O ex presidente Lula durante ato em Brasília, DF Foto: Mídia NINJA

(reprodução Facebook Centro Acadêmico João Mendes Junior)

Nota dos Centros Acadêmicos João Mendes Júnior (Mackenzie), Centro Acadêmico XI de Agosto (USP) e Centro Acadêmico 22 de Agosto (PUC – SP)

Em momentos de crises agudas que tumultuam nosso país, cresce a necessidade de se evitar caminhos que pavimentam o autoritarismo. É por isso que não podemos nos calar.

No dia 24 de janeiro de 2018, o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva será julgado em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre. O órgão irá analisar o recurso apresentado pelo réu e deverá confirmar ou rever a sentença proferida em julho de 2017 pelo juiz Sérgio Moro. Esta decisão poderá influenciar no cômputo dos votos do ex-Presidente, pré-candidato ao pleito eleitoral no próximo mês de outubro, tendo, portanto, papel importante na agenda político-institucional do país.

Nesse sentido, o Centro Acadêmico João Mendes Júnior, da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, o Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP (Largo de São Francisco) e o Centro Acadêmico 22 de Agosto, da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), vêm, por meio desta nota, debater o caso de grande repercussão jurídica e política e se colocar em defesa da Democracia e da Legalidade.

O ex-Presidente é acusado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, tendo sido condenado em primeira instância pelo juiz Sérgio Moro. O magistrado acatou a denúncia de que a reserva e a reforma de um triplex no Guarujá (SP) seriam pagamento de propina da empreiteira OAS, como contrapartida por contratos da empresa com a Petrobras. Não há, contudo, evidências de que o acusado detinha de fato o imóvel ou que este constitui seu patrimônio, sendo que sua sentença condenatória afirma que Lula é “proprietário de fato” do imóvel – instituto jurídico inexistente no Direito Brasileiro. Outro ponto é que a condenação por corrupção passiva foi feita sem qualquer “ato de ofício” realizado em contraprestação pelo réu, outro elemento essencial na configuração deste tipo penal, são algumas das aberrações jurídicas indicadas na sentença.

Parcela da população clama pela probidade na política, mas se cega diante da hipertrofia do Judiciário e seu ativismo excessivo. Sob o pretenso pretexto de fazer justiça, não respeita o texto da lei e princípios constitucionais, como o devido processo legal (art. 5o, LIV da CF), a ampla defesa (art. 5o, LV da CF) e mesmo a presunção de inocência (art. 5o, LVII da CF).

O juiz Sérgio Moro conduziu o processo de modo inapropriado, divulgando ilegalmente grampos telefônicos de conversas privadas de Lula, o que caracteriza prova ilícita, que não pode ser aproveitada no processo (art. 5o, LVI da CF). Além disso, o magistrado autorizou arbitrariamente a condução coercitiva do acusado, com excesso de força policial, expondo ao ridículo e sugerindo que ele fosse desde já culpado. E tudo isso sob a sensacionalista cobertura midiática sobre todo correr do julgamento.

O julgamento de Lula instaura uma nova etapa de um processo de hipertrofia do Poder Judiciário. Este poder, historicamente, sempre foi utilizado para o controle político da estrutura social brasileira, em um processo marcado pela seletividade do sistema penal, que criminaliza e encarcera a população negra e pobre brasileira. Entretanto, na última década, esse processo foi ampliado como instrumento de disputa e de criminalização da política institucional, em ataque aos movimentos sociais e aos setores progressistas, orquestradas às custas das liberdades públicas garantidas em nosso ordenamento constitucional.

A retirada do ex-presidente do próximo pleito eleitoral é a continuidade deste processo de supressão do direito da população de escolher os rumos do projeto de desenvolvimento nacional. Este processo, atualmente, se legitima a partir de uma suposta e também seletiva “cruzada contra a corrupção”, elemento legítimo para alcançar algum nível de respaldo (cada vez menor) da população. Por meio de um objetivo respaldado na sociedade, os órgãos do sistema de justiça- Polícia Federal, Ministério Público e Juízes – suprimem direitos e garantias individuais e coletivos conquistados em nosso ordenamento constitucional no período de transição democrática.

O desrespeito ao devido processo legal, à ampla defesa, o abuso de prisões preventivas, a utilização indiscriminada e desregrada do instrumento da “delação premiada” e das quebras de sigilos telemáticos e telefônicos, aliadas à prisão sem trânsito em julgado, todas estas realizadas em conjunto com o poder midiático, reforçam um sistema de justiça que chega até mesmo a processos de condenações sem provas.

Em suma, as provas e alegações produzidas não tem condão de condenar Lula. Caso seja condenado pelo TRF-4, cremos que sua eventual prisão é inconstitucional, visto que não haverá trânsito em julgado da decisão. Defendemos a otimização dos mandamentos constitucionais, não devendo o Direito servir como instrumento de guerra (lawfare) contra adversários políticos. Havendo ofensa direta ao texto constitucional cabe, pois, ao STF ditar a última palavra nessa matéria.

Posicionar-se contra essas medidas autoritárias e antidemocráticas é mais do que defender Luiz Inácio Lula da Silva, visto que essas arbitrariedades afrontam o povo brasileiro e o próprio Estado Democrático de Direito, baseado nos direitos e garantias fundamentais. Acreditamos que é dever do Judiciário, nesta quarta-feira, proferir uma decisão justa e compatível com tais preceitos, que coloca como único caminho possível a absolvição do ex-Presidente e, desse modo, no plano individual, a afirmação dos direitos do cidadão contra as arbitrariedades do sistema de justiça; e no plano coletivo, o direito da população brasileira, a partir do voto popular e livre da interferência de outros interesses, definir os rumos que deseja para o país.