Negro, gay, comunicador, que usa suas redes para dar mais embasamento ao discurso antirracista e informar aqueles que continuam perdidos dentro dos próprios preconceitos, AD Junior é influenciador digital, apresentador, palestrante, especialista em marketing digital.

Na coluna de hoje, AD fala um pouco sobre responsabilidade social, racismo estrutural e as estratégias que podemos usar para superá-lo.

Leiam com toda a calma do mundo. AD Junior tem muito a nos ensinar.

Foto: Vitor Vieira

Muitas das vezes, ser didático é cansativo. Por que falar sobre as pautas raciais ainda é um importante posicionamento nas redes sociais?

AD Junior – Falar de questões raciais é muito importante. E por que há uma necessidade de ser didático? Porque o nosso país é um país em que as pessoas consomem muitas informações e elas vêm em grande quantidade, grande volumetria, mas a galera não absorve muito daquilo que estão vendo ou ouvindo. Há também o problema do analfabetismo funcional, pessoas que leem e não entendem o que estão lendo, e isso não é um problema só do Brasil, isso é um problema do mundo todo, sempre foi assim, e hoje, com a quantidade de informação que temos, há mais dificuldade de filtrar.

Por isso, falar de uma forma didática, simples e com mais objetivo ajuda a contextualizar as pessoas sobre questões que, às vezes, elas acham que é muito normal de falar. “Ah não, isso é super fácil! Isso não, isso aí eu já sei a resposta!” Não é bem por aí! Então, muita gente para de estudar ou pesquisar algumas coisas e acha que o que está posto é simplesmente por conta do acaso e não é.

Existe toda uma história por trás, que vivenciamos, principalmente, em relação à raça, classe e gênero, e por isso acho que falar de forma clara, simples e objetiva faz com que as pessoas tenham a oportunidade de refletir para poder pensar as ações que, em conjunto, vão mudar a sociedade.

A autoconfiança de Fred Nicácio no BBB23 pareceu incomodar muita gente. A sociedade brasileira não está preparada para ver pessoas pretas bem sucedidas?

AD Junior – Eu acho que o que assustou no Fred em muitas pessoas é o fato dele ser simplesmente uma pessoa, e não ser racializado logo de cara, porque o Brasil racializa pessoas negras o tempo todo. Ele não pôde só simplesmente ter característica enquanto pessoa autoconfiante, enquanto uma pessoa que estudou, que sabia o que estava falando. Essa pessoa só pode ser branca na cabeça de muita gente, ela não pode ser negra.

Quando uma pessoa branca tem as características do Fred, ela não é racializada, mas quando ela é negra, eles colocam a raça na frente. “Está vendo esse neguinho isso. Está vendo esse neguinho aquilo.” O Brasil não se acostumou a simplesmente olhar a humanidade de pessoas negras e simplesmente a racialidade dessas pessoas vem na frente. Apaga-se toda uma identidade e coloca o negro na frente. Esse é o problema de países racistas como o nosso, que vivem em profunda transformação e reflexão sobre o que isso significa, mas que está muito longe da compreensão do que é o racismo estrutural que impede que as pessoas nos vejam simplesmente como seres humanos.

Foto: Vitor Vieira

No Jornal da Cultura você teve uma fala muito importante sobre como o brasileiro não sabe quem de fato foram seus verdadeiros heróis na história do nosso país. Qual a importância de refazer o caminho e entender quem realmente lutou por um país menos desigual?

AD Junior – Sim, no Jornal da Cultura eu tenho a oportunidade, por exemplo, de falar sobre vários assuntos para além de raça, e isso é uma oportunidade ímpar, que eu fico muito feliz de poder participar da bancada de um jornal tão reconhecido e tão importante.

Mas quando trazemos uma fala sobre a Lei 10639, que está falando sobre a importância do ensino da cultura negra e indígena no nosso país, é importante contextualizar pras pessoas, como eu já tinha dito na outra pergunta, que nada que está posto, veio do acaso, tudo tem uma razão, e uma das formas que encontrei nos últimos anos de explicar o racismo estrutural foi essa linha do tempo, contando como foi colocada em cada momento da história empecilhos para que as pessoas negras não pudessem alcançar o lugar de destaque na sociedade e ser visto como um cidadão pleno, numa sociedade racista como a nossa.

