REUTERS/Shannon Stapleton

Foto: REUTERS/Shannon Stapleton

Foi no dia 8 de março que ela apareceu.

Uma estátua de uma garotinha sem medo, com as mãos postadas sobre cintura, em pose altiva, foi instalada em frente ao grande símbolo de Wall Street: o touro viril e feroz em posição de ataque.

A nova estátua não poderia ser mais simbólica. Pela data de instalação, pelo símbolo da luta das mulheres por igualdade no trabalho, nos salários, no respeito. Ela foi chamada de“Fearless Girl” (Garota sem medo) , e deveria estar ali apenas por um dia. Porém, o alcance e poder da imagem se tornou maior que a criatura em si, e acabou virando uma extensão de um dos ícones do poder dos Estados Unidos.

Foi abraçada pela população, por turistas, e lá ficou.

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“Fearless Girl” ou Garota sem medo, em Wall Street.

Até que um homem adulto começou a se incomodar com a impertinência daquela pequena figura. Arturo Di Modica, escultor do “Charging Bull”, o touro fincado no coração do distrito financeiro de Nova York desde 1989, convocou uma coletiva de imprensa para falar que a estátua da garotinha “violou os seus direitos”.

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Arturo di Modica em frente ao Charging Bull

Interessante.

A estátua foi instalada como uma ação publicitária da State Street, uma empresa gigante do ramo de gestão de investimentos. Enquanto a imagem da estátua viralizava por toda a internet, algumas jornalistas questionavam a veracidade da ação. Lembra que eu falei aqui sobre o Surf na onda da Skol, sobre as causas humanistas? A estátua foi acusada de “marketing feminista”.

Eu sei, essa é hora em que você e muita gente diz: “mas veja bem, isso é um começo, é melhor do que nada!”

Pode ser, mas está longe de ser suficiente. Para começo de conversa, a State Street tem pouquíssimas mulheres em seu conselho e dentre suas equipes de liderança, para ser mais exata, apenas 3 mulheres ocupam esses cargos, 27% no total.
Diminuir essa diferença teria sido mais efetivo do que instalar uma estátua – mas não faria tanto barulho.

Marketing ou não, a garotinha causou um incômodo inesperado na virilidade do senhor Di Modica.

Arturo di Modica nasceu na região da Sicília na Itália em 1941, e se especializou em esculturas que demonstram a força dos animais. Mas é bom ter em mente: fruto de uma geração machista, de um país extremamente machista. Modica já disse por aí que vê o touro como um símbolo de liberdade e amor, mesmo que ele tenha se tornado um símbolo da ganância de Wall Street. Mas não se fez de rogado ao ver sua imagem diminuída, ou melhor, compartilhando a atenção com a estátua feminina instalada pela State Street.

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Arturo explicou sua posição em uma entrevista coletiva realizada no dia 12/04, quarta-feira passada. Foi lá que ele despejou suas mágoas dizendo que a nova escultura “altera o significado da sua arte” Ele disse estar disposto a desafiar as autoridades sobre a decisão da permanência da escultura por um ano, até fevereiro de 2018. Arturo está exigindo que a estátua seja retirada da frente do seu ego ferido, ops, estátua, imediatamente.

No momento em que a garota 1,2 metros foi colocada em frente ao touro implacável, acabou virando uma máquina magnética de atrair turistas. E atenção. E automaticamente desafiando e questionando o poder do touro viril, que por consequência, feriu o seu dono.

Símbolos cristalinos com explicações tão facilmente interpretáveis que não precisamos de nenhum Xeroque Holmes aqui.

Mesmo que a arte seja percebida como elemento supérfluo nesse momento da nossa sociedade, fato é que ela continua sendo um fator de reflexão e transformação.

Até quando marketing, até na forma de uma “inocente” garotinha.

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