Protocolei outra notícia-crime contra o Presidente da República em razão de seu discurso realizado em cadeia nacional no dia 24 de março de 2020:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – DD. DOUTOR ANTÔNIO JOSÉ DIAS TOFFOLI

ANDRÉ MAGALHÃES BARROS, brasileiro, advogado, inscrito na OAB/RJ – 64495, com escritório na cidade do Rio de Janeiro, à rua Senador Dantas 117, sala 610, Centro, vem apresentar a Vossa Excelência NOTÍCIA-CRIME contra JAIR MESSIAS BOLSONARO, Excelentíssimo Senhor Presidente da República, pelos fatos e fundamentos seguintes:

Em 24 de março de 2020, o Presidente da República, através do seguinte discurso transmitido em cadeia nacional, transcrito abaixo, praticou o crime de apologia duas vezes quando enalteceu os delitos de desobediência e de infração de medida sanitária preventiva, verbis:

“Desde quando resgatamos nossos irmãos em Wuhan, na China, em uma operação coordenada pelos ministérios da Defesa e das Relações Exteriores, surgiu para nós um sinal amarelo. Começamos a nos preparar para enfrentar o coronavírus, pois sabíamos que mais cedo ou mais tarde ele chegaria ao Brasil.

Nosso ministro da Saúde reuniu-se com quase todos os secretários de Saúde dos estados para que o planejamento estratégico de combate ao vírus fosse construído e, desde então, o doutor Henrique Mandetta vem desempenhando um excelente trabalho de esclarecimento e preparação do SUS para atendimento de possíveis vítimas. Mas, o que tínhamos que conter naquele momento era o pânico, a histeria. E, ao mesmo tempo, traçar a estratégia para salvar vidas e evitar o desemprego em massa. Assim fizemos, quase contra tudo e contra todos.

Grande parte dos meios de comunicação foram na contramão. Espalharam exatamente a sensação de pavor, tendo como carro chefe o anúncio de um grande número de vítimas na Itália, um país com grande número de idosos e com um clima totalmente diferente do nosso. Um cenário perfeito, potencializado pela mídia, para que uma verdadeira histeria se espalha-se pelo nosso país.

Contudo, percebe-se que, de ontem para hoje, parte da imprensa mudou seu editorial. Pedem calma e tranquilidade. Isso é muito bom. Parabéns, imprensa brasileira. É essencial que o equilíbrio e a verdade prevaleça, entre nós.

O vírus chegou, está sendo enfrentado por nós e brevemente passará. Nossa vida tem que continuar. Os empregos devem ser mantidos.

O sustento das famílias deve ser preservado. Devemos, sim, voltar à normalidade. Algumas poucas autoridades estaduais e municipais devem abandonar o conceito de terra arrasada, como proibição de transporte, fechamento de comércio e confinamento em massa. O que se passa no mundo tem mostrado que o grupo de risco é o das pessoas acima dos 60 anos. Então, por que fechar escolas? Raros são os casos fatais de pessoas sãs, com menos de 40 anos de idade. 90% de nós não teremos qualquer manifestação caso se contamine. Devemos, sim, é ter extrema preocupação em não transmitir o vírus para os outros, em especial aos nossos queridos pais e avós. Respeitando as orientações do Ministério da Saúde.

No meu caso particular, pelo meu histórico de atleta, caso fosse contaminado pelo vírus, não precisaria me preocupar, nada sentiria ou seria, quando muito, acometido de uma gripezinha ou resfriadinho, como bem disse aquele conhecido médico daquela conhecida televisão.

Enquanto estou falando, o mundo busca um tratamento para a doença. O FDA americano e o Hospital Albert Einsten, em São Paulo, buscam a comprovação da eficácia da cloroquina no tratamento do Covid-19. Nosso governo tem recebido notícias positivas sobre este remédio fabricado no Brasil e largamente utilizado no combate à malária, lúpus e artrite.

Acredito em Deus, que capacitará cientistas e pesquisadores do Brasil e do mundo na cura desta doença.

Aproveito para render as minhas homenagens a todos os profissionais de saúde. Médicos, enfermeiros, técnicos e colaboradores que, na linha de frente nos recebem nos hospitais. Nos tratam e nos confortam. Sem pânico ou histeria, como venho falando desde o início, venceremos o vírus e nos orgulharemos de estar vivendo neste novo Brasil, que tem tudo, sim, para ser uma grande Nação. Estamos juntos, cada vez mais unidos, Deus abençoe nossa pátria querida.”

