Com nova norma, governo Bolsonaro facilita compra de softwares proprietários e escanteia programa do Software Público Brasileiro, deixando de economizar mais de R$ 600 milhões em tecnologias digitais.

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Será o fim da política de software livre no Brasil? O país nos últimos anos gastou mais de 3 bilhões para pagar licenças de softwares desenvolvidos em outros países. O que poderia ser uma solução de economia no setor, com o uso de softwares livres, está com os dias contados. A Controladoria Geral da União (CGU), em auditoria realizada em 2015, já indicava que o governo precisaria investir na política do Software Público. Seria uma economia de R$ 600 milhões no setor.

No entanto, o atual governo brasileiro publicou um novo modelo para aquisições de bens e serviços de tecnologia do Poder Executivo Federal, conforme Instrução Normativa nº 1, de 04 de abril de 2019. Com a nova norma, o texto que tratava da necessidade de se olhar prioritariamente o Portal do Software Público antes de contratar foi suprimido, junto com o termo Software Livre. Na nova instrução existe o texto “as alternativas do mercado” como precedente da análise da Portaria 46 que dispõe sobre a disponibilização do Software Público.

O cenário que se desenha é que mais de 200 órgãos que compõem a administração federal deverão submeter os processos de compras acima de R$ 28,6 milhões à aprovação do Ministério da Economia, que avaliará em detalhes a solução pretendida e o seu alinhamento com as metas de governo digital.

Na prática é uma brecha sutil que flexibiliza para todos os órgãos do governo federal a contratação de softwares proprietários enviando bilhões de reais para grandes corporações internacionais, fora do Brasil. Esta política desestimula ainda mais o investimento em arranjos produtivos locais e em pequenas empresas, deixando de fazer o dinheiro circular por aqui, além de facilitar o desvio de recursos públicos com a compra de licenças de software por gestores mal intencionados.

O Software Livre é um modelo de licença de software que permite auditabilidade, ou seja, autoriza que qualquer pessoa com conhecimentos técnicos estude e entenda todo o código do software, identificando se existe algum código malicioso ou mesmo rotinas desconhecidas capazes de expor informações privadas, sigilosas, que possam colocar em risco a soberania e a segurança nacional. Portanto é mais seguro e transparente, além de permitir um conhecimento aberto a todos.

Através da licença GNU GPL, é possível ter as quatro liberdades do Software Livre , como executar, estudar, redistribuir e de distribuir cópias de suas versões modificadas a outros.

O Software Público é um modelo derivado do software livre, com a diferença que o Governo presta o serviço de sustentação para as soluções através de um ambiente virtual, o Portal do Software Público. O modelo possui diversos artigos publicados, matérias e premiações nacionais e internacionais.

Para entender melhor a história do Software Público, onde o Brasil é precursor, você pode ler o artigo publicado na revista do V Simpósio de História da Informática na América Latina e Caribe. “Software Público Regional: Conectando o modelo colaborativo regional entre países da América Latina e Caribe”

O Portal do Software Público conta com mais de 80 soluções, como Educatux, Amadeus LMS, e o i-Educar, que está instalado em mais de 80 municípios, atendendo mais de 500 mil alunos da rede pública e em toda a rede do Distrito Federal. Só no DF a economia foi de 91 milhões de reais. Diversas iniciativas internacionais vão de encontro a filosofia do Portal do Software Público. Afinal se o dinheiro é público, o código deve ser público.

Confira o posicionamento da Mídia NINJA

A Mídia Ninja, através da iniciativa do Ninja Hacker Space, repudia esta ação do governo e informa que estamos atentos e buscando alternativas para não deixar que ações obscuras e silenciosas possam permitir que os interesses de grandes corporações prevaleçam, e que também o desperdício de dinheiro público por governos sem responsabilidade com o tema do software livre e público se tornem práticas constantes. É de interesse de toda a sociedade brasileira  que todas as informações sobre as aquisições sejam disponibilizadas em formato aberto no Portal de Dados Abertos

Brasil, Software Livre acima de tudo, construído por todos

Ninguém solta a mão de ninguém, nem no mundo virtual!

Cláudia Schulz, CEO da NINJA Hacker Space.

Luis Felipe Coimbra Costa é membro do Rio Hacker Space, Associação Software Livre e da NINJA Hacker Space. Mestre pela UNB e doutorando em engenharia de sistemas e computação pela UFRJ.