Famílias do Curió clamam por justiça, verdade, memória  e punição de militares assassinos

Foto: Isanelle Nascimento

Os 34 policiais militares acusados de cometer a Chacina do Curió irão sentar no banco dos réus na terça-feira (20) em um julgamento histórico da luta por justiça pela vida de 11 pessoas, na maioria adolescentes, que foram assassinadas em 2015 na Grande Messejana, periferia de Fortaleza. Os policiais escolheram as vítimas de maneira aleatória após a morte de um policial.

Ao longo dos últimos sete anos e meio, mães e familiares das vítimas têm lutado por justiça, unindo-se a movimentos de mulheres em todo o país. Agora, elas terão a oportunidade de confrontar os responsáveis pela morte de seus filhos, maridos e irmãos. Esse julgamento será o mais significativo do ano no Brasil e envolve o maior número de militares no banco dos réus desde o massacre de Eldorado dos Carajás, ocorrido em 1996, no Pará.

O movimento Mães e Familiares do Curió (@movmaesdocurio) exige justiça e reparação em nome das vítimas, que incluem adolescentes, jovens e adultos escolhidos aleatoriamente e executados entre 0h20min e 3h57min do dia 12 de novembro de 2015.

As vítimas foram: Álef Sousa Cavalcante, 17 anos; Antônio Alisson Inácio Cardoso, 17 anos; Francisco Enildo Pereira Chagas, 41 anos; Jandson Alexandre de Sousa, 19 anos; Jardel Lima dos Santos, 17 anos; Marcelo da Silva Mendes, 17 anos; Marcelo da Silva Pereira, 17 anos; Patrício João Pinho Leite, 17 anos; Pedro Alcântara Barroso, 18 anos; Renayson Girão da Silva, 17 anos; e Valmir Ferreira da Conceição, 37 anos.

Foto: Divulgação CEDECA

As investigações revelaram que, na madrugada dos crimes, os policiais militares agiram em retaliação à morte de outro policial, ocorrida pouco antes da chacina. Nenhuma das vítimas tinha qualquer relação com o assassinato do policial. Os atos de brutalidade policial, incluindo execuções, ameaças e intimidações, foram praticados indiscriminadamente contra pessoas aleatórias, resultando em mortes e sobreviventes.

Além disso, os registros judiciais indicam que houve omissão por parte dos policiais em fornecer socorro imediato às vítimas. Tanto os sobreviventes quanto os familiares das vítimas enfrentam sequelas físicas e problemas de saúde mental, além do agravamento das vulnerabilidades socioeconômicas.

Portanto, as Mães do Curió clamam por justiça, verdade e memória em relação aos seus entes queridos.

Uma das vítimas, Álef, 17, fazendo manobras de skate | Foto: Maria Teresa Cruz/Ponte Jornalismo

Somente em maio de 2023, as Mães do Curió foram recebidas pelo governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT), após anos de mandato de Camilo Santana (PT) e Izolda Cela (PDT). O encontro foi intermediado por instituições da sociedade civil, incluindo a Anistia Internacional.

No Ceará, por exemplo, entre 2013 e 2022, 1.229 pessoas foram mortas em intervenções policiais, de acordo com dados do governo estadual.

A Semana Cada Vida Importa, estabelecida pela Lei 16.482/17, tem como objetivo sensibilizar a população sobre as altas taxas de homicídios no estado do Ceará e desenvolver políticas públicas para enfrentar essa situação, além de lembrar a Chacina do Curió. Existe um Comitê vinculado à Assembleia Legislativa do Estado do Ceará que monitora os homicídios no estado. Mais informações podem ser encontradas em https://cadavidaimporta.com.br.

Em novembro de 2021, o coletivo Mães e Familiares do Curió lançou o livro físico intitulado “Onze”, com uma versão em áudio disponível no Spotify, no qual as próprias mães contam a história de vida das 11 vítimas da Chacina do Curió. O livro é uma produção bem elaborada, com design e acabamento de qualidade, e tem como objetivo preservar a memória das vítimas e evitar que o caso seja esquecido ou distorcido por narrativas racistas e preconceituosas, dado que as vítimas residiam na periferia da cidade.