Foto: Anis Instituto Bioética

A região da América Latina e Caribe é a única do mundo onde o número de meninas de 15 a 19 anos que dão à luz é, ao mesmo tempo, elevado e segue crescendo. Isso é resultado da violência sexual, falta de acesso a serviços integrais de saúde e a violação de múltiplos direitos de meninas. Mais de um milhão de crianças e adolescentes na região enfrentam a violência sexual e os casos se repetem diariamente.

No Brasil, as únicas situações permitidas por lei para o abortamento estão ameaçadas por projetos como o do vereador e membro do MBL Fernando Holiday, aproximando o país da grave situação de violação de direitos humanos de meninas de outros países da América Latina. A proposta em tramitação na Câmara dos Vereadores prevê que mesmo aquelas que sofreram abusos ou passaram por situações de violência e trauma tenham que enfrentar uma série de procedimentos com vias de dificultar o processo, obrigando muitas vezes crianças e adolescentes a darem à luz.

Caso o projeto seja aprovado, vítimas já fragilizadas, com menos acesso à recursos, informações e que, em alguns casos, estão na mesma casa ou na mesma rede que quem as violentou, terão que conseguir um alvará, ter aconselhamento religioso e podem até ser obrigadas a ouvir batimentos cardíacos e ver o ultrassom “antes de tomar a decisão”.

Para denunciar ações como essa e trabalhar pela proteção de meninas em situações iguais ou parecidas com a das brasileiras surgiu o Niñas no Madres, uma campanha lançada em 2016 pela Planned Parenthood Global, GIRE, Anistia Internacional e CLACAI. Hoje, a campanha se transformou em uma ferramenta de denúncia a nível global e em um esforço coletivo de várias organizações em toda a América Latina.

Desde o lançamento, Niñas No Madres esteve presente nas ruas, nas redes sociais, na mídia e realizou ações de advocacy diante de instâncias internacionais e nacionais para reivindicar a proteção da saúde e da vida das meninas latino-americanas.

Histórias em primeira pessoa

Durante a campanha foram compartilhadas várias histórias de meninas que sofreram abusos e violações físicas e psicológicas com o objetivo de aumentar a conscientização. Lucia, Norma, Susana, Fatima foram as protagonistas e tiveram seus casos levados para o Comitê de Direitos Humanos da ONU.

O que elas têm em comum?

  • Elas tinham menos de 14 anos quando engravidaram como resultado do abuso.
  • Foi-lhes negado o acesso oportuno aos serviços essenciais de saúde, incluindo a interrupção legal da gravidez.
  • Sua saúde integral foi afetada e sua vida foi colocada em risco.
  • Elas não tiveram acesso à informação e educação sexual.

A negação do acesso a informações e serviços de saúde, bem como a falta de acesso à justiça e a impunidade, são pontos em comum que explicam os impactos negativos de um problema estendido e crescente em toda a região.

“Buscamos justiça e reparação para esses casos e ajudamos a gerar padrões internacionais que evitem que essas situações se repitam, incluindo o reconhecimento do papel crucial do acesso a serviços abrangentes de saúde reprodutiva para meninas sobreviventes de violência sexual”, afirma o site da campanha.

Números alarmantes

No Brasil: 68,4 bebês nascidos de mães adolescentes a cada mil meninas de 15 a 19 anos, diz relatório da Organização Mundial da Saúde.

No Equador: Todos os dias, 7 meninas com menos de 14 anos engravidam por causa da violência sexual.

No México: Em 60% dos casos, os agressores são parentes ou pessoas conhecidas.

Na Nicarágua: 8 de 10 vítimas de violência sexual são meninas com menos de 13 anos de idade.

Na Argentina: A cada 3 horas uma garota entre 10 e 14 anos dá a luz.

No Peru: todos os dias, 4 meninas com menos de 15 anos dão à luz.

Na Guatemala: a gravidez é a principal causa de abandono escolar de meninas e adolescentes.

Na América Latina

Com o passar do tempo, a campanha assumiu diferentes dimensões nas redes e na mídia. Em cada país, o slogan foi adaptado de acordo com os casos.

Na Argentina, por exemplo, um editor de um dos principais meios de comunicação, The Nacion, tentou romantizar o fato de meninas serem obrigadas a levar adiante uma gestação: “É admirável ver o desdobramento do instinto materno, é um instinto vital para a preservação, é avassalador como tudo foi dito e escrito a partir de uma teoria que está em desacordo com o direito à vida”. Finalmente, o editorial termina exigindo “apoio às mães”, tanto se suas gestações “foram desejadas, quanto se foram causadas por violação, ignorância ou necessidade”.

A reação foi imediata: jornalistas, organizações e meios de comunicação locais e internacionais repudiaram o ocorrido:

Outro entre os casos emblemáticos na Argentina foi o da menina de 11 anos que teve o direito de acesso ao aborto legal negado, mesmo tendo sido vítima de estupro, e foi forçada a uma cesariana. O feto não sobreviveu.

Atrizes e personalidades publicaram suas fotos aos 11 anos para aumentar a conscientização sobre a gravidade do caso e pedir pelo #AbortoLegal.

Atrizes argentinas decidiram publicar fotos de sua infância sob o slogan “Meninas não mães”.

Os casos se multiplicam. #NiñasNoMadres têm sido usado como um dispositivo de atenção e alarme para novos casos de abuso, usando a campanha para rechaçar a prática e garantir a proteção das vítimas. Confira algumas repercussões da campanha nas redes.

https://twitter.com/LaPeriodicanet/status/1141916952992129024

Resumen del día: ¡Son niñas, no madres!