Sobre a Juliana Paes e o que fazer em tempos de fascismo.

Em 1937, como parte da ajuda de Hitler ao conservador Francisco Franco para derrotar o Governo Republicano durante a Guerra Civil Espanhola, a temível equipe de aviação alemã chamada “Lutwaffe” bombardeou várias cidades espanholas.

Andres Delgado escreveu em 2017 para a revista “Ultimo Round” que em uma cidade do País Vasco, houve uma bomba que atingiu a terra, mas nunca explodiu. A bomba foi embutida no meio da praça central da pequena cidade. Os moradores surpresos e assustados não ousaram movê-la, muito menos desarmá-la. Lá permaneceu por anos durante o governo de Franco como um símbolo de morte, do poder do regime e do castigo de quem se revelou.

Um dia de primavera, pela manhã, Julen se cansou dos detalhes da paisagem que arruinava a praça, procurou por ferramentas e decidiu desmontar e remover o dispositivo. Nas primeiras horas trabalhou sozinho, ao meio dia já contava com a ajuda dos amigos. (Porque se há algo pelo que morrer, que seja com os amigos). No meio da tarde, todas as pessoas da cidade já estavam na praça, na expectativa e colaborando como podiam.

Ao anoitecer, eles a desarmaram, entraram em uma carroça e decidiram que iam levá-la para a cidade vizinha, onde ficava a sede municipal da região. Mas o interessante da história foi o que encontraram dentro da ponta da bomba. Lá, junto com cabos e pedaços de metal, eles encontraram um papel manuscrito que continha apenas algumas palavras. Achavam que poderia indicar o local onde foi feito, seus componentes ou algumas instruções de uso, mas mesmo assim despertou a curiosidade das pessoas.

Claramente não estava em vasco, espanhol ou inglês. Aparentemente era alemão. Na aldeia, só havia uma pessoa que conseguia decifrar a escrita: Mirentxu, que quando criança, por causa do trabalho do pai, havia passado alguns anos em Hamburgo. Mirentxu estava como era natural, na praça. Ela foi solicitada e assumiu o papel.  Demorou não mais de meio minuto em ordenar as palavras e a gramática na sua jovem mente. Finalmente, para cortar o suspense, disse olhando para todos os seus vizinhos (que ao mesmo tempo a olhavam em silêncio): “No papel está escrito o seguinte: Saudações de um operário alemão que não mata inocentes”.

Ninguém saiu da praça nas horas seguintes. Eles discutiram, conjeturaram e interpretaram o manuscrito de mil maneiras.

Por fim, antes da meia noite, o povo decidiu por unanimidade que a bomba não iria embora, até mesmo voltaria ao seu lugar.  A partir daquele momento, a bomba na praça passou a simbolizar a resistência, o fim do medo e o poder de um povo com consciência de classe. Tudo isso como um presente de um trabalhador alemão que, em meio à ditadura nazista, arriscou a pele e deixou claro que nem o medo nem o regime seriam capazes de torná-lo um monstro a mais.

Histórias como essa da pequena cidade dentro do país vasco nos ensinam algo bem simples: sob regimes de violência e morte não existe neutralidade, se você faz parte de um regime de morte, você o sabota desde dentro. Não se trata de bandeiras políticas, se trata de empatia com os outros, de leituras sobre o lugar dos outros. Lembre bem disso: se você faz parte de um regime de morte, sabote-o desde dentro, que a história irá lhe retribuir com o melhor prêmio reservado a um ser humano: a imortalidade junto aos que lutaram do lado certo da história.

Conheça outros colunistas e suas opiniões!

FODA

Qual a relação entre a expressão de gênero e a violência no Carnaval?

Márcio Santilli

Guerras e polarização política bloqueiam avanços na conferência do clima

Colunista NINJA

Vitória de Milei: é preciso compor uma nova canção

Márcio Santilli

Ponto de não retorno

Márcio Santilli

‘Caminho do meio’ para a demarcação de Terras Indígenas

NINJA

24 de Março na Argentina: Tristeza não tem fim

Renata Souza

Um março de lutas pelo clima e pela vida do povo negro

Marielle Ramires

Ecoturismo de Novo Airão ensina soluções possíveis para a economia da floresta em pé

Articulação Nacional de Agroecologia

Organizações de mulheres estimulam diversificação de cultivos

Dríade Aguiar

Não existe 'Duna B'

Movimento Sem Terra

O Caso Marielle e a contaminação das instituições do RJ

Andréia de Jesus

Feministas e Antirracistas: a voz da mulher negra periférica

André Menezes

Pega a visão: Um papo com Edi Rock, dos Racionais MC’s

FODA

A potência da Cannabis Medicinal no Sertão do Vale do São Francisco

Movimento Sem Terra

É problema de governo, camarada