Os fazedores estão em todos os lugares. Basta ter o que fazer e por que lutar!

Foto: arquivo pessoal

Estou hoje com Fabio Miranda, que é músico, pesquisador permacultor, inventor em energias renováveis e gestor de Projetos em Tecnologias Sustentáveis do Instituto Favela da Paz onde desenvolveu múltiplos sistemas de energias sustentáveis e funcionais através de processos de conscientização ambiental e propagação de estratégias para uma cultura de paz. Criou o projeto Periferia Sustentável que tem como foco a implementação de sistemas de Energias Renováveis e Funcionais em comunidades periféricas da cidade de São Paulo e em todo Brasil, um entusiasta das novas tecnologias e um educador incrível, na minha humilde opinião.

Venho aqui perguntar a ele sobre seu projeto de acesso a ferramentas que temos em regiões que não tínhamos antes, tanto por projetos como pela força de vontade de coletivos e pessoas que acreditam, como você, na educação maker como ferramenta transformadora.

Mestre Fábio, você acha a criatividade uma ferramenta revolucionária e que pode ser atrelada a tecnologias digitais para impulsionar uma revolução social?

Sim, super acredito, pois sempre atrás de uma tecnologia, seja ela nova ou essa junção das tecnologias, existe uma solução pensada por alguém que teve essa virada de chave para trazer algo que seja funcional para vida das pessoas. Então que venha mais e mais ideias sustentáveis e tecnológicas para bem da humanidade.

Se você fosse explicar para um alienígena o que é uma gambiarra e qual é o papel delas na sociedade… o que você acha do termo “Gambiologia”, que curiosamente já é parte da wikipédia?

Gambiarra é uma palavra que me acompanha desde criança e certamente seria fantástico encontrar um alienígena. Primeira coisa que iria falar para ele: bora na quebrada para você ver o que é uma gambiarra de um nível master. Primeira coisa ia mostrar para ele a arquitetura periférica como as casas são construídas. “Olha, sr alienígena, uma antena de cano de PVC, se liga naquele moleque arrumando seu chinelo com prego, quem nunca fez isso”. Então eu digo, todo mundo tem sua formação em Gambiologia e um pouquinho de professor Pardal dentro de si.

Mestre Fabio, ainda vemos em algumas instituições e lugares formais uma divisão muito visível entre arte e tecnologia, você acha que funciona assim? A tecnologia também é arte? E a arte de sermos tecnológicos também é ancestral e humana?

Sim, e claro que está tudo ligado à arte e tecnologia. E digo todo ser humano é tecnológico e criativo, todos nós temos um grande potencial para isso, basta acreditar e estar aberto a prender e superar desafios. Em tempos atuais, a arte está totalmente ligada a tecnologia. Aqui quem vos fala é um baixista apaixonado por música, um músico funcional, cientista permacultor, um maker, por aí vai… Se não fosse a música que me deu oportunidade de ir para mais de 10 países não teria despertado esse ser tecnológico e sustentável que sou hoje então. E sim temos nossa bagagem ancestral, carregamos a genética de sermos criativos.

Para você, o que é Maker e por que isso só virou moda nos anos 90, sendo que já fazíamos muito disso por aqui na América Latina desde 3000 anos atrás (risos)?

Bem, Maker, quando ouvi esse termo foi engraçado, primeiro porque não temos uma tradução certa para português, então eu creio que todos aqueles que são desenrolados e desenvolvem formas tecnológicas e funcionais para trazer soluções de baixo custo e facilitar a vida das pessoas com suas gambiarras tecnológicas são formados na academia da Faztudologia. Mas eu gosto muito do movimento maker pois trouxe essa possibilidade de criação, de visibilidade para essa cultura do “faça você mesmo”.

Foto: arquivo pessoal

Você trabalha com muitas interfaces como arduino, resinagem, costura ideias de reciclagem, horta suspensa… Como você acha que deveríamos compartilhar esses conhecimentos de uma forma democrática? Você acha que os meios de comunicação dão atenção a essas práticas vindas de pessoas e não vindas de instituições? Ou projetos estruturados são mais vistos e compartilhados nas redes?

Bem, Amanda, eu acredito que essa junção de novas tecnologias e energias renováveis, esse conceito de sustentabilidade que eu trago como “Permatechs”  tem crescido muito e muitas instituições têm olhado para isso como grande potencial de expansão, pois você conseguiu unir o que está atual hoje de tecnologias 4.0, trazer esse cuidar do meio ambiente o consumo consciente, trazer formas de unir essas tecnologias como sistema de automação movido a energia solar, hortas verticais tecnológicas Hortechs. E sim as redes sociais têm sido um grande portal para expansão dessas novas ideais tecnologias e sustentáveis.

Como foi levantar um projeto e por que esse projeto é importante no ambiente em que está?

Bem, hoje coordeno o braço de sustentabilidade do Instituto Favela da Paz com o projeto Periferia Sustentável que considero o primeiro laboratório de tecnologias sustentáveis da quebrada. Hoje temos grandes referências de vários labs espalhados em diversos lugares, mas estar dentro de uma favela, onde foi considerada na década de 90 como lugar mais violento do mundo, e hoje ter lab de tecnologias dentro desse lugar já uma grande vitória e poder semear mais ideias e quem sabe mais labs sustentáveis em todas quebradas do nosso brasil.

