Já defendi vários plantadores de maconha presos como traficantes em casa, por denúncia anônima, que faziam o autocultivo de pequena quantidade para uso próprio. Sou constantemente consultado por usuários que fumam em seu apartamento e são ameaçados por vizinhos.

Ambas as situações estão previstas no artigo 28 da Lei 11343/2006 e, mesmo sendo crime, a tais condutas não cabe a pena privativa de liberdade. Sendo aplicada pena de multa, por exemplo, a mesma não pode sequer ser convertida em pena de prisão, mesmo se não houver o pagamento. Diz ainda o artigo 48 da mesma lei, em seus parágrafos 2º e 3º que, para as condutas previstas no artigo 28, não se imporá prisão em flagrante e é vedada a detenção.

Portanto, não cabe prisão em flagrante para quem fuma maconha e planta pequena quantidade para uso próprio. O autor do fato deve ser encaminhado imediatamente a um juiz ou delegado, lavrando-se um termo circunstanciado, onde assumirá o compromisso de comparecer em juízo e será liberado.

Sendo assim, as autoridades não podem entrar no domicílio de alguém para prendê-lo em flagrante, porque “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.” Como na conduta do artigo 28 da Lei 11343/2006 “não se imporá prisão em flagrante”, conforme estabelece o artigo 48, parágrafo 2º da mesma lei, na exceção da violação do domicílio do “em caso de flagrante delito”, prevista no artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal, não cabe em caso de consumo e em autocultivo para preparar pequena quantidade de substância para uso próprio.

Cabe destacar ainda que o delito do flagrante para invadir um domicílio nestas condutas é totalmente desproporcional a circunstâncias similares a desastres ou que necessitem de socorro. No caso da polícia entrar no domicílio, sem o consentimento do morador, para realizar um flagrante delito, vedado pela lei 11343/2006, estará praticando o crime de invasão de domicílio, previsto artigo 22 da Lei 13869/2019, e coagindo alguém em sua liberdade de locomoção com abuso de poder.

Devo consignar que já realizei essa interpretação em defesas judiciais, mas não existe súmula, nem jurisprudência, esclarecendo que não é permitida a entrada em casa ou apartamento de consumidores ou cultivadores de pequena quantidade de maconha para uso próprio.

Trata-se de mais uma luta contra toda essa lei de drogas, que considero inteiramente inconstitucional. Isso me faz lembrar aqui o clássico “A Luta pelo Direito” de Ihering: devemos ter consciência dos nossos direitos para lutar por eles!

Conheça outros colunistas e suas opiniões!

Colunista NINJA

Memória, verdade e justiça

FODA

Qual a relação entre a expressão de gênero e a violência no Carnaval?

Márcio Santilli

Guerras e polarização política bloqueiam avanços na conferência do clima

Colunista NINJA

Vitória de Milei: é preciso compor uma nova canção

Márcio Santilli

Ponto de não retorno

Andréia de Jesus

PEC das drogas aprofunda racismo e violência contra juventude negra

Márcio Santilli

Através do Equador

XEPA

Cozinhar ou não cozinhar: eis a questão?!

Mônica Francisco

O Caso Marielle Franco caminha para revelar à sociedade a face do Estado Miliciano

Colunista NINJA

A ‘água boa’ da qual Mato Grosso e Brasil dependem

Ivana Bentes

O gosto do vivo e as vidas marrons no filme “A paixão segundo G.H.”

Márcio Santilli

Agência nacional de resolução fundiária

Márcio Santilli

Mineradora estrangeira força a barra com o povo indígena Mura

Jade Beatriz

Combater o Cyberbullyng: esforços coletivos

Casa NINJA Amazônia

O Fogo e a Raiz: Mulheres indígenas na linha de frente do resgate das culturas ancestrais