Esse título pode ser confuso para muita gente, mas como diz Ruben Pater no Livro “Políticas do Design” (um livro necessário para qualquer designer, recomendo muito)

“Não dá para separar o design da vida pessoal, da mesma maneira como não dá para separar o design da política”

Sinceramente? Ser designer ativista não é apenas não usar imagens e conteúdos racistas, machistas, transfóbicos, etc. Isso é o dever de qualquer designer, decolonizar a arte do design, descentralizar o monopólio de conteúdos em inglês também. Porque isso é o reflexo da responsabilidade como indivíduo que somos em transformar a sociedade e política onde estamos inseridos.

E principalmente, não estou falando sobre político-partidário.

O que quero falar nesse texto é sobre como nós designers podemos sim, trabalhar em movimentos sociais e movimentos dos quais acreditamos que são importantes para ampliar as pautas de discussão.

Em 2019 eu mudei para São Paulo e senti falta de trabalhar com o ativismo que eu já atuava em Curitiba de forma autônoma. Principalmente pelo fato de atuar na área de User Experience (eu falo um pouco mais sobre isso nesse texto) e sentir essa necessidade de aplicar meus conhecimentos desta área em projetos sociais. Foi assim que eu conheci o Design Ativista, um movimento totalmente voluntário e sem fins lucrativos, que luta em frentes amplas como a criação visual, design de guerrilha com pautas atuais, como escândalos na política, meio ambiente, feminismo, até produtos digitais para conectar outros ativistas de movimentos que não tem o design como ferramenta de trabalho.

As convocatórias são formas de chamar designers de várias frentes (gráfico, motion, ilustradores, product etc) para trabalhar em projetos que o movimento está puxando durante um fim de semana (ou mais), foi por causa de uma dessas convocatórias que entrei no movimento e sigo participando até hoje.

Arquivo Design Ativista

Designers dispostos a passar o final de semana inteiro, colocando toda a sua experiência profissional, em prol das causas que acreditam, seja construindo um evento ou um produto digital, é possível usar o que você sabe para construir algo que possa impactar a vida de alguém e mover o mundo na direção que queremos. Inclusive usamos o termo “hackear o sistema” porque todas metodologias que conhecemos acabam sendo aplicadas nos projetos do Design Ativista. Costumo falar que o ecossistema do Design Ativista é o mesmo que conhecemos no mercado, a diferença é que não há concorrência, é uma forma de trabalhar mais sustentável e coletiva. Usamos ferramentas de código aberto e não existe uma pessoa dona do projeto, é tudo coletivo, sem exceção.

Mas Fernanda, como que eu participo? Pois bem, o Design Ativista é orgânico, quer participar? Só vem, dedica seu tempo livre para isso, acompanha as nossas redes e vem somar com a gente, porque tem muita coisa pra fazer sempre, ele é contínuo e dinâmico. Quando um projeto é iniciado, existe um formulário onde você pode se inscrever, colocar as suas habilidades e o tempo disponível que você tem para trabalhar. Existem pessoas que trabalham 2 horas por dia ou até um final de semana inteiro. Nós não somos detentores do tempo de ninguém e sabemos que a coletividade é o caminho para construir um projeto consistente e respeitoso do momento de cada um.

E para deixar claro, nenhuma empresa tem algum tipo de relação com o Design Ativista, somos um movimento independente e continuaremos assim.

Anualmente nós temos uma maratona para a construção do Encontrão do Design Ativista que acontece sempre em dezembro, a maratona é totalmente colaborativa, recebemos pessoas de várias áreas para ajudar a organizar o evento que é considerado o maior encontro de designers ativistas do mundo. Oficinas, rodas de conversa, ter a experiência de conhecer outras pessoas que estão na linha de frente de outros projetos são algumas das dinâmicas desse encontro. Nesses momentos a gente percebe como é incrível promover essas trocas entre diferentes lutas e claro, não deixar a chama do ativismo se apagar. Em 2019, inclusive, eu conheci o David Carson, um designer californiano que simplesmente foi pesquisa do meu TCC na faculdade, consegue ver a dimensão que isso pode chegar?

Mas ainda assim, com todas as nossas qualidades, ainda estamos na construção de uma coletividade mais ampla, por exemplo, como o mercado do design num geral, ainda não temos uma representatividade grande em relação a diversidade de pessoas, pessoas pretas, periféricas, pessoas trans. E sabe porquê? Porque essas pessoas estão lutando na sua dignidade para trabalhar e conseguir se sustentar e aí que o mercado de trabalho (e nós também) precisa entender isso, é necessário contratar essas pessoas, abrir os olhos para como essas pessoas são marginalizadas porque não tem acesso aos mesmos recursos que pessoas cis e branca tem. Me coloco nessa crítica porque mesmo crescendo na periferia e tendo escassez de recursos, eu reconheço que os espaços que eu pisei depois da faculdade foram sim privilegio cis e branco.

O trabalho do designer ativista é questionar o status quo da sociedade.

Ou seja, eu termino esse texto dizendo, o privilégio branco nos permite ter o compromisso com o ativismo e é necessário questionar todo o ecossistema do mercado de trabalho, para depois ampliarmos a pauta. Isso é papel de nós, reivindicarmos que os espaços de design sejam espaços amplos e sem preconceito, que seja um espaço de convivência coletiva de qualquer pessoa – não só no discurso, mas também na prática. O Design ativista entende que ainda não alcançamos esse lugar da forma que desejamos, mas é nosso objetivo tornar nossos ambientes cada vez mais diversos e representativos.

Esse texto faz parte de uma série de conteúdos sobre o Design Ativista que eu vou abordar aqui nesta coluna, na próxima irei falar sobre os projetos que atuamos.

Para saber mais sobre, nos siga no instagram Design Ativista

Texto parcialmente publicado n’o Pulso Jussi

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