No Brasil, terceiro país que mais prende no mundo, duas a cada 3 pessoas encarceradas são negras. Apesar dos avanços sociais significativos na vida da população negra, fruto de políticas públicas dos governos progressistas nos últimos anos, é nesse mesmo período que se intensifica o encarceramento em massa, com o aumento de presos em mais de 200% após a aprovação da Lei de Drogas no ano de 2006. Segundo a intelectual Juliana Borges, isso apenas constata os rearranjos estruturais de uma sociedade forjada na desigualdade e baseada na hierarquia racial.

A guerra às drogas é fundamental para entender o genocídio de negros e negras no Brasil, mais de 60% das mulheres encarceradas foram acusadas de algum crime diretamente relacionado às drogas, enquanto que entre os homens o número chega a 26%. Mas num país que diariamente a sociedade é bombardeada com reportagens criminalizando corpos negros, que a polícia tem licença para matar, e que o sistema de justiça é composto quase que absolutamente por brancos, não basta expor os números assustadores, é preciso compreender o projeto de nação desde a sua fundação, e os reflexos nos diais de atuais.

É com a proposta de evidenciar o projeto genocida desde a formação do estado brasileiro que surge o Legítima Defesa. O canal no youtube pretende disputar a narrativa teórica de como se construiu a imagem do negro como criminoso desde a abolição da escravidão, e como essa dinâmica se perpetua até os dias atuais. Além de entrevista com intelectuais, militantes e estudiosos do assunto, os idealizadores querem contar histórias de pessoas presas injustamente, escancarando o racismo enquanto estrutura fundadora do sistema de justiça no país.

Na estréia do canal, é apresentada a história de Marcelo Dias, educador social, forjado pela polícia com porte de drogas e que ficou 6 meses preso acusado de tráfico. Apesar das provas de sua inocência, durante esse tempo prevaleceu exclusivamente a palavra dos policiais. Enquanto aconteciam mobilizações sociais por sua liberdade, Marcelo na cadeia chegou a organizar saraus de poesia e transformar a vida de muitos através da cultura. Histórias da Seletividade Penal, quadro dentro do canal, é um convite para compreender as engrenagens do encarceramento em massa da população negra e os impactos na vida da vítima e seus familiares.