosas, há outras práticas conexas promotoras de violência no interior das terras indígenas, que funcionam também como mecanismos para a expansão da atividade garimpeira nessas áreas. Entre elas destaca-se a cooptação de indígenas por empresários do ramo para facilitar a entrada e a permanência nos territórios — conforme veio a público, de maneira mais intensa, a partir da expansão dos garimpos na Amazônia nos últimos três anos e em meio a diferentes operações da Polícia Federal (PF).