No Brasil, a busca pela superação do paradigma do racismo e pela conquista da cidadania efetiva da população negra será o resultado da dinâmica de organização e ampliação das articulações do movimento negro somadas a uma perspectiva mais ampla das lutas sociais e a efetividade de incidência junto aos tomadores de decisões, em suas diversas instâncias de poder, sendo o Sistema de Justiça uma delas.

Em um país de maioria negra (56%) é contrastante a maioria branca da magistratura brasileira. O levantamento produzido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2023, mostrou que apenas 15% de todos os magistrados brasileiros se autodeclaram negros. O menor percentual de magistrados negros foi registrado na esfera militar (3%), nas cortes superiores (11%) e na Justiça Federal (14%). A maior presença de magistrados negros registrados pela pesquisa está na Justiça do Trabalho (16%) e neste tribunal que está o menor percentual de juízes negros, o TRT-4, com 2%.

Os dados apresentados no levantamento nos permitem também apontar que o Poder Judiciário brasileiro está longe de representar a diversidade racial da população brasileira, que se socorre da tutela jurisdicional para preservar sua liberdade, seus bens e resolver seus conflitos de interesses.

É no mínimo constrangedor que a grande maioria dos brasileiros não possa se referenciar em juízes que se pareçam conosco ou que, minimamente, possam dividir experiências de vida pela qual nós também passamos em nossos cotidianos.

Para ampliar a representatividade negra no Sistema de Justiça como um todo é fundamental que sejam criados instrumentos que viabilizem ações concretas para identificação, prevenção e superação da discriminação institucional no âmbito de todos os Tribunais da Federação, desde a instituição da política de cotas nos concursos públicos, assim como a garantia de ações afirmativas nas vagas que demandam indicações do chefe do Poder Executivo.

Diante da janela de oportunidade que se abre com a aposentadoria da ministra do STF, Rosa Weber, é preciso pautar não só a urgência do Brasil em ter, pela primeira vez, uma ministra mulher e negra, mas também criar as condições para ampliar a presença negra no âmbito de todos os Tribunais da Federação. Essa mudança pode ampliar inclusive o próprio entendimento da Justiça, afinal as decisões tomadas pelos juízes refletem invariavelmente o lugar social que ocupam e seus interesses.

Mais de nós no Poder Judiciário fará com que as decisões tomadas estejam mais próximas da realidade do povo brasileiro.

Ter uma ministra negra mulher no STF é uma questão, para além da representatividade, de reparação histórica e também significa um fio de esperança para fazer avançar pautas, como o combate ao encarceramento em massa da juventude negra.

Se no passado, diferentes políticas públicas limitaram o acesso de pessoas negras à educação e, consequentemente, aos espaços de poder (os negros foram proibidos de frequentar as escolas públicas nos períodos imperial e republicano, por exemplo), hoje, precisamos fazer, por meio das políticas públicas, com que estes espaços se abram para a diversidade e para a representatividade negras em suas instâncias.

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