Aposentados gregos vão às ruas em protesto contra os reajustes na previdência.

Aposentados gregos vão às ruas em protesto contra os reajustes na previdência.

A reforma da previdência é apresentada pelo governo e pelo mercado como uma necessidade inexorável. Ou se aprova ou a economia brasileira iria ao colapso. Na verdade, se trata pura e simplesmente da versão brasileira de uma política que já produziu efeitos desastrosos ao redor do planeta.

Apontando-nos para Inglaterra e França, o governo tenta comparar a situação brasileira à europeia. Um disparate em vários sentidos, a começar pela distância entre as expectativas de vida aqui e acolá. Estamos mais próximos de Chile e Argentina. Nesses países, a tentativa de individualizar a previdência a partir do modelo de capitalização resultou em responsabilizar apenas o trabalhador por sua aposentadoria, “liberando” o Estado de garantir a proteção aos idosos. O resultado vê-se ainda hoje nas ruas de Santiago: legiões de idosos pedindo esmola e morando nas ruas.

É o caminho pretendido aqui no Brasil por gente como Arthur Maia, o relator da PEC 287, que por sinal sustenta um calote de sua empresa ao INSS e recebeu doação de campanha de fundos de previdência privada. República do escárnio. Como se sabe, a economia brasileira e latino-americana tem um altíssimo nível de informalidade e precariedade, quanto mais pobre se é. Na medida em que se empoderam as Agências de Fundo de Pensão – gerentes da previdência privada – diminui-se a possibilidade de os mais pobres se aposentarem.

Após o vampirismo neoliberal ter se esbaldado com a privatização da previdência no Chile de Pinochet (1981), o governo de Bachelet foi forçado por amplas mobilizações sociais a minimizar o estrago, garantindo o mínimo – ainda assim insuficiente – aos mais pobres. Para se ter uma ideia, a média da aposentadoria administrada pelas AFP’s é de R$ 440,00, enquanto o salário mínimo chileno ultrapassa os R$ 1.200,00.

Na Argentina, a sanha do Consenso de Washington levou o país a adotar, com o presidente Fernando De La Rua, depois deposto, o modelo de capitalização. A promessa de “zerar o déficit” em 10 anos não só não foi cumprida, como foi necessária uma alteração drástica na previdência durante o governo de Nestor Kirchner, novamente trazendo o Estado para espantar as aves de rapina. Naquele cenário, novamente as ruas falavam alto.

As mobilizações sociais latino-americanas barraram muito das contrarreformas neoliberais. Mesmo na Europa, em período recente, as reformas “liberalizantes” foram combatidas duramente. França e Grécia que o digam.

O exemplo grego talvez seja o mais ilustrativo da insanidade destas políticas de austeridade. No contexto dos pacotes impostos pelo FMI e o BC europeu, a Grécia fez uma primeira mudança na previdência em 2010, aumentando a idade mínima para 65 anos, tal como proposto agora no Brasil. Dois anos depois, um novo aumento, para 67 anos. No ano passado, nova “reforma” reduziu o ganho dos aposentados a 60% da média de seus rendimentos ao longo da vida de trabalho.

Junto a isso, uma série de medidas de corte de investimentos sociais, demissões, privatizações e ataque a direitos trabalhistas. Este ano completa o sétimo aniversário da política de austeridade e contrarreformas na Grécia. Os resultados são alarmantes.

O país foi destroçado. A economia encolheu mais de 25% no período. O desemprego alcançou a maior taxa do continente, 26%, chegando a mais de 52% entre os jovens. Quase metade dos aposentados gregos, 45%, estão em situação de pobreza. E a dívida pública? Afinal, o grande motivo da promoção deste desastre era conter o avanço do endividamento e ajustar as contas públicas, não é? Pois bem, a dívida grega subiu de 146% do PIB, em 2010, para 177% em 2015.

Ou seja, a política de “ajuste” às custas do povo produziu um tremendo desajuste. As razões são óbvias: ao cortar investimentos e arrochar a atividade econômica, a arrecadação sempre cai, levando à necessidade do novos empréstimos e produzindo crescentes déficits fiscais. O suposto remédio neoliberal é puro veneno. Só quem ganha é o sistema financeiro internacional. O exemplo grego deveria ser suficiente para desmoralizar esta receita, mas a desfaçatez da banca não tem limites.

Trata-se agora de impedir, enquanto é tempo, que um governo sem voto e um Congresso sem moral completem no Brasil esta ponte para o abismo.

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