A terrível face da elite brasileira perdeu a máscara. Toda indecência está estampada na cara de um presidente desprezível que, de piada, se tornou um perigo global. Jair Bolsonaro não é diferente de seus pares, apenas não sente necessidade de esconder o que é. As transações que hoje o Planalto realiza são possíveis, tão somente, porque temos o legislativo vendido e o judiciário inerte. O Tribunal de Contas da União, outrora protagonista de denúncias contra o governo, hoje não passa de um carimbo para cumprir protocolos de validação dos atos administrativos. Sem riscos, Bolsonaro nada de braçadas, confortavelmente, em uma piscina de leite condensado.

Como isso é possível? Como notícias absurdas e denúncias graves não se tornam ameaças ao mandato presidencial? A fatura é alta e quem paga é o povo brasileiro. Talvez apenas Fernando Henrique Cardoso possa dizer que teve um governo tão estável quanto Jair Bolsonaro, e não é coincidência e sim método. O “Toma lá, dá cá” antes tão criticado pela direita é, na verdade, práxis dos mais diversos governos, parte dessas negociatas são compreensíveis, faz parte da política institucional e qualquer presidente terá que lidar com elas. No entanto, para tudo há limite, menos para as regalias e privilégios da elite brasileira, e isso FHC e Bolsonaro têm em comum: ambos garantem que sequer 1 real será tirado de leite condensado para reduzir a miséria e a pobreza.

O que fica cada vez mais transparente é que a estabilidade política do Brasil depende, intrinsecamente, da manutenção de um predatório e imoral sistema de transferência de renda, dos mais pobres para os mais ricos. Em qualquer momento em que tal sistema viu-se, minimamente ameaçado, crises e golpes ocorreram. Se em 2016 pedalada fiscal era um grave problema passível de impeachment, no primeiro dia de governo Michel Temer deixou de ser. Se antes a farra do cartão corporativo era motivo de constantes manifestações do TCU, hoje 15 milhões gastos em leite condensado não causam espanto.

O primeiro passo para uma mudança estrutural é a redistribuição de renda e não há qualquer possibilidade disso acontecer, sem antes atacarmos com tenacidade os privilégios de nossa elite. Existe uma parcela de congressistas disposta a isso (a bem da verdade, quase a totalidade se concentra na esquerda), contudo, é a minoria. E não se enganem: nossa elite, em especial o setor empresarial, depende do perverso sistema institucionalizado pelo Estado para garantir seus jatinhos e casas de luxo. Não por acaso financiam campanhas de seus candidatos.

E em meio a essa patifaria toda, o alto escalão do Estado deveria ser o responsável por fiscalizar e proteger os interesses gerais, mas o que vemos é o inverso. A manutenção do Status Quo é garantida por aqueles e aquelas que deveriam prezar pelo bem comum. Voltamos então ao problema da “velha política”, aquelas negociações escusas que custam caro ao país. Se entendermos isso, conseguimos explicar como a compra de 15 milhões de reais em leite condensado, com indícios muito claros de superfaturamento e favorecimento a pessoas próximas a Bolsonaro, nunca vai ser um problema para o miliciano.

O Planalto hoje gerencia a propina institucionalizada. Esse é o grande papel do capitão cloroquina, alocar recursos públicos para garantir os privilégios. De olho nisso, o deputado Elias Vaz, do PSB de Goiás, pretende encaminhar ao Ministério Público Federal representação contra o governo federal, pela aquisição de Cerveja, Picanha e Carvão. Os recursos foram destinados às Forças Armadas. No ano de 2020, a notícia de que as Forças Armadas do Brasil estavam na lista daquelas com maior investimento no mundo foi comemorada pelo governo e sua base, entretanto, de acordo com um general que preferiu não se identificar “o Brasil possui munição para 1 hora de guerra contra a Venezuela” Então cadê todo esse investimento?

Agora com a denúncia do deputado Elias Vaz descobrimos onde parte desse dinheiro é investido: festinhas de generais, com cerveja e churrasco. E vejam bem! Os estrelados não tomam qualquer coisa, o cardápio oferecido contava com Heineken, Stela Artois e Eisenbahn, para petisco, churrasco de picanha. Esse é o retrato do Brasil: enquanto o povo se encontra na miséria, com dificuldades de moradia, alimentação e emprego, o governo mantém privilégios e desperdiça recursos em um momento grave de pandemia e estagnação econômica. O quilo de carne chega a quase 40 reais, o gás de cozinha 90 reais, toda nossa base alimentar encareceu, e mesmo assim, o governo mantém despesas supérfluas para acalentar os corações golpistas do poder legislativo (em especial o centrão), dos militares e do poder judiciário.

Essa mesma gente defende o discurso da austeridade fiscal e da saúde dos gastos públicos. Foram esses mesmos crápulas (inclusive Jair Bolsonaro como deputado) que aprovaram a Emenda Constitucional do Teto dos Gastos, que impôs limites de investimentos em Educação, Saúde e Segurança por 20 anos. É político como Arthur Lira, que pagou com dinheiro público festa para 300 pessoas para comemorar sua vitória na eleição da presidência da Câmara, que agora quer acelerar o fim da estabilidade no serviço público, quando sabemos que o gargalo das contas públicas não está no baixo escalão e sim nos privilégios da parte de cima.

 Enquanto não houver uma revolução, o Brasil seguirá sendo o mesmo: Para a elite Cerveja e Picanha, para o povo Miséria e Fome.

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