Portanto, ainda acredito que uma das formas mais eficazes de trabalhar com a pauta antirracista é falando do brasileiro sobre o Brasil que ele consegue pegar. Contar um pouco de como era o Brasil do bisavô dele, do avô, dos pais, para que nessa linha do tempo ele possa se encaixar e falar: eu participo disso também dentro da história.

Então, contar para ele que ele não é europeu, que a visão “europeizada” que ele tem está completamente equivocada, e eu acho que é muito sobre isso. Para além disso, é preciso valorizar a história do brasileiro que construiu o nosso país. Costumamos valorizar o imigrante que chegou no pós-escravidão, a cultura deles, e não valorizamos a história que vai do sofrimento até o empoderamento de pessoas afro-brasileiras.

Foto: Vitor Vieira

A questão racial, no Brasil, avançou?

AD Junior – Sim, a questão racial avançou no Brasil e muito. Temos visto que principalmente nos últimos vinte anos alavancou muita coisa nas redes sociais que trouxeram uma pauta que estava muito na academia pro dia a dia das pessoas. Uma coisa acabou alavancando a outra; a quantidade de pessoas pretas que entraram nas universidades, desde o sistema de ações afirmativas, a quantidade de discussão social que aconteceu a partir das redes sociais e também a nova geração que hoje está aí com 20 anos e tem outra mentalidade, se coloca de uma forma muito mais veemente sobre raça, classe e gênero.

Tivemos um avanço tremendo nas discussões sobre gênero, sobre sexualidade, sobre diversidade. É muito importante trazer pautas como, por exemplo, a importância da cultura indígena no Brasil, a importância da valorização das pessoas PCDs e da problemática do capacitismo.

A pauta racial também acompanhou outras pautas que avançaram ao mesmo tempo, em um país que está em profunda mudança, um país que é jovem, que tem uma média de idade jovem, ou seja, é um país que está saindo ainda daquele lugar de timidez na discussão, até mesmo de silenciamento em alguns casos para um lugar de apontamentos e para onde ele está apontando?

Ele está apontando que a geração que agora vem, não mais vai se calar, não mais vai ficar quieta em relação a sua importância enquanto indivíduo na sociedade, seja ele gay, lésbica, bissexual, travesti, seja PCD, sejam negros, sejam indígenas. Estamos falando de um avanço na sociedade em tudo o que a pauta racial também faz parte.

Foto: Vitor Vieira

Falando sobre a trajetória de influenciador digital, quais são suas estratégias para manter um relacionamento próximo e autêntico com sua audiência? Como você constrói e mantém a confiança dos seus seguidores?

AD Junior – Bom, sou um influenciador ao acaso, não pensava que as coisas que eu falava lá atrás, quase 20 anos atrás, iam se tornar tão importantes, no sentido de ter uma centralidade na discussão, falar de racismo, falar de experiência como homem gay e negro.

Nunca pensei que isso fosse se tornar algo que as pessoas iam falar que sou um influencer. Tenho quase 800 mil seguidores nas redes sociais, o que é bastante coisa, mas, ao mesmo tempo não virei um influenciador de milhões que está lá falando. O objetivo é mesmo informar; passa pela minha cabeça que tudo tem um tempo determinado, provavelmente daqui a pouco entram outras formas de comunicar com as pessoas, mas eu me comunico muito nas redes através do Instagram que é a rede que mais me acomoda como “influenciador”, porém o que gosto mesmo é de comunicar. Fico muito feliz! Assusta um pouco ser uma pessoa pública, nunca pensei em sê-lo, mas hoje está lá, está posto, estou feliz, não, não posso reclamar. Uma estratégia que uso é sempre tentar ser o mais sincero possível com as pessoas, pedir desculpa quando errar e mandar o negócio para frente. É isso que eu tento fazer sempre.