“Os toca-discos é meu instrumento, a forma de eu expressar os meus sentimentos, a minha musicalidade”. Foto: Izabela Cardozo

O paulistano DJ Erick Jay é primeiro e único sul-americano a ganhar um título mundial de DJ. Erick representa o Brasil em competições internacionais desde 2009 e já tem três no currículo: DMC World Supremacy 2016 (Londres), IDA World 2016 (Polônia) e, mais recentemente, o DMC Online 2019 (veja os detalhes no Estúdio I), além de dezenas de títulos nacionais e pódios em outras competições internacionais. Quando não está competindo, Erick ministra workshops, toca em bailes e festas e, ainda, se apresenta com Black Alien e Kamau (nesta sexta, 10, inclusive, participa da live com o rapper carioca a partir das 21h).

Erick é um amante da arte dos toca-discos e luta para que a classe seja mais valorizada. Por isso, sempre participa de eventos e faz lives para compartilhar conhecimento e experiências. Em entrevista antes da live que fará junto a Black Alien, ele fala sobre o impacto do coronavírus nas periferias de São Paulo, sobre o racismo estrutural no Brasil, sobre a desigualdade de oportunidades para quem quer ser um profissional da música no país, sobre suas influências musicais e muito mais. Conheça esse grande talento da música brasileira em entrevista exclusiva para a coluna de Juan Manuel P. Domínguez para Mídia Ninja!

Você nasceu na zona leste de São Paulo. Qual foi o papel que a música desempenhou na sua infância?

Sim, nasci e moro no mesmo bairro até hoje. A música sempre esteve presente desde cedo na minha vida. Meu pai era DJ de equipe do bairro. Por isso, cresci ouvindo e bisbilhotando os discos de vinil dele. Lembro que ele tinha do Marvin Gaye, James Brown, Michael Jackson, Tim Maia, entre outros. Eu gostava de ficar olhando as capas… A música me deu experiência e alegria.   

Como paulistano, como está experienciando o fato de ser a região com o maior impacto de mortes e casos de Coronavírus?

A gente sabe que a corda sempre arrebenta para o lado mais fraco. Isso acontece em tudo e com saúde pública, infelizmente, não é diferente. As regiões periféricas estão sendo mais afetadas em número de casos e morte pelo coronavírus. Sapopemba, aqui perto da minha casa, está entre os bairros com o maior número de mortes. É muito triste essa situação.

Muitos consideram a música electrónica, produzida por DJs, como uma música exclusiva para o lazer de elites e classes privilegiadas. Quanto há de verdade nisso?

Hoje em dia mudou bastante. É claro que a música eletrônica predomina em festas elitizadas, mas já está se popularizando e presente em outras festas também. O curioso é que um dos ritmos eletrônicos que prevalece nesta cena é o Drum and Bass, um estilo que nasceu no subúrbio da Inglaterra. Aqui no Brasil, esta cena também foi formada nas periferias. Os principais DJs e produtores que eu conheço vêm de quebrada.

Quanto se precisa de estímulos para que DJs periféricos possam ter as mesmas oportunidades de se destacar em igualdade de condições que outros Djs não periféricos?

Há um abismo social enorme. Creio que o primeiro ponto é que os equipamentos para tocar são caros demais no Brasil. Em segundo lugar, normalmente, quem vem de periferia precisa dividir o seu tempo entre trabalhar para ajudar em casa, estudar e, ainda, ter tempo para treinar, porque para ser um bom DJ é preciso muito esforço e dedicação. Eu mesmo, no início, trabalhava como office boy em uma empresa na região da Av. Paulista e tocava à noite. Muitas vezes, tocava a noite inteira e ia trabalhar direto. Portanto, se você é de periferia e quer ser DJ saiba que a correria é dobrada, mas vale a pena.

Outra coisa que vale citar, é que tem cada vez menos oficinas e workshops de DJ em periferias. Quando eu era convidado para algum evento deste tipo, eu ia com o maior prazer.  Mas agora é algo cada vez mais raro! Até em eventos de Hip Hop, o DJ está sendo deixado de lado, um erro muito grande. O DJ é um dos elementos e o pilar da cultura Hip Hop.

Há pouco tempo o assassinato de George Floyd nas mãos da polícia de Minneapolis suscitou uma série de protestos e ações solidárias de muitos artistas e músicos no Brasil e no mundo. Como percebe esse envolvimento atual dos artistas nas pautas sociais do seu contexto histórico?

O Will Smith disse uma frase muito importante: ‘Racismo não está piorando, está sendo filmado’. De uma forma geral, o mundo ainda é muito racista. Os Estados Unidos, onde aconteceu este episódio, é racista. Eu fui três vezes para lá e no aeroporto toda vez a abordagem é diferente, a fila é diferente, o tratamento é diferente, tudo é diferente se comparado com uma pessoa branca. Eu acho importante levantar essa discussão, debater o assunto. Vi vários artistas levantarem a bandeira e acho importante ter pessoas sérias e com propriedade para falar sobre o assunto. Mano Brown, Dexter, Thaide, Emicida e muitos outros estão na linha de frente.

O KL Jay, DJ que me inspiro muito, também disse uma coisa interessante: “o racismo foi inventado pelos brancos”, por isso, eles precisam entender que o racismo está enraizado na nossa cultura há séculos e séculos.

 

Foto: Arquivo pessoal

Você ganhou o DMC World Supremacy 2016 (Londres), IDA World 2016 (Polônia) e, mais recentemente, o DMC Online 2019. Quanto servem esses prêmios para visibilizar a América do Sul e o Brasil dentro do universo  da música de Djs?

Claro que ganhar esses prêmios foi uma realização pessoal e profissional muito grande. Porém o que mais me deixou feliz foi mostrar para o mundo inteiro que na América do Sul, em especial no Brasil, existe uma cena ativa com vários DJs bons. Eu me inspiro em DJ gringo, mas também me inspiro em muitos DJs daqui. Espero que os DJs brasileiros continuem se dedicando, competindo e que tragam mais títulos para o nosso país. 

Você se define como um amante da arte dos toca-discos. Poderia detalhar mais do que trata isso?

Eu sou apaixonado por música e acho que nós precisamos tratar a música com mais carinho. O toca-discos é meu instrumento, a forma de eu expressar os meus sentimentos, a minha musicalidade. Me considero um amante dos toca-discos, porque amo e respeito muito a cultura Hip Hop, os DJs que vieram antes de mim e abriram portas e amo tocar. Sou muito realizado e feliz na profissão que escolhi!

Que músicos brasileiros o influenciaram?

Vários. Vou citar alguns: Ivan Lins, Jorge Ben, Sandália de Prata, Seu Jorge, Marina Lima, Ed Motta, Gilberto Gil, Olodum, entre outros artistas.

Quais são os sonhos que ainda deseja realizar?

Graças a Deus já realizei alguns dos meus sonhos. Mas o que eu desejo realizar agora é gravar um disco com várias participações. Um disco de música brasileira, com participação do Olodum e outros nomes que eu citei na resposta anterior. Quero explorar toda a riqueza da música brasileira. 

Obrigado Eric!

Obrigado Juan pela oportunidade e convido a todxs para assistir a live do Black Alien e DJ Erick Jay na sexta-feira, dia 10, às 21h:

 

E no dia 17, sexta-feira, vou falar sobre os desafios de ser DJ Durante a Pandemia em uma live com a equipe do Cult Cultura.

Mídias Erick Jay: @erickjay / @amais_assessoria / @thipaleari

 

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