Maior comerciante de grãos do mundo é acusado de ‘diligência de má qualidade’ sobre desmatamento e supostas violações de direitos

A Cargill diz que implementou uma sofisticada operação de monitoramento em portos, armazéns e outros pontos de sua cadeia de suprimentos. Fotografia: Léo Corrêa/AP

Por Jonathan Watts, publicado originalmente no The Guardian

A maior comerciante de grãos do mundo, a Cargill, está enfrentando o primeiro desafio legal nos Estados Unidos por não ter removido o desmatamento e os abusos dos direitos humanos de sua cadeia de fornecimento de soja no Brasil.

A ClientEarth, uma organização de direito ambiental, apresentou a queixa formal na última quinta-feira (27 de abril), acusando a Cargill de monitoramento inadequado e dar uma resposta lenta ao declínio da floresta amazônica e de outros biomas globalmente importantes, como o Cerrado e a Mata Atlântica.

No caso, que foi submetido sob as diretrizes da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a ClientEarth argumenta que a “diligência prévia de má qualidade da Cargill aumenta o risco de que a carne vendida em supermercados de todo o mundo seja produzida com a chamada soja ‘suja’”. A organização disse ainda que isso viola o código internacional de conduta empresarial responsável.

Os advogados dizem esperar que o desafio legal eleve os padrões da Cargill – que é a maior empresa privada dos Estados Unidos, com receita de US$ 165 bilhões no ano passado – e dê o exemplo em todo o setor.

Laura Dowley, advogada da ClientEarth, disse: “A Cargill tem vastos recursos à sua disposição para implementar a devida diligência. A tecnologia já está aí. Não estamos pedindo para fazer nada que não tenha recursos para fazer. Esperamos que mostre liderança.”

A Cargill prometeu estar “livre de desmatamento” na Amazônia e no Cerrado até 2025 e erradicar completamente o desmatamento de todas as suas cadeias produtivas até 2030. Porém, a ClientEarth disse que identificou várias deficiências neste sistema, incluindo a falta de diligencia ambiental. A ClientEarth também cita relatórios alegando que os fornecedores da Cargill estiveram envolvidos em violações de direitos de comunidades indígenas, afro-brasileiras e outras comunidades dependentes da floresta.

Ao The Guardian, a Cargill disse que não tinha visto a reclamação completa, mas tinha um “compromisso inabalável” de eliminar o desmatamento e a conversão na América do Sul. Em consonância com isso, acrescentou: “Não compramos soja de agricultores que desmatam terras em áreas protegidas e adotamos controles para impedir que produtos não conformes entrem em nossas cadeias de abastecimento. Se encontrarmos qualquer violação de nossas políticas, tomaremos medidas imediatas de acordo com nosso processo de reclamação.”

O site da empresa observa: “A Cargill está empenhada em transformar nossas cadeias de abastecimento agrícola para que sejam livres de desmatamento até 2030. Nossa política sobre florestas estabelece nossa abordagem abrangente para atingir essa meta globalmente em nossas cadeias de abastecimento prioritárias. Baseia-se na nossa crença de que a agricultura e as florestas podem e devem coexistir.” Um porta-voz acrescentou que a Cargill também está “fortemente comprometida” em proteger os direitos humanos em suas operações, cadeias de suprimentos e comunidades.

No entanto, jornalistas revelaram no ano passado que um dos fornecedores de soja da Cargill cultiva em terras desmatadas e queimadas no bioma brasileiro. Em 2020, o Guardian e parceiros descobriram evidências de que a Cargill forneceu à Tesco, Asda, McDonald’s, Nando’s e outros, frangos alimentados com soja importada ligada a milhares de incêndios florestais, além de pelo menos 300 milhas quadradas (80d0 quilômetros quadrados) de desmatamento no Cerrado e savana. Relatórios semelhantes foram transmitidos este ano pela Sky News.