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Ao debatermos, essa semana, na tribuna da Assembleia Legislativa do Estado do Acre (ALEAC), mais um episódio da guerra entre facções criminosas que nos assola, assim como a diversos outros estados brasileiros, com rebeliões em presídios, disputas pelo controle de rotas e territórios de droga, execuções entre membros de grupos rivais, ateamento de fogo em ônibus e patrimônios públicos, abordei a questão da segurança sob dois prismas distintos:

O primeiro, de que nem todo envolvimento de jovens com o crime decorre da falta de oportunidades. Essa seria uma meia verdade. A vulnerabilidade social não diz respeito apenas ao aspecto econômico. Há aspectos sócio-culturais e também um componente subjetivo que decorre dos desejos típicos de uma sociedade do consumo, própria do nosso modo de produção capitalista. Explico:

Quando jovens de poucas posses, cujas famílias vivem em dificuldades financeiras, de base familiar não muito sólida, com frágil formação espiritual, que têm seus sonhos e desejos de consumo (como qualquer um de nós) pensam que devem passar dezesseis anos, entre o ensino fundamental e o superior, em uma árdua jornada escolar de educação formal, para então se preparar para um concurso público ou batalhar por uma oportunidade na iniciativa privada para ganhar, em um mês, bem menos do que aquilo que um traficante lhe oferece por semana para ser “vapor” ou “aviãozinho”, há aqueles que, ainda que diante de oportunidades (vagas nas escolas, oferta de cursos técnicos, de idiomas, práticas esportivas ou culturais no contra-turno escolar, dentre outras) não resistem a essa disputa, a esse aliciamento, a essa sedução injusta e desleal da promessa do dinheiro fácil, rápido e livre de impostos.

Sob outro prisma, defendi, mais uma vez, o debate sobre a regulamentação do uso de substâncias entorpecentes como uma dentre muitas medidas eficazes de redução da violência associada ao tráfico de drogas, aumento das receitas tributárias do Estado e conversão do problema do usuário de drogas em questão de saúde pública e não apenas de segurança.

Infelizmente, a maioria das pessoas leva esse debate a pagode, distorcem nossas falas e ideias. Ser a favor da regulamentação do uso é bem diferente de ser a favor do uso em si e mais diferente ainda de ser usuário. Regulamentar não significa “liberar geral”, mas sim descriminalizar o uso, ao mesmo tempo em que se impõem regras e controles (de produção, comércio e uso) rígidos.

O período em que mais se consumiu álcool na história dos EUA foi no período da Lei Seca. Após a regulamentação, os patamares de consumo caíram, reduziram-se a fabricação e o comércio ilegal (reduzindo o crime a eles associados) e as receitas do Estado aumentaram, a partir da tributação da atividade. O estado pôde passar, assim, a investir mais em conscientização, prevenção e tratamento dos dependentes químicos, ao invés de ter despesas apenas com a repressão e combate ao crime associado ao tráfico.

É exatamente isso que está acontecendo nos Estados Americanos que enfrentaram esse debate e estabeleceram seu próprio modelo. É o que está acontecendo no Uruguai, é o que aconteceu na Holanda… Não precisamos copiá-los, temos meios de achar nosso próprio modelo de regulamentação.

É um debate que não diz respeito à convicções religiosas de denominação A ou B. Religião é assunto de foro íntimo, que integra a dimensão da esfera da vida privada dos indivíduos.

Regulamentação de uso de entorpecentes é assunto que diz respeito à esfera pública.

As pessoas de má-fé, infelizmente, preferem o achincalhe e a distorção das ideias, para desqualificar o interlocutor, do que apresentar argumentos sérios para se contrapor aos seus argumentos e debater o tema.

Ter medo de travar esse debate por receio de desagradar grupos sociais ou de interesse A ou B não condiz com minha condição de militante de esquerda. Não tenho receio de desagradar esse ou aquele grupo. Defendo aquilo em que acredito. E respeito as opiniões divergentes.

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