Mestre Fabio, como a educação maker, tal qual você pratica no instituto, pode ser uma ferramenta modificadora de acessos e vidas?

Bem, eu super acredito no poder da transformação, o virar a chavinha que eu sempre digo. Sempre recebíamos visitas aqui, nesse momento, devido à pandemia, estamos em isolamento, porém continuamos atuando em formato online com cursos, palestras, oficinas no formato de lives. Aqui no instituto as pessoas sempre vão encontrar um lugar confortável naquilo que faz seu coração vibrar, seja pelas novas tecnologias, seja pela energias renováveis, seja pela arte, seja pela alimentação saudável ou quem sabe por tudo, entao eu afirmo podemos ser e estar tudo, basta acreditar que é possível viver de uma forma comunitária e com proposito de servir.

Na sua opinião, o que acha da “glamurização” de ambientes escassos de material, como se sempre tenhamos que nos  virar com o que se tem e isso ser no ponto de vista até do campo progressista algo romântico e não uma questão a ser pontuada, como a falta de acesso que todos têm de MDF, acrílico, filamento, e tenhamos que nos virar com materiais alternativos… o que acha das pessoas que acham isso uma história de “superação”, e não um alerta da desigualdade?

Sim, acho que a desigualdade está presente e atrelada à falta de  recursos e de espaços mais acessíveis para todxs, e uma coisa que tenho vontade de ver e luto por isso é que essa cultura do movimento maker, do faça você mesmo, das energias renováveis, esteja em todasas escolas públicas. Circulo desde 2013 palestrando em escolas públicas em grande universidades e poucas foram os espaços públicas que vi que tinham um espaço de arte e tecnologias, e não por falta de interesse pois sempre acompanho professores se virando nos 30 para fazer projetos com jovens, improvisando matérias sem recurso algum e muitos deles sem nenhum acesso a essas novas tecnologias. E sei que temos espaços hoje que são de difícil acesso para essa turma, pois aqui no periferia sustentável temos o dia do Lab Livre voltado para troca de saberes e espaço aberto para desenvolvimento e criação de projeto de compartilhamento de ideias, trazendo essa potência de rede e apoio.

Foto: arquivo pessoal

Em relação a acesso de materiais e ajuda para o projeto, como se dá isso no instituto Favela da Paz e como você acha que pode melhorar?

Bem, hoje o Instituto Favela da Paz é um instituto privado. Nossos recursos vêm através de uma rede colaborativa de pessoas que compartilham sua energia, seja ela fisica, mental, espiritual onde dinheiro e uma energia de troca onde podemos trazer essa forma de base de confiança. Estamos sempre abertos para novas ideias e pessoas que estejam dispostas a fazer parte dessa cultura de confiança e viver para o mundo que sonhamos.

Por fim, se alguém que está aí nos lendo tiver vontade de conhecer o projeto ou criar outros núcleos em suas comunidades, como você pode dar umas dicas?

Bem, gratidão pela oportunidade, sempre acompanho e sigo trabalhos de vocês nas redes sociais e é de total e grande importância para nossa sociedade para saber mais sobre o Instituto Favela da Paz. Todas as nossas iniciativas estão nas redes sociais, que estão sendo uma forma útil de comunicação nesse cenário de pandemia da covid-19. Logo mais poderemos voltar com nossas atividades presenciais. E para você que ficou aqui até o final e virou sua chavinha e acredita que que podemos sim sermos seres mais tecnológicos, artísticos e sustentáveis, bem você acaba de virar sua chavinha e se conectará com o real valor da vida que é fazer aquilo que você gosta. Então siga avante e venha fazer parte desse revolução das tecnologias sociais de baixo custo.

Você pode seguir Fábio Miranda em @fabio_mirandapss, @institutofaveladapaz, @periferia_sustentaveloficial e acompanhar pelo Facebook: https://www.facebook.com/institutofaveladapaz/

Conheça outros colunistas e suas opiniões!

FODA

Qual a relação entre a expressão de gênero e a violência no Carnaval?

Márcio Santilli

Guerras e polarização política bloqueiam avanços na conferência do clima

Colunista NINJA

Vitória de Milei: é preciso compor uma nova canção

Márcio Santilli

Ponto de não retorno

Márcio Santilli

‘Caminho do meio’ para a demarcação de Terras Indígenas

NINJA

24 de Março na Argentina: Tristeza não tem fim

Renata Souza

Um março de lutas pelo clima e pela vida do povo negro

Marielle Ramires

Ecoturismo de Novo Airão ensina soluções possíveis para a economia da floresta em pé

Articulação Nacional de Agroecologia

Organizações de mulheres estimulam diversificação de cultivos

Dríade Aguiar

Não existe 'Duna B'

Movimento Sem Terra

O Caso Marielle e a contaminação das instituições do RJ

Andréia de Jesus

Feministas e Antirracistas: a voz da mulher negra periférica

André Menezes

Pega a visão: Um papo com Edi Rock, dos Racionais MC’s

FODA

A potência da Cannabis Medicinal no Sertão do Vale do São Francisco

Movimento Sem Terra

É problema de governo, camarada