Mala de dinheiro com o rosto do Temer levada para o Congresso Nacional como forma de protesto.

Faz tempo que isso tudo que estamos vivendo (crise, Lava-jato, impeachment…) deixou de ser uma questão de combate à corrupção. Trata-se da velha luta de classes, da disputa de interesses. Trata-se de saber quem vai pagar a conta do déficit fiscal, de qual tese, qual visão de mundo prevalecerá em um momento de crise, recessão e escassez.

Quando falo em disputa, falo que todos disputam os benefícios do Estado e defendem os seus próprios interesses: o funcionalismo público, que quer aumentos; o judiciário, que quer assegurar vantagens pecuniárias para seus membros que outros profissionais não têm; os parlamentares como eu que, além do salário, contam com gordas verbas; a população mais carente e hipossuficiente, que luta por cada vez mais direitos e mais recursos para os programas de inclusão social; os empresários, que querem cada vez mais subsídios e isenções de tributos para suas atividades produtivas; os investidores do mercado financeiro e as grandes corporações transnacionais, que não querem ter seus rendimentos ou suas remessas de divisas às suas matrizes no exterior taxadas e tributadas…E por aí vai.

Quando há bonança de recursos, mesmo com desigualdade, tudo se acomoda, dá para contemplar os interesses de todos e todos ficam, relativamente, felizes e satisfeitos. Quando há escassez, como agora, dá briga. É a tal disputa. A crise atual é, portanto, muito mais de disputa em face da relativa escassez e menos em virtude do combate à corrupção.

E, nessa disputa, prosperará a tese dos poderosos, da grande mídia, em detrimento da mídia alternativa; do grande capital financeiro especulativo e dos mega empresários em detrimento dos micro e pequenos comerciantes e industriais; dos grandes latifundiários e do agronegócio em detrimento do pequeno produtor rural da agricultura familiar; qual seja: um ajuste fiscal ortodoxo, com reforma trabalhista, reforma previdenciária, redução dos investimentos sociais e controle da inflação, com altas taxas de juros, relativa desvalorização da moeda e, não descartemos, aumento da tributação indireta (que afeta aos mais pobres, ao invés de aumento da tributação direta, que afeta aos mais ricos).

A mesma receita falida que deixou a maior parte da população do país na bosta, durante séculos retorna com força total agora. Sempre mais do mesmo…

O que se passa (a disputa) é, portanto, um episódio da clássica luta de classes. Quando muitos pensavam que estes conceitos sociológicos (direita e esquerda, classes sociais, mais-valia etc) haviam caído em desuso, eles emergem com toda a força.

Ocorre que quando um bilionário, investidor do mercado financeiro, que vive da renda do capital, perde dinheiro, ele continua sendo bilionário, no máximo, se transforma em um milionário. O milionário, que perde dinheiro com o mercado de ações, não deixa de ser milionário, no máximo, passa a ser apenas rico. O rico fica menos rico. E a classe média começa a fazer sacrifícios traduzidos em “restrições” ao consumo.

Mas, quando se retira ou se dificulta o acesso de trabalhadores assalariados aos seus direitos, aí ele perde o pouco que ele tinha e, de pobre, passa a miserável. É isso que se passa com a reforma trabalhista, já aprovada, e com a reforma previdenciária, em vias de aprovação.

Não se trata, contudo, de não querer achar solução para conter o déficit fiscal, que está no cerne da crise econômica. Se trata de não deixar que apenas a parte mais frágil da cadeia produtiva, do mercado de trabalho e, porque não dizer, da sociedade como um todo, arque com esse ônus.

Aliás, diga-se, os únicos governos que conseguiram, com suas políticas públicas, jogar o jogo do “ganha-ganha”, quando todas as classes sociais se viram em curva de ascensão, com o rico ficando mais rico e o pobre ficando menos pobre, foram os governos Lula e Dilma.

E talvez essa seja a grande diferença, ainda existente, entre direita e esquerda, entre conservadores e progressivas, entre monetaristas e desenvolvimentistas, entre liberais e socialistas: para os primeiros, conquanto as riquezas estejam sendo geradas e os tributos estejam ingressando nos cofres do Estado, não importa o quão injusta seja a distribuição disso. Para os segundos, podemos até suportar um crescimento econômico menor, conquanto o pouco que cresça seja melhor distribuído entre todos.

E, se todos ganham dinheiro em tempos de crescimento econômico, que todos arquem com o ônus de forma proporcional, na medida de suas capacidades, nos momentos de crise.

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