Em menos de 15 dias e no meio da crise de saúde provocada pela pandemia da Covid-19, o presidente Bolsonaro demitiu seu ministro de Saúde, fez parte de manifestações que violam o isolamento social e apoiam uma intervenção militar para instaurar uma ditadura, demitiu seu ministro de Justiça e quem mais lhe somava apoio popular, se alia com o “Centrão”, o pior e o mais corrupto do espectro político dentro do parlamento, se mostra favorável ao afastamento da recentemente nomeada secretária de cultura e debocha abertamente quando perguntado sobre o recorde de mortes que fez o Brasil ultrapassar a China em número de óbitos por causa do Coronavírus.

É simplesmente inconcebível que exista uma pior forma de ter exercido o cargo de presidente nas últimas duas semanas.  O jornalismo do mundo, por unanimidade, o considera o pior governante a tomar decisões ao respeito da pandemia.

Um dos líderes da oposição ao governo no parlamento, deputado federal Marcelo Freixo, responde sobre todas essa questões em entrevista exclusiva: 

O que resta do Bolsonarismo sem Sérgio Moro?

Olha, isso está muito recente. O Sérgio Moro saiu do governo agora e ainda será muito difícil avaliarmos o impacto que a sua saída terá dentro do governo do Bolsonaro. Sem dúvida alguma, ele já foi seu principal ministro e com uma popularidade muito maior que a do próprio Bolsonaro. O Brasil vive um momento muito complicado.

Hoje (nesta terça-feira, 28) o ministério da Saúde publicou números oficiais. 474 pessoas morreram por causa de Covid-19, um recorde desde que iniciou a pandemia aqui no país. Vamos ver ainda números muito impressionantes. E sem dúvidas o Bolsonaro está contando com essa crise para que o efeito da saída do Sérgio Moro seja menor, porque o assunto sobre Sérgio Moro não vai ficar tanto tempo nas mídias e na fala das pessoas, quanto ficaria se não fosse a pandemia. Ou seja, nós vamos voltar a falar sobre os brasileiros mortos, da crise nos hospitais, da crise da saúde. E Bolsonaro conta um pouco, com essa crise para que a sua crise política seja menor.

Então, vamos precisar de algum tempo para avaliar o impacto da saída de Sergio Moro do governo. Temos que ver o que ele vai fazer, se ele vai ampliar suas denúncias ao governo do Bolsonaro. O agir dele, de alguma forma vai definir o nível do desgaste do governo do Bolsonaro. O presidente, segundo algumas pesquisas, ainda conta com mais de 30% de um amplo apoio dos brasileiros, o que é muito impressionante, diante de tantos erros e tantos absurdos sendo feitos pelo presidente.

Hoje tu entrou com uma ação na justiça para anular a nomeação de Alexandre Ramagem como Diretor-Geral da Polícia Federal. Como está essa situação? 

Eu precisava esperar a nomeação do Ramagem para acionar uma anulação do ato. Então ele foi nomeado hoje e eu entrei com uma ação popular imediatamente. Agora temos que esperar a Justiça se manifestar. Porque no meu entendimento e no entendimento de outros parlamentares que assinaram comigo, não há a menor condição do Ramagem ser o novo chefe da Polícia Federal porque fere o princípio da impessoalidade. Ele tem relações próximas, íntimas, com os filhos do presidente, que são pessoas investigadas. Então, não cabe a um chefe da Polícia Federal ferir o princípio de impessoalidade na hora de ocupar um cargo público. Está na nossa Constituição Federal. Então, por isso eu entrei na Justiça.

Os filhos do presidente são pessoas investigadas por relações com milícias, pela organização de atos criminosos, como aqueles que pedem por um AI-5, pela propagação de Fake News. Existem muitas investigações envolvendo pessoas próximas ao presidente que estão sendo investigadas. Então, o que o presidente quer é controlar a Polícia Federal, ter acesso aos inquéritos e interferir politicamente. Ele quer fazer com que a Polícia Federal seja uma polícia do presidente e não uma polícia do Brasil, o que é muito grave e se torna mais um passo no caminho do fascismo. O presidente está criando uma polícia para perseguir adversários políticos.

Você assinou o pedido de impeachment feito recentemente pelo PSOL?

