Por Patrick Simão / Além da Arena

Nas Olimpíadas de Tóquio, em 2021, a ginasta Simone Biles se retirou da final individual geral. A estadunidense era a principal favorita naquela edição, após os 4 ouros nas Olimpíadas do Rio em 2016 e os 5 Ouros no Mundial de Stuttgart em 2019. Ao falar sobre os motivos de sua desistência, ela destacou a saúde mental e o grande peso que há sobre ela.

Naquele mesmo ano, a tenista Naomi Osaka, então número 1 do mundo, desistiu de Roland Garros e Wimbledon afirmando que precisava cuidar de sua saúde mental. Na temporada seguinte, a também tenista Ashleigh Barty, então número 1 do mundo e em grande fase, anunciou sua aposentadoria aos 25 anos, afirmando não ter mais disposição física e mental para seguir a carreira.

No futebol, Adriano era chamado de “Imperador” e era um dos melhores jogadores do mundo. Em seu auge, após o falecimento do seu pai, teve depressão e resolveu voltar para o Brasil, afirmando que queria um lugar que se sentisse bem. Em 2021, ao The Players Tribune, ele disse que muitos não entenderam a escolha dele em retornar ao Brasil para uma vida mais próxima do “normal”. Os exemplos de atletas e ex-atletas de alto rendimento abordando a saúde mental são muitos, mas em muitos momentos eles não tinham voz ou eram ouvidos a esse respeito. A saúde mental é um tabu muito grande, que começa a ser rompido em casos como esse.

Adriano em 2005, na Copa América (Foto: Reprodução)

Os atletas aqui citados têm um fator em comum: chegaram ao topo muito cedo, com enorme expectativa para a manutenção desse padrão. No caso de Biles, que tinha 24 anos, se espera a perfeição em suas performances, sem margem para erros. Para Osaka e Barty, então com 23 e 25 anos respectivamente, a expectativa era de sempre ganharem Grand Slams, sem oscilações. Para Adriano, havia a expectativa de todo um país para ser o melhor do mundo e não se esperava a demonstração de fraquezas (algo que se relaciona também com a expectativa de masculinidade).

Essas expectativas provém de uma imagem de super herói sociologicamente atribuída aos grandes atletas, o que os desumaniza. Ao se tornar um atleta de alto nível, você recebe uma expectativa de performance e comportamento que convergem com a ideia de super-herói, e a manutenção dessa imagem os isenta de demonstrar fraquezas. Podemos observar essa construção em algumas alcunhas: “fenômeno”, “imperador”, “ET”, “robô”, entre outros. O intuito é sim positivo, com exaltação e construção positiva de imagem, mas também é um peso que desumaniza os atletas, colocando-os como “máquinas invencíveis.”

Por isso os posicionamentos dos atletas sobre saúde mental são tão importantes: eles seguem sendo vistos como atletas espetaculares, mas permitem uma humanização sobre si mesmos. Estes posicionamentos podem iniciar um novo processo novo de construção de herói no esporte, modificando a identidade dos novos ídolos. Há entrevistas e cada vez mais filmes que abordam atletas e ex-atletas de forma mais humanizada, por mais que a expectativa sobre os atletas inevitavelmente se atrelem ao super-heroísmo.

No entanto, o caminho é muito longo e constantemente vemos casos de depressão, suicídios e/ou diagnósticos de transtornos psiquiátricos vindos de atletas. Além disso, há uma banalização dos psicólogos no esporte, dentro e fora de campo, especialmente no futebol. Dez dos 20 clubes da Série A não têm psicólogos esportivos atualmente, enquanto a Seleção Brasileira também não teve um profissional na área em sua delegação nas duas últimas Copas do Mundo.