Ao dar impunidade a crimes de “violenta emoção”, lei de Moro desengaveta debate sobre a legítima defesa que inocentou agressores de violência doméstica e foi amplamente derrotada pelo movimento feminista no Brasil.

Ministro Sérgio Moro defende projeto que absolve crimes de “violenta emoção” a agentes policiais e reacende flexibilização da legítima defesa combatida pelo movimento feminista no Brasil. Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil

“O juiz poderá reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção.”

A citação acima foi um dos artigos mais polêmicos da lei anticrime, apresentada pelo ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro. O artigo desobstrui a dita “licença para matar” e é uma das medidas sobre a legítima defesa que altera o Código Penal. Ao final das medidas, o projeto menciona que a legítima defesa se refere ao ato cometido pelo “agente policial ou de segurança pública”, ainda que nos artigos anteriores, só se dava menção ao “agente”.

Contudo, ao trazer à tônica a discussão sobre a “legítima defesa”, o projeto de lei reacende a velha polêmica acerca do crime passional no caso da violência doméstica contra a mulher. Mesmo amparada pela Lei do Feminicídio, sancionada pela então presidenta Dilma Rousseff em 2015, o que acontece com o criminoso que alegar ter sido acometido por uma “emoção violenta”?

O debate havia ganhado força no movimento feminista após o caso emblemático do assassinato da atriz Ângela Diniz por seu companheiro Doca Street em 1976. Ele foi absolvido no primeiro julgamento em 1979 e a condenação acabou recaindo sobre a vítima. O caso abriu jurisprudência para a impunidade na violência doméstica e atiçou o movimento feminista em todo o país.

Hoje, vemos avanços como a Lei do Feminicídio, que torna crime hediondo a violência contra a mulher por sua condição de gênero. A própria Justiça brasileira, por meio do STF e STJ, já não recepciona mais o conceito de “forte emoção” ou a “legítima defesa da honra”, já que são critérios muito subjetivos.

O projeto ainda deverá ser aprovado pelo legislativo. Hoje o ministro Sérgio Moro levou o projeto até a Câmara dos Deputados em uma sessão conturbada, com entrada negada à imprensa. Conforma a deputada federal Luiza Erundina (PSOL/SP), não houve “abertura para o debate com os parlamentares”.