Os mil tons de brancos! Precisou um homem branco falar para que o outro brother branco ouvisse, mas a fala, ao invés de explicitar o que é um ato de racismo, puro e simples, tem que amenizar, contextualizar, lembrar que “não vejo maldade no que você fez” e acaba reafirmando a hoje inaceitável expressão que diz “não foi intencional” ou ainda: “é só uma brincadeira” , ou “meu pai tem cabelo black power”, “sou do interior”, etc.

São mil tons do racismo ou do machismo, são mil tons de desculpas cotidianas para não encarar a violência que é assujeitar o outro e desqualificá-lo, seja pelo que for. Quando nós os brancos vamos parar de nos afagar, mesmo no racismo, assim como os homens se protegem no machismo e tantas outras confrarias que se juntam para exercer seu poder?

Mas a fala do apresentador do Big Brother 21, Tiago  Leifert, “de homem branco para homem branco” (sou só eu que tem horror dessas expressões que apelam para a nossa razão de brancos ou de machos, etc?) acaba, até por contraste, mostrando que esse Brasil cordial e conciliador deu errado, e que radicalizar, explicitar, expor, também pode ser pedagógico.

A fala dura e a emoção de João Luiz Pedrosa explicita o racismo que sofreu, a fala e a reação de catarse de Camila de Lucas demonstra que não aguenta mais explicar o racismo cotidiano cometido “alegremente”,  “sem intenção” para brancos que se defendem afirmando sua alienação: “eu não sabia”.  A questão faz transbordar o choro contido e represado, a raiva dos muitos de ter que suportar o racismo no corpo, no cabelo, na pele, na sua existência.

O que tem acontecido no BBB 21 não é “menor” e nem mimimi, nem pouco importante mesmo no meio de uma pandemia com 300 mil mortos e mesmo que seja sim um programa de entretenimento e que lucra com o sofrimento de negros, com tretas, com situações humilhantes, com a audiência que quer “ver sangue”.

O BBB 21 faz parte da tragédia e do aprendizado enquanto país e cultura que atravessamos. Precisamos de formação, educação, ativismo, mudanças nos padrões da cultura do entretenimento para dar um salto como sociedade, pois existem muitas maneiras de matar e elas estão no cotidiano.

Para concluir, e já eliminado do BBB, temos uma fala do brother Rodolffo, o cantor sertanejo, que fez o comentário racista sobre o cabelo de João, se justificando: eu sou chucro, eu sou do interior, essas modernidades (o combate ao racismo!) não chegaram em um Brasil profundo, puro e conservador, sem “maldade”.

A questão é que não existe mais lugar para esse brasileiro “inocente, puro e besta” da letra da música, e se existe, ele foi abduzido por fake news massivas no Whatsapp, ele adotou valores de extrema-direita, ele reafirmou seu poder branco quando achou confortável e quando se viu representado por um Presidente da República que deu voz ao que tínhamos de pior, que deu poder real e simbólico para um Brasil profundamente conservador que já existia, mas que foi chancelado e pôde exercer seu poder de morte em praça pública.

Muitos se identificam com Rodolffo, infelizmente! Temos um Presidente da República “chucro”, que em nome da sua ignorância e “autenticidade”, em nome do seu racismo, misoginia, lgbtfobia “de raiz”, “de família”, defende tortura e mata de forma real e simbólica ao usar sua pretensa “ignorância” como base de políticas públicas e no comando de um país. Esse é o real tamanho do estrago dos Rodosffos e não adianta dizer que “não é intencional”, pois é muito pior : é estrutural e destrói a vida de milhões.

Todos os tons de branco estão envolvidos nesse massacre e é pedagógico que a gente entre nesse debate não apenas “de brancos para brancos” em uma conversa condescendente entre pares, mas de brancos antirracistas que combatem o racismo dos brancos. O racismo não é um problema dos negros, mas nosso.

Conheça outros colunistas e suas opiniões!

Marielle Ramires

De braços dados com a alegria

Bella Gonçalves

Uma deputada LGBT na Assembleia de MG pela primeira vez em 180 anos

Célio Turino

Precisamos retomar os Pontos de Cultura urgentemente

Design Ativista

Mais que mil caracteres

SOM.VC

Uruguai musical

Estudantes NINJA

Não existe planeta B: A importância das universidades nas mudanças climáticas

Colunista NINJA

Carta a Marielle Franco: ‘Quem mandou te matar, Mari? Aí do além é mais fácil enxergar?'

Luana Alves

Justiça por Marielle, mais urgente do que nunca. Sem anistia

Design Ativista

Feminismos, sem medo de ser plural

Márcio Santilli

Opção bélica

André Menezes

Saúde mental ainda é um desafio, afirmam especialistas

Célio Turino

Leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2

Design Ativista

Afinal, qual o papel da moda? Uma reflexão de vivências

Juan Espinoza

Quando o silêncio entre mulheres é quebrado