Nas diferentes empresas de tecnologia que trabalhei, um sentimento comum sempre veio à tona: dessemelhança – eu era o único negro ali presente. Parece que o mercado impõe barreiras, que torna quase impossível o ingresso e a ascensão de pessoas pretas no setor, mesmo muitas delas sendo qualificadas e estando dispostas a trabalhar nesta área.
E não estou dizendo isso por mera observação do dia a dia – o que, convenhamos, já é um belo recorte da realidade –, mas embasado em pesquisas como: “Quem Coda o Brasil”, realizada pela PretaLab – uma iniciativa que estimula a diversidade no universo da tecnologia, desenvolvida em parceria com a consultoria global de software ThoughtWorks. Esta pesquisa aponta que 32,7% dos times de tecnologia não tem nenhuma pessoa negra. Em 68,5% das análises, os negros representam um percentual máximo de 10% na formação das equipes de trabalho.
A iniciativa coletou dados entre os meses de novembro de 2018 e março de 2019, somando um total de 693 respondentes válidos, em 21 estados brasileiros, incluindo o DF. O que podemos concluir disso? Que o problema não é local ou de um estado específico, mas territorial. Está presente nos quatro cantos do país.
Se os resultados já eram preocupantes, podemos imaginar como a situação se agravou a partir de 2020, com a pandemia de Covid-19 e as demissões em massa pelas empresas de tecnologia. Na tentativa de salvar seus caixas, o mercado de tecnologia – segundo dados do Layoffs.fyi, órgão que acompanha cortes de mão de obra na indústria de tecnologia –, demitiu, desproporcionalmente, mais mulheres e pessoas negras. Outros dados interessantes são as funções e os cargos mais impactados pelos layoffs: vendas, marketing, suporte ao cliente, recursos humanos e recrutamento. Ou seja, pessoas sub-representadas acabaram diminuindo ainda mais sua presença nos quadros de funcionários das famigeradas Bigtechs.
E estamos falando somente dos desafios que pessoas pretas, já qualificadas, encontram ao entrarem no mercado de tecnologia. Sem considerar todas as barreiras sociais e econômicas na formação dos jovens pretos. Afinal, muitos deles não terminam o Ensino Fundamental e são submetidos a subempregos, reforçando o status-quo do racismo estrutural e institucional.
*André Menezes é gerente de programas na Netflix. Com título de Master of Liberal Arts (ALM) in Extension Studies, field of Management (Mestre em Artes Liberais com foco em Administração), em Harvard, uma das Universidades mais prestigiadas do mundo. Desde pequeno sabia que seu esforço abriria portas para seu futuro. Criado no bairro dos Pimentas, zona periférica da cidade de Guarulhos, na grande São Paulo, seus passos ajudaram a tornar o profissional de sucesso que é hoje.