Não assinei o pedido de impeachment porque acredito que o pedido tem que ser feito por toda a frente de esquerda. Ele tem que ser um pedido unificado entre toda a esquerda, coisa que não aconteceu ainda. Eu luto pela unidade, precisamos da esquerda unida para enfrentar o fascismo. Eu acho que a esquerda não tem que ficar competindo entre ela, acho que todos temos que ter maturidade e capacidade de união, ainda nesse processo de pedido de impeachment.

E o triste fato é que hoje não temos votos suficientes para levar em frente um impeachment. O Bolsonaro hoje tem mais de 200 deputados. A esquerda inteira, somada, tem 134. Então, considero que hoje é mais importante assinarmos todos juntos um impeachment, e não fazê-lo rápido. Eu estou tentando unificar o campo da esquerda e, sim, seria favorável a um impeachment com a condição de uma unidade política de todo o campo da esquerda. O PSL se dividiu, e uma parte majoritária ainda apoia o Bolsonaro. O PT e o PSDB estão conversando sobre o impeachment e ainda não se decidiram sobre isso. Mas infelizmente, reitero, o Bolsonaro tem mais de 200 deputados hoje. Se for aceito um pedido de impeachment hoje, a gente corre o risco de perder a votação e o Bolsonaro se fortalecer. E isso é algo que a gente não pode permitir.

Como vê essa aproximação do Bolsonaro com o Centrão?

É muito grave. Por isso ele tem mais de 200 deputados. Ele está exercendo a velha política. O Bolsonaro hoje faz com que deputados do Nordeste recebam cargos para assim ganhar seu apoio. E aí tem duas razões. Uma delas é tentar derrotar a esquerda no Nordeste e a outra é tentar criar uma base sólida do governo no Congresso Nacional para que ele consiga governar. Tanto uma coisa quanto a outra são muito ruins. Por isso eu insisto em um chamado para a unidade da esquerda nesse momento. Porque o Bolsonaro já conseguiu reunir junto com ele um número muito grande de deputados.

Bolsonaro negocia com o centrão uma indicação para presidente do ambicionado Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), órgão do Ministério da Educação cujo orçamento é de cerca de R$60 bilhões por ano. Como pensas que isso pode afetar nas políticas públicas de educação no país?

O governo Bolsonaro representa já em si uma tragédia para a educação, começando pelo seu ministro Weintraub, que é talvez o mais fanático de todos os ministros. Weintraub utiliza o ministério de forma clara como uma ferramenta de perseguição ideológica e política, além de ser uma pessoa muito incompetente. Nesse momento ele não adia a prova do ENEM, continua levando em frente, e faz crescer ainda toda a estrutura de perseguição aos professores que ele montou. Não há políticas claras para o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica). Então, entregar o lugar onde se desenvolve a política nacional de educação nas mãos do centrão, em troca de apoio no congresso, em troca de poder, é mais um retrocesso muito profundo. Na área da educação eu acho que vamos ter talvez o maior prejuízo da época Bolsonarista por causa dessa iniciativa.

Hoje se soube que Bolsonaro seria favorável ao afastamento da Regina Duarte como secretária de cultura, somando mais uma situação de instabilidade no meio da pandemia. Existe um ponto de comparação na história do Brasil de um presidente tão irresponsável para exercer seu cargo em frente a uma crise?

Acredito que não, acho muito difícil a gente encontrar algo parecido na nossa história. O Brasil viveu 21 anos de uma ditadura civil militar muito violenta. Mas era um período ditatorial. A gente agora está num período democrático, as eleições estão garantidas, as instituições estão abertas e funcionando. Nós não podemos dizer que vivemos um período ditatorial mas podemos dizer que temos um presidente com vocação de ditador, mesmo tendo sido eleito em eleições democráticas.

Temos um presidente que defende a tortura, um presidente que apoia manifestações que pedem pelo fechamento do congresso, do STF, por um AI-5, que foi o período de maior violência de toda a ditadura. Então nós convivemos com uma contradição, que é ter um presidente ditador, eleito. Que governa na base da força, com um alto nível de violência verbal e tenta ser um ditador. Não houve na história do Brasil nada semelhante a isso. Nós já tivemos a ditadura e já tivemos a democracia com todas suas variáveis. Mas um presidente ditador na democracia é uma novidade para nossa história, e a gente vai ter que aprender a lidar com isso para derrotar Bolsonaro, e eu espero que isso seja quanto antes.

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