Criei um projeto de lei, na cidade de Contagem-MG, que institui o Dia Marielle Franco de Enfrentamento à Violência Política contra Mulheres a ser comemorado, todos os anos, no dia 14 de Março.

Muitas pessoas devem ter visto, nos veículos de comunicação, algumas reportagens sobre os ataques verbais que sofri, simplesmente por ter expressado a minha opinião durante uma reunião plenária remota dos vereadores e vereadoras de Contagem-MG. Por meio deste episódio foi perceptível que é notável que vivemos numa sociedade onde o mundo não está acostumado em ver mulheres negras em espaço de poder. Não vemos, tratamentos como este acontecerem com outros parlamentares quando expressam sua visão acerca de determinado assunto.

É de suma importância que as pessoas se atentem que o espaço virtual não é um local sem lei. A violência começa de forma verbal, podendo se tornar física. A intolerância, racismo e misoginia levou até a morte da então vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco, em 14 de março de 2018. Logo este, um mês considerado histórico para as mulheres, marcado por muitas lutas, combate ao machismo e ao patriarcado.⠀Muitas parlamentares negras e eu, somos sementes da Marielle em cada região do país e temos como direito democrático exercer nossa tarefa no espaço de poder, pois esta foi a escolha do povo que nos elegeu.

Marielle Franco foi protagonista das lutas pelas minorias, em prol dos direitos humanos e do feminismo. Socióloga, com mestrado em Administração Pública, eleita vereadora da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, com 46.502 votos. Mulher, negra, mãe, filha, irmã, esposa, LGBT, cria da favela da Maré, teve sua vida ceifada simplesmente por levantar bandeiras e não se calar diante do sistema patriarcal e capitalista em que vivemos. No dia do seu assassinato, havia participado de um debate de mulheres negras e estava a caminho de volta pra casa. As investigações andam a passos lentos e ainda não há identificação  do mandante do crime. Até quando as mulheres serão silenciadas e terão suas vidas interrompidas de forma tão cruel?

Para fortalecer ainda mais o empenho das mulheres que se esforçam a cada dia para efetivar seus direitos; para consolidar a trajetória das que tiveram suas vidas ceifadas de forma violenta e precoce, vítimas da sociedade machista e para combater a violência política, se faz necessário utilizar a data de 14 de março para celebrar o Dia Marielle Franco de Enfrentamento à Violência Política contra Mulheres.

O projeto de lei, de minha autoria, ainda dispõe que as autoridades municipais apoiarão e facilitarão a realização de divulgações, seminários e palestras nas escolas, centros universitários, praças, teatros e equipamentos públicos do município, sobre a temática em questão. Além disso, busca enfatizar a importância do enfrentamento à violência política contra mulheres, em especial a promoção da memória e luta de Marielle Franco, enquanto uma defensora de direitos humanos, que lutava por todas e todos.

Racismo no Brasil

Historicamente, o racismo se reflete nos índices de desigualdade social, racial e de gênero, violência armada e policial e, também, na ausência de acesso da população negra aos espaços de tomada de decisão.  Desta maneira, as faces do racismo e outras formas de discriminação, que estruturam a sociedade brasileira, permeiam as instituições e promovem diversos mecanismos que se filiam à manutenção de opressões e desigualdades.

Os dados das ONGs Terra de Direitos e Justiça Global, mostram que, enquanto os homens agentes políticos estão mais expostos à violência, por meio de assassinatos e atentados, as mulheres são as maiores vítimas de ataques que buscam a intimidação, a deslegitimação dos seus corpos enquanto agentes políticos e a exposição a situações vexatórias. São elas, 76% das vítimas em casos de ofensas que, em mais da metade desses casos, são motivadas pelo crime de racismo e misoginia.

Violência política

O problema da violência política no Brasil é histórico e tem raízes estruturais refletidas em nossa sociedade. Segundo dados da  Organização dos Estados Americanos (OEA), a violência política é caracterizada como uma ação, conduta ou omissão realizada de forma direta ou por meio de terceiros e se materializa na forma de agressões físicas, psicológicas, morais, sexuais, virtuais, institucionais, raciais, de gênero, LGBTQIA+fóbicas, entre outras. Este tipo de violência pode ser cometida contra candidatas, eleitas, nomeadas ou na atividade da função pública. É importante ressaltar que os  que os direitos políticos são fundamentais e promover seu livre exercício é dever do Estado e de todos os demais atores participantes do sistema político brasileiro.

A pesquisa intitulada “A Violência Política contra Mulheres Negras” do Instituto Marielle Franco apontou que quase 100% das candidatas ao pleito eleitoral de 2020 consultadas sofreram mais de um tipo de violência política. 60% dessas mulheres foram insultadas, ofendidas e humilhadas em decorrência da sua atividade política nestas eleições. A principal violência apontada pelas mulheres negras na pesquisa foi a virtual, representando quase 80% do total dos ataques sofridos.

Resistir, não desistir e fortalecer a luta!

Reconhecer a memória de uma defensora de direitos humanos e sua luta contra os desafios cotidianos causados pelo fenômeno da violência política e pelo machismo, é essencial para o fortalecimento de uma agenda propositiva. Assim, é possível fortalecer as pautas em defesa dos direitos humanos de forma geral, e principalmente, o direito ao exercício político e pela liberdade para todas as mulheres!

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