Quanto ao pronunciamento presidencial, cabe destacar que atletas de todo o mundo solicitaram o adiamento das Olimpíadas de Tóquio por medo do coronavírus, pedido acatado pelo Comitê Olímpico Internacional, sem data exata marcada para a sua realização. Concomitantemente, o Presidente do Brasil declarou o seguinte:

“No meu caso particular, pelo meu histórico de atleta, caso fosse contaminado pelo vírus, não precisaria me preocupar, nada sentiria ou seria, quando muito, acometido de uma gripezinha ou resfriadinho, como bem disse aquele conhecido médico daquela conhecida televisão.”

Enquanto o Brasil inteiro está em isolamento social, assim como ocorre em todo o planeta, o Presidente da República defende que as escolas sejam abertas, pois seriam raros os casos fatais em pessoas com menos de 40 anos de idade, elencando como grupo de risco somente as pessoas com mais de 60 anos.

Assim, ignora a orientação da Organização Mundial da Saúde e a Lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, que o próprio noticiado sancionou. Lei complementar do tipo penal em branco do artigo 268 do Código Penal, que penaliza com a detenção de 1(um) mês a 1(um) ano, e multa, qualquer pessoa que “infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”. Trata-se de infração de medida sanitária preventiva para tutelar a saúde pública.

Plenamente consciente da apologia do crime do artigo 268 do Código Penal, o Presidente da República concitou a população a desobedecer às medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, responsável pelo surto de 2019, objetivos destacados na ementa da Lei 13979, que sancionou em 6 de fevereiro deste ano e entrou em vigor na data da sua publicação.

Vivemos sob o Império da Lei e não sob o Império do Rei ou de um Presidente da República que, como primeiro mandatário da nação, não só deve como tem o dever de dar o exemplo de respeitar as leis. No caso em tela, o crime de apologia é cristalino.

Houve apologia de crime daqueles descritos nos artigos 268 e 330 do Código Penal Brasileiro. Com o advento da Portaria Interministerial nº 5, a apologia ficou ainda mais evidente, uma vez que há citação expressa dos artigos e ameaça com a espada da Lei qualquer pessoa que a viole.

Cabe registrar a gravidade do trecho destacado acima, quando o Presidente da República diz que, “se” fosse contaminado pelo vírus, não precisaria se preocupar, pois seria acometido de uma “gripezinha”. Trata-se de um discurso epidêmico, pois milhões de brasileiros que votaram no Presidente podem seguir sua fala e achar que vão pegar um ”resfriadinho” e, daí, o surto pode realmente se alastrar, levando milhares de compatriotas à morte.

O pouco caso que o Presidente da República faz da possibilidade de estar ou vir a ser contaminado pelo vírus é gravíssimo. Ele liderou recentemente uma comitiva aos Estados Unidos, região de contaminação pelo coronavírus, assim classificada no artigo 5º, inciso II, da Lei 13979, da qual 22 autoridades e convidados retornaram contaminados. No entanto, os resultados dos dois exames realizados pelo Presidente da República não foram apresentados ao País. Além de deixar toda uma nação desconfiada, o mesmo não colabora com as autoridades sanitárias, pois os testes do primeiro mandatário da República deveriam ser apresentados, até como maneira de dar exemplo ao Brasil. Teoricamente, cabe consignar que, caso o resultado do exame do Exmo. Sr. Presidente da República fosse positivo para o coronavírus, em caso de morte de alguém da delegação, o mesmo teria praticado um crime hediondo, previsto no artigo 1º, inciso VII, da Lei 8072/2020, cuja pena pode chegar a 30 anos de reclusão:

“Art. 267 – Causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos:
Pena – reclusão de dez a quinze anos.

§ 1º – Se do fato resulta morte, a pena é aplicada em dobro.”

Situação similar já foi apresentada na notícia-crime, protocolada sob o nº 16165/2020, sobre o comportamento do Presidente da República na manifestação de 15 de março de 2020 à entrada do Palácio do Planalto. Alguém que está infectado pelo coronavírus, ou tem consciência de que pode contaminar outra pessoa, não pode sair por aí apertando a mão, abraçando e fazendo selfies, pois o mundo todo sabe que é exatamente assim que o vírus se propaga. O fato dessas condutas partirem do Presidente da República afeta diretamente a Saúde Pública e a “segurança interna do País”, pois o mesmo deveria ao menos estar de quarentena, como estabelece o artigo 2º, inciso II, combinado com o artigo 5º, inciso II, da Lei 13.979/2020.

Os crimes praticados por Bolsonaro são de ação penal pública incondicionada, a qual deve ser promovida privativamente pelo Procurador-Geral da República, com a competência do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar.

Pelo exposto, vem requerer a Vossa Excelência que a presente NOTÍCIA-CRIME seja encaminhada ao Procurador-Geral da República.
N.Termos
P.Deferimento

Rio de Janeiro, 26 de março de 2020

ANDRÉ BARROS
OAB/RJ – 64